Uma ONG do ex-jogador Léo Moura recebeu R$ 41,6 milhões do governo federal entre 2020 e 2021.
O valor é o maior repassado pela Secretaria Especial do Esporte a uma instituição esportiva no período, mesmo quando se fala de confederações olímpicas, que receberam menos recursos.
A Confederação Brasileira do Desporto Escolar (CBDE), por exemplo, recebeu R$ 27,5 milhões, R$ 14 milhões a menos do que destinado para o Instituto de Léo Moura.
A informação foi divulgada domingo (9) pelo jornal “Estado de S. Paulo”.
“Me sinto um cara abençoado por ter sido agraciado com essas verbas e estar podendo ajudar muitas crianças”, declarou Léo Moura ao Estadão.
Ele foi jogador do Flamengo, Grêmio e, por último, do Botafogo da Paraíba.
De acordo com o jornal, mais de um terço (36,5%) do valor foi liberado para a ONG do ex-atleta via orçamento secreto, prática usada pelo presidente Jair Bolsonaro para destinar bilhões de reais de dinheiro público sem critérios claros a políticos aliados do Planalto e também para comprar apoio no Congresso Nacional às pautas do governo.
Com o orçamento secreto, ou as chamadas “emendas de relator”, os parlamentares beneficiados recebem a liberação para indicar o destino de milhões de reais sem que seu nome seja vinculado à verba – impedindo, portanto, que haja transparência na destinação de uma parcela significativa dos recursos do Orçamento da União.
Além de muito superior ao recebido pela CBDE, a quantia destinada ao Instituto Léo Moura também supera o que foi enviado a confederações de esportes olímpicos, como a Confederação de Desportos Aquáticos (R$ 9,1 milhões), Ginástica (R$ 8,4 milhões), Vôlei (R$ 8,4 milhões) e Boxe (R$ 7,1 milhões).
Segundo o Ministério da Cidadania, ao qual a Secretaria Especial do Esporte está vinculada, os recursos foram indicações de parlamentares, com execução obrigatória, ou seja, sem que o governo pudesse escolher para quem enviar.
A reportagem do “Estadão” aponta que, no caso do Instituto de Léo Moura, os padrinhos são, principalmente, o deputado bolsonarista Luiz Lima (PSL-RJ) e o ex-presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). A responsável pela liberação do dinheiro foi a ex-nadadora Fabíola Molina, ex-colega de Luiz Lima na seleção de natação, apadrinhada politicamente por ele para comandar a Secretaria Especial do Esporte.
O investimento de R$ 41,6 milhões, destinado a uma entidade que promove treinamento de futebol para crianças e adolescentes, é considerado descomunal por especialistas em gestão esportiva. O dinheiro vai para o custeio da estrutura de escolinhas de futebol, que funcionam em campinhos de cidades do Amapá e da região dos Lagos, no Rio de Janeiro.
A verba é usada para a manutenção dos espaços e pagamento de funcionários, além da compra de chuteiras, caneleiras, uniformes e outros itens. As inscrições são feitas por ordem de chegada, sem critério social. A ONG não fornece alimentação, nem transporte.
Um dos convênios prevê R$ 14 milhões para a instalação de 20 núcleos da escolinha de Leo Moura no Amapá, por um ano. Isso significa que cada uma delas terá, em média, R$ 700 mil para atender, segundo o projeto, até 300 crianças. Isso dá mais de R$ 2 mil por aluno.
Os orçamentos apresentados à Secretaria Especial do Esporte têm itens e valores incomuns para projetos sociais de escolinhas de futebol. Entre eles, recursos para a locação de caixas de som, compra de medalhas para premiação de campeonatos em número várias vezes superior ao de jovens atendidos, além de redes, sacos de bolas, apitos e cronômetros em excesso.
O Instituto de Léo Moura terminou 2021 tendo utilizado apenas R$ 5 milhões das verbas federais que recebeu efetivamente. Apesar disso, novos aportes estão a caminho. Em 23 de dezembro, Adolfo Luiz Costa, presidente do instituto, enviou ofício ao relator-geral do Orçamento, senador Márcio Bittar (PSL-AC), pedindo a liberação de mais R$ 7,032 milhões, “tendo em vista a importância social e o alcance desse trabalho”.
Os R$ 41,6 milhões em repasses à ONG representam 11% dos R$ 374,7 milhões destinados pela Secretaria Especial do Esporte desde 2019 para projetos esportivos. A cifra supera o investimento que 24 Estados e o Distrito Federal fizeram, individualmente, no esporte, em 2020. Apenas Bahia e São Paulo aplicaram mais recursos, segundo o “Estadão”.