O cerco está se fechando sobre os crimes cometidos por Michel Temer e seus auxiliares contra o patrimônio público. Depois de denunciar que o operador de Temer, João Baptista Lima Filho, “enviou recursos para fora do país à margem do sistema financeiro oficial”, a Polícia Federal (PF) informou ao Supremo Tribunal Federal (STF) que Michel Temer também recebia pagamentos de R$ 340 mil mensais, no fim da década de 90, por parte de empresas da área portuária, entre elas a Rodrimar.
O delegado Cleyber Malta Lopes cita, no documento, uma planilha que integrava o inquérito 3105, que foi arquivado em 2011 pelo ministro Marco Aurélio Mello. Essa tabela relacionava pagamentos a “MT”, que seria Michel Temer, a “MA”, que seria Marcelo Azeredo, indicado por Temer para comandar a Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp) – estatal que administra o Porto de Santos, e a “L”, que seria Lima, João Batista de Lima Filho, operador de Temer e sócio da Argeplan.
“Fazendo uma ligação com as informações trazidas, na planilha acima, na qual denota possível pagamento também pela Rodrimar de vantagem indevida para MT (possivelmente Michel Temer), em 1998, na ordem de R$ 340 mensais e ainda adicional de R$ 200 mil, textualmente indicado como sendo para campanha, não é difícil supor que tal relação promíscua entre empresários e agentes políticos se perpetue até os dias atuais”, disse o delegado. Em um item específico, “parcerias realizadas”, há indicação de repasse da Rodrimar de R$ 300 mil a Temer e R$ 150 mil para cada um dos outros – Azeredo e Lima. Há informação de adicional de R$ 200 mil para campanha.
Para aprofundar as investigações, a Polícia Federal pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) a quebra do sigilo telefônico de Michel Temer e de seus ministros mais próximos, Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Minas e Energia), referente ao ano de 2014. Nesse ano, Temer era vice-presidente da República, primeiro mandato. Ele foi vice da ex-presidenta Dilma Rousseff (PT) nos dois mandatos dela. O objetivo é aprofundar a investigação sobre o pagamento de R$ 10 milhões da Odebrecht para Temer. Os investigadores apuram ainda a parceria da Argeplan, em 2014, com a Engevix em contrato da Secretaria de Aviação Civil, então gerida por Moreira Franco, um dos principais aliados de Temer. As informações sobre Moreira foram dadas pelo executivo da Engevix José Antunes Sobrinho.
No início de maio, o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou o pedido da defesa de Michel Temer para arquivar o inquérito que investiga se ele favoreceu empresas portuárias em troca de propina. O ministro atendeu ao pedido da Polícia Federal e prorrogou a apuração por mais 60 dias.
Barroso destacou que a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, posicionou-se contra o pedido de arquivamento, e concordou com o entendimento da PGR de que é necessário aguardar a conclusão das diligências em andamento “para que se possa formar opinião sobre a existência material dos delitos investigados”.
O inquérito foi aberto no ano passado, a partir de depoimentos de executivos do grupo J&F e apura se um decreto editado por Temer tinha por objetivo beneficiar empresas que atuam no porto de Santos (SP).
Em março, Barroso autorizou a quebra de sigilo bancário de Temer a pedido da PF.
Também em março (29, quinta-feira), a Polícia Federal desencadeou a Operação Skala e prendeu temporariamente em São Paulo dois cúmplices de Michel Temer – o advogado José Yunes, ex-assessor especial da Presidência da República, e João Baptista Lima Filho, operador de Temer. Houve prisões também no Rio de Janeiro. Mandatos de busca e apreensão em empresas como a Rodrimar também foram expedidos e encaminhados pela PF.
Além dos dois cúmplices de Michel Temer, foram presos na mesma operação: em Monte Alegre do Sul (SP), o empresário Antonio Celso Greco, dono da empresa Rodrimar, que opera no porto de Santos; em Ribeirão Preto, o ex-ministro da Agricultura e ex-deputado federal Wagner Rossi, que em 1999 e 2000 foi diretor-presidente da Companhia Docas do Estado de São Paulo, estatal administradora do porto de Santos, e depois ocupou o cargo de ministro da Agricultura de Dilma Rousseff; Milton Ortolan, auxiliar de Rossi; e, no Rio de Janeiro, Celina Torrealba, uma das donas do grupo Libra, outra empresa beneficiada por Temer.
A operação, que foi solicitada pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge, foi autorizada pelo ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), relator do inquérito que investiga Temer e o decreto editado por ele que beneficiou empresas do setor portuário em troca de recebimento de propina. Este inquérito é o mesmo que o ex-diretor geral da Polícia Federal Fernando Segovia disse, em entrevista à Reuters, que seria arquivado por falta de provas. Segóvia acabou caindo por conta dessas declarações, que foram denunciadas como uma tentativa de impedir as investigações.
Em 30 de novembro do ano passado, José Yunes prestou depoimento à Polícia Federal, no inquérito dos portos. Na ocasião, ele relatou uma operação de venda de imóvel para Michel Temer. Yunes era assessor especial da Presidência da República e é apontado pelo doleiro Lúcio Funaro, colaborador da Operação Lava Jato, como um dos responsáveis por administrar propinas pagas a Temer. De acordo com Funaro, para lavar o dinheiro e disfarçar a origem, Yunes investia valores ilícitos em sua incorporadora imobiliária. Outro personagem que representava os interesses de Temer junto a Rodrimar e outras empresas era o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures, o “homem da mala”, que foi flagrado com uma mala contendo R$ 500 mil, primeira parcela da propina da JBS para Michel Temer.
No inquérito que apura o favorecimento de empresas no setor de portos, a PF anexou mensagens telefônicas trocadas entre Batista Lima Filho e uma pessoa não identificada pelos investigadores chamada Maria Helena.
No dia 30 de abril de 2017, Lima diz: “Amiga, nessas condições ainda tenho esperança de receber as ‘gorjetas’ que você não me deu”.
Também há uma troca de mensagens no mesmo dia entre Lima e um interlocutor chamado Miguel de Oliveira.
Lima diz: “Recebeu pouco. Nas minhas contas deveria ter recebido R$ 120 mil. Estão ‘garfando’ o coitado”.
A PF afirma que “a conversa aparentemente remete a um pagamento feito a alguém, que teria sido enganado, pois o valor pago deveria ter sido maior”.
Na análise do celular de Lima, investigadores encontraram na agenda de contatos um número de Joesley Batista, da JBS, e do ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Moreira Franco. Temer e Lima são amigos há décadas, e mantêm relações próximas até hoje. Um relatório de busca e apreensão da Operação Patmos, da Polícia Federal, diz que Lima é um homem com acesso direto a Michel Temer. E mostra que Temer e Lima trocaram 12 ligações entre abril de 2016 e maio de 2017, com Temer já na Presidência da República.