“A Petrobrás está sendo depenada”, denunciou o professor da USP
Para o professor Ildo Sauer, do Instituto de energia da USP, e ex-diretor da Petrobrás, que participou, na quinta-feira (28/11), junto com Luis Pinguelli Rosa, ex-presidente da Eletrobrás, do seminário “As privatizações no setor Energético: Suas Consequências para o País”, o que se quer fazer com a privatização do setor de energia “é entregar para grupos privados o bilionário excedente econômico que este ramo produtivo do país pode proporcionar ao seu povo”.
“Qual é o dilema brasileiro?”, indagou Ildo. “A nossa produtividade é relativamente baixa. A disputa pelo excedente econômico no salário das empresas está acirrada, sobra pouco. De onde pode vir o excedente econômico para investir na infraestrutura, em ciência e tecnologia, na transição energética, na saúde pública e na educação pública? Desses recursos gerados pela diferença entre o custo e o valor da produção de energia, que pertencem à população”, argumentou.
CRIME INTERGERACIONAL
“Privatizar o setor de energia é um crime, não só cotra a população atual do Brasil, como também às futuras gerações. É um crime intergeracional”, enfatizou o professor.
“Essa história é antiga e só tem trazido prejuízos para a população brasileira, que é, pela Constituição, a dona de toda a riqueza que está sendo vendida”, prosseguiu o especialista.
“O primeiro grande experimento do estado mínimo no mundo não foi o da Margareth Thatcher, foi o do professor da Thatcher, Augusto Pinochet, de quem esteve junto o nosso atual ministro da economia”, afirmou Ildo Sauer.
“A ordem era privatizar tudo, entregar tudo. A previdência tinha que ser privada, a educação foi privatizada, venderam o setor elétrico no Chile”, acrescentou.
A revolta dos chilenos contra essa política veio à tona recentemente e o país literalmente entrou em convulsão.
“E quais são as promessas dos privatistas? Nós vamos privatizar, vai ter mais investimento, o grande problema da economia é a dívida pública que cresceu muito (de fato, com a crise dos anos 80, do petróleo etc, o Brasil, crescendo a taxas chinesas por alguns anos, depois veio o choque). Daí a solução é, dizem eles, privatizar o setor elétrico e entregar tudo. Vamos ter mais serviços com melhor qualidade, com competição e redução dos preços e tarifas. Nada disso aconteceu”, lembrou o professor.
FALÁCIAS
“Ao contrário”, disse Ildo. “De lá para cá no Brasil, nós tivemos um aumento extraordinário da dívida pública e das tarifas. O Brasil hoje, no setor elétrico, é a terceira tarifa mais alta do mundo. Podia ser uma das mais baixas do mundo se quisesse converter o benefício econômico em tarifas menores”, afirmou. “Ou, se quisesse, poderia converter o excedente econômico em ganhos para pagar a dívida com a população brasileira”, defendeu.
“O potencial hidráulico pertence ao povo”, enfatizou Ildo Sauer. “Mas, segundo ele, “a Medida Provisória 579, de 2012, do governo Rousseff, obrigou as estatais a vender energia pelo custo de operação e manutenção”.
“De 2003 para cá, em vez de seguir o modelo que eu e Pinguelli propusemos para implementar no setor elétrico, garantindo os recursos para o desenvolvimento do setor, fizeram outra coisa. Mantiveram substancialmente a visão mercantil trazida do governo FHC”.
“Montanha de usinas termoelétricas a óleo diesel, a carvão importado da Colômbia, quando nós tínhamos água, vento e solar, agora, para atender toda a demanda brasileira. com isso, as tarifas continuaram a explodir”, denunciou.
“O benefício do recurso hidráulico que permite hoje produzir energia nas usinas depreciadas com custo muito baixo, vendendo entre o custo marginal e o custo médio, permitiria tirar o excedente da ordem de 20 bilhões de reais por ano. Esse dinheiro deveria ser usado para pagar a dívida com os donos desse potencial hidráulico que, pela Constituição, é a população brasileira”, salientou.
A GUERRA É PELO EXCEDENTE ECONÔMICO
Segundo Ildo, é exatamente esse extraordinário recurso, que pode ser extraído da produção e comercialização de energia (petróleo, minérios e energia elétrica) que está em disputa. “A guerra é pelo excedente econômico”, enfatizou.
“A possibilidade do excedente econômico é o que move os interesses de quem faz o discurso da privatização”, destacou o palestrante. “Assim é no petróleo”. “A proposta é a privatização e a destruição. Destruição sim, porque a Petrobrás está sendo depenada”, denunciou.
“No setor de petróleo nós estamos tendo agora uma desestruturação do sistema Petrobrás, com a perda de subsidiárias. A BR distribuidora teve privatizado o seu controle, a rede brasileira de gasodutos, a Transportadora Associada de Gás, que nós criamos, e dobramos de 2003 a 2008 ( a rede de gasodutos de 4 mil km para cerca de 9 mil km) foi vendida”, disse Ildo.
“Interligamos a rede brasileira de gasodutos. Agora que tudo está funcionando, venderam por 8 bilhões de dólares, dizendo que foi um grande negócio. Só que o gasoduto que a Petrobrás vendeu, só serve para ela. Para tirar o gás, que vem do centro de produção, para entregá-lo ao mercado. Com a venda, a estatal vai passar a pagar tarifa de transporte. Venderam a casa para morar de aluguel. E o aluguel de três ou quatro anos vai consumir o que foi arrecadado. E dizem que fizeram um bom negócio”, cobrou o professor.
“Tudo isso tem por detrás um discurso ideológico que prega a solução do estado mínimo, a eficiência privada e a apropriação privada dos melhores recursos técnicos do setor público”, denunciou.
Ele lembrou que o modelo mercantil no setor elétrico, iniciado por FHC, com expansão extraordinária das tarifas, não permitiu a universalização da eletricidade. Quando nós chegamos no governo em 2003, tinham 13 milhões de brasileiros sem acesso à energia elétrica. E duas décadas quase, depois, 2,5 a 3 milhões de brasileiros ainda estão sem energia elétrica. Isso também é um fracasso”, avaliou.
BRASIL DEIXARÁ DE OBTER R$ 500 BILHÕES POR ANO
Pelos cálculos feitos por Ildo Sauer, os recursos que o país poderia contar para investir em seu desenvolvimento, se explorasse o petróleo com a contratação de serviço da Petrobrás, que é permitido pela lei, ao invés de adotar os modelos de partilha e concessão, chega a R$ 500 bilhões por ano. “Uma reforma da Previdência a cada dois anos”, diz Sauer.
“O custo de produção de um barril de petróleo no pré-sal é de 8 a 10 dólares. Com o preço a 60 dólares o barril, o excedente por barril é de 50 dólares. Nós temos no Pré-Sal no mínimo 100 bilhões de barris. Programado para 40 anos, nós produziríamos 2,5 bilhões de barris por ano. Com um excedente de 50 dólares, teremos 125 bilhões de dólares, vezes quatro do câmbio, teremos esses 500 bilhões de reais”, detalhou o professor.
Ele lembrou também que, além de vender o patrimônio público a preço vil, os privatistas garantem que os lucros bilionários, gerados neste setor, sejam abocanhados pelos grupos privados sem nenhum benefício para a população.
Pelo contrário, há piora dos serviços e elevação das tarifas. “Privatizaram a Vale do Rio Doce por 3 bilhões de reais. Depois vieram lucros extraordinários com as exportações para a China, mas esses lucros foram privados. O que o povo recebeu disso tudo foi Mariana e Brumadinho”, destacou.
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