Proposta foi protocolada nesta quarta-feira (14) e recebeu 189 assinaturas, muito além das 171 necessárias para apresentar emendas à Constituição
Nesta quarta-feira (14), às 15 horas, foi protocolada na Mesa da Câmara dos Deputados a Proposta de Emenda Constitucional (PEC), sob o número 21/2021, de autoria da deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC). A proposta acrescenta o inciso XXIII ao artigo 37 da Constituição, regulamentando a participação dos militares nos governos.
A PEC define que o art. 37 da Constituição, que trata da Organização do Estado, passa a vigorar acrescido do inciso XXIII: o militar da ativa somente poderá exercer cargos de natureza civil na Administração Pública, nos três níveis da Federação, desde que atendidos os seguintes requisitos: a) se contar menos de dez anos de serviço, deverá afastar-se da atividade; b) se contar mais de dez anos de serviço passará automaticamente, no ato da posse, para a inatividade.
“Hoje é um dia muito importante para o país e para a Câmara. Protocolamos, com o apoio de 189 parlamentares de todos os partidos, um número mais do que o necessário, de 171 deputados, a PEC que regulamenta a participação dos militares nos governos”, comemorou a deputada. “A questão nacional e a nossa soberania, tendo as Forças Armadas como Instituições de Estado, sempre teve atenção especial do nosso partido”, disse ela.
Atualmente, a regra sobre a participação de militares em cargos públicos é dada pela Constituição e a legislação específica que determinam que todo militar da ativa que ocupar cargo civil político, não eletivo e temporário, completados dois anos fora do serviço ativo, deverá optar pela permanência ou não nesta condição. Após dois anos fora das Forcas Armadas, o militar que optar pela permanência no cargo civil e político deverá passar para a reserva.
Recentemente, o presidente Jair Bolsonaro, com o objetivo de seguir elevando o contingente de militares ocupando cargos no seu governo – o número total passou de cerca de 2,5 mil para a casa dos 6,5 mil -, assinou um decreto transformando cargos de caráter civil em funções militares. Ou seja, transformou cargos originalmente civis, que podiam ser ocupados por civis ou militares, em cargos exclusivamente militares. O decreto foi considerado um excesso da parte de Bolsonaro e, até mesmo, uma tentativa de burla da norma constitucional que rege o tema.
A atitude foi encarada também como parte de sua tentativa, duramente criticada até mesmo por diversos setores militares, de instrumentalizar as Forças Armadas com o objetivo de arrastá-las para atividades político-partidárias e, até mesmo, para as suas intenções golpistas e antidemocráticas.
Além disso, a desastrosa indicação de Eduardo Pazuello, um general da ativa, supostamente ligado à área de logística, e sem nenhuma experiência na área, para o cargo de Ministro da Saúde, em substituição a dois médicos e profissionais do setor, que foram demitidos em plena pandemia da Covid-19 por discordarem do negacionismo de Bolsonaro, reascendeu na sociedade a discussão sobre a conveniência ou não da participação dos militares da ativa em cargos civis e políticos.
Hoje, depois da tragédia sanitária, agravada pela inação do governo federal, que ceifou a vida de mais de meio milhão de brasileiros, a constatação é que a nomeação foi um grave erro. A “CPI da Covid”, instalada no Senado da República, investiga as responsabilidades de Pazuello e do próprio presidente da República pelo que ocorreu no país. A alta mortandade, provocada pela falta de vacinas, de insumos e até de oxigênio está sendo imputada ao Planalto. A falta de experiência em saúde pública por parte de Pazuello e o comportamento irresponsável e anticientífico de Bolsonaro são avaliados hoje como as principais causas da desgraça que se abateu sobre a população brasileira.
O vice-presidente da República, general Hamilton Mourão, um defensor da tese que os militares da ativa que venham a ocupar cargos políticos deveriam pedir baixa das Forças Armadas, apoiou a mudança proposta pela deputada Perpétua Almeida: “A nossa legislação hoje é clara, quando um militar da ativa ocupa cargo fora da força, ele tem até 2 anos para permanecer nessa situação”, disse Mourão. Ele considera isso como uma barreira já existente, mas não vê problema “em colocar outra”.
O apoio do general Mourão à alteração do artigo 37 da Constituição, para uma melhor regulamentação da participação de militares em cargos políticos, representa, até mesmo, uma mudança no pensamento do vice-presidente em relação ao assunto, certamente, em razão da realidade dos militares sob o atual governo. Em entrevista à Globonews, em 20 de junho, Mourão havia afirmado que, até aquele momento, considerava suficiente a regulamentação dada pelo artigo 142 da Constituição, que determina o tempo máximo de dois anos para a permanência de militares da ativa em cargos civis. Agora ele apoia a passagem imediata para a reserva para esses casos.
Em sua justificativa para propor a PEC 21/21, a deputada pelo estado do Acre argumentou que “é patente o objetivo do nobre legislador constituinte de afastar os militares do exercício da atividade de caráter político-partidário enquanto estes ocupem cargo de natureza militar da ativa. Busca-se resguardar as Forças Armadas (FFAA) dos conflitos normais e inerentes à política, e fortalecer o caráter da Marinha, do Exército e da Aeronáutica como Instituições permanentes do Estado e não de governos”.
“As FFAA, e suas altas e dignificantes funções de defesa permanente da Pátria, não devem ser submetidas a interesses partidários, mas também não podem se desviar de sua função constitucional para participar da gestão de políticas de governos, estes, por definição democrática, transitórios”, acrescentou a parlamentar.
Na terça-feira (14), cinco ex-ministros da Defesa, também manifestaram apoio à iniciativa da deputada Perpétua Almeida. Em nota intitulada “Em defesa das Forças Armadas como Instituições de Estado”, os ex-ministros Nelson Jobim, Celso Amorim, Jaques Wagner, Aldo Rebelo e Raul Jungman afirmaram que “em uma democracia a definição da Política de Defesa cabe ao Poder Político em permanente diálogo com a sociedade e as Forças Armadas”.
“Estas, instituições de Estado, permanentes, nacionais e regulares, organizadas com base na disciplina e na hierarquia, não se confundem com governos, pois sua razão de ser é a defesa da Pátria e da soberania. Desde 2008, com a sanção da Lei Complementar 136, tem o Congresso o poder de aprovar a Política e a Estratégia Nacional de Defesa, documentos fundamentais, que devem ser revisados a cada quatro anos”, prossegue a nota.
“A Proposta de Emenda Constitucional apresentada pela deputada Perpétua Almeida propõe, em boa hora, a regulamentação da participação de militares da ativa em funções de governo, separando aquelas de natureza técnica e que podem ser atribuídas à militares, daquelas que permitam o risco da politização das Forças Armadas com consequências nocivas para estas instituições e para o País”, defenderam os ex-ministros.