Daniel, outra vítima da ação covarde de membros da PM de Pernambuco, ficou caído e continuou a ser alvejado. “Não estava tendo tumulto, não estava tendo nada e, de repente, vários disparos”, contou ele à TV Globo
A reportagem do Fantástico, da Rede Globo, neste domingo (6), sobre a atuação violenta de parte da Polícia Militar de Pernambuco durante repressão à manifestação pacífica por vacinas, em defesa da vida e contra as ameaças de Bolsonaro à democracia, realizada o Recife, mostrou a covardia dos policiais envolvidos na ação.
VICE-GOVERNADORA, LUCIANA SANTOS, PROTESTOU IMEDATAMENTE
A operação truculenta dos policiais ocorreu na manhã do sábado (29), no Centro do Recife. Segundo parentes, as duas vítimas que foram atingidas nos olhos pelas balas de borracha disparadas pelo policiais, não estavam na manifestação. Eles foram ao Centro da cidade para trabalhar, e não participavam do ato. Assim que soube do ocorrido, a vice-governadora, Luciana Santos (PCdoB), divulgou vídeo condenando a provocação e denunciando que a ação não havia sido ordenada pelo governo.
Daniel Campelo, de 51 anos, foi atingido nos olhos e perdeu a visão. Ele não estava participando da manifestação. Trabalha confeccionando adesivos para táxis e estava a caminho do centro para comprar material. O tiro, de bala de borracha, atingiu em cheio o olho esquerdo de Daniel. Mesmo ferido, ele foi baleado mais uma vez. Daniel tinha acabado de descer do ônibus, impedido de passar por conta do protesto, quando foi atingido.
DANIEL FICOU CAÍDO E CONTINUOU SENDO ALVEJADO
“Não estava tendo tumulto, não estava tendo nada e, de repente, vários disparos. Eu levantei as minhas mãos antes que acontecessem os disparos, levantei as mãos e disse: sou um trabalhador, sou um pai de família”, disse Daniel, antes de ser alvejado covardemente. Eles podiam me imobilizar, eu estava com os braços levantados, aí não teve tempo, foram vários disparos”, acrescentou Daniel. “Alguém tentou me levantar para ajudar, mas os tiros não cessaram”, denunciou.
“Qual é a ameaça que cidadãos procurando seus direitos ou indo trabalhar podem representar para serem tratados dessa forma”, indagou Daniel, durante a entrevista ao Fantástico deste domingo.
“Estou emocionalmente desestruturado”, disse ele. “Eu estava com o braço levantado e eles continuavam a atirar”, acrescentou Daniel. “Eles poderiam me imobilizar, alguma coisa. Aí, não teve tempo. Vários disparos. Não sabia de onde vinha. É um impacto muito forte. Desestrutura todo o seu corpo”, conta o pernambucano que, até agora não entendeu por que tanta violência.
“É que nem um filme. Você tá dormindo, rapidamente, volta. Você escuta um barulho, um estampido, você escuta a gritaria. Eu estou emocionalmente desestruturado. Imagens por si mostram, né? Qual a ameaça de cidadãos procurando seus direitos e cidadãos indo trabalhar?”, questiona Daniel. Mesmo ferido e pedindo ajuda, os policiais envolvidos não pararam de atirar e se negaram a ajudá-lo.
PAULO CÂMARA PUNIU OS ENVOLVIDOS E AFASTOU COMANDANTE
O governador Paulo Câmara (PSB), além de condenar imediatamente a ação policial, mandou afastar os militares envolvidos no episódio. Ele anunciou ainda que mandou iniciar as investigações para detectar de quem teria partido a ordem para a violência. Logo em seguida Câmara anunciou o afastamento do comandante da PM de Pernambuco, coronel Vanildo Maranhão. Em seu lugar assumiu o coronel José Roberto Santana, que era diretor de Planejamento Operacional. Em seguida também foi afastado o secretário de Defesa Social, Antônio de Pádua.
No caso de Jonas Correia de França, de 29 anos, que chegava ao Centro para comprar carne, a pedido da esposa, a covardia foi ainda mais acentuada. Ele falava com a esposa no celular quando os policiais se aproximaram. Ele se dirigiu aos militares para avisar que não estava na manifestação e foi recebido à bala. “Eu disse a ele, ‘eu tô no protesto não, sou trabalhador, acabei agora de descarregar um contêiner’. O policial saiu de trás, deu dois passos, mirou e deu um tiro no meu olho. Na mesma hora, já entrei em desespero porque essa visão apagou na hora”, conta Jonas.
“POLICIAIS TÊM QUE PROTEGER OS CIDADÃOS, NÃO MALTRATAR”, DISSE JONAS
“Tinha dois carros da polícia lá que poderiam me socorrer, o meu colega ainda falou com eles, mas nada. Meu irmão teve que vir de carro de longe para me socorrer”, prosseguiu Jonas. “Eu sofri muito nesse dia, é coisa demais. Eu deixei dois filhos. Eu saí de casa para manter a minha família e agora estou nessa situação. Como é que vai ficar? Policiais têm que proteger os cidadãos, não maltratar, não fazer isso que fez comigo”, apontou Jonas, que perdeu definitivamente a visão no olho atingido.
“Vai ficar para toda a vida isso. Eles são treinados para isso. Eles ainda me escutaram. Tiveram tempo de me ouvir. Ali naquele momento eu não representava nenhum perigo”, disse Jonas Correia em meio às lágrimas.
“Tiveram tempo de me ouvir. Ali naquele momento eu não representava nenhum perigo”, disse Jonas
Depois de seis dias internado, na sexta-feira (4), Jonas foi fazer um exame para avaliar o tamanho do dano no globo ocular. Os médicos disseram que não há como recuperar a visão de seu olho direito. O governo de Pernambuco já se prontificou a fornecer às duas vitimas uma ajuda imediata para custear as despesas médicas, independente da indenização que o Estado deverá assumir.
TODOS OS PROTOCOLOS FORAM DESRESPEITADOS. OS TIROS FORAM NA CABEÇA
Os integrantes da tropa de choque agiram desrespeitando todos os protocolos da PM para situações desse tipo. Não houve nenhuma provocação por parte dos manifestantes. A orientação para o caso de uso de armas não letais, entre elas as armas de bala de borracha, é para que os tiros sejam dados nas pernas. Os agentes atiraram na cabeça das pessoas e para cima em direção aos prédios para aterrorizar a população.
A reportagem do Fantástico visitou a maior fábrica brasileira de armas não letais. Os fabricantes reforçaram que nunca se deve atirar com essas armas nas partes mais vulneráveis do corpo humano, como tórax e cabeça, por exemplo. “A orientação é sempre atirar nas pernas porque o objetivo da arma é apenas causar dor. Quando a cabeça é atingida há perigo de lesões graves e até morte”, disse o representante dos fabricantes. O governo do estado já tomou algumas providências importantes, como o afastamento desses elementos e do comandante, e a sociedade agora aguarda uma punição severa para todos os envolvidos em indisciplinas desse tipo.
S.C.