Empresário bolsonarista foi evasivo e tentou enrolar os senadores da CPI no depoimento da quarta-feira (29)
O presidente da CPI da Pandemia, senador Omar Aziz (PSD-AM), rebateu o bolsonarista Luciano Hang, que tentou debochar e mostrou descaso com as quase 600 mil mortes por Covid-19 no Brasil.
“Se eu tivesse a sua condição [financeira], ia levar minha mãe à Lua, não era à Prevent Senior, não”, afirmou Aziz. Na sequência, Aziz disparou contra os senadores governistas que compareceram na sessão da CPI para bajular Hang.
“O senhor não é mais honesto que ninguém aqui e nem mais trabalhador que os brasileiros. Esse é o patriota, que tem a estátua da liberdade em frente suas lojas. [Quer] liberdade para denegrir os outros. E os palhaços vieram aqui hoje”, disse Aziz.
Hang teve que se desdobrar em narrativas falsas para tentar explicar o caso da sua mãe, em que ele escondeu que ela morreu de Covid, após ser tratada com cloroquina e outros medicamentos ineficazes na Prevent Senior.
Disse, na narrativa dele, que é “coisa de louco, fantasiosa” a acusação de que tivesse pedido para que fosse omitida a Covid-19 do atestado de óbito da mãe dele. Afirmou ter ficado surpreso ao descobrir que a doença não era citada e que deve ter se tratado de erro do médico plantonista. Disse que obteve a informação recentemente por meio da CPI.
O empresário bolsonarista declarou que entrou em contato com a Prevent Senior e que recebeu documento elaborado pela comissão de controle de infecção do hospital, que confirma a Covid-19 como causa da morte.
“No dia seguinte, existe uma comissão de controle de infecção hospitalar. Essa comissão de controle de infecção hospitalar viu o erro do plantonista”, afirmou.
CONTAS
Luciano Hang admitiu que tem contas bancárias no exterior, “duas ou três”. Por outro lado, negou financiar a disseminação de fake news, em particular em temas ligados à pandemia do novo coronavírus.
Ele se apegou a detalhes linguísticos para justificar informação falsa que teria propagado em vídeo na ocasião, quando defendeu o chamado “tratamento preventivo”, com medicamentos sem eficácia comprovada contra a doença.
“GABINETE PARALELO”
Hang já é investigado pela CPI pelo envolvimento dele no chamado “gabinete paralelo”, estrutura de aconselhamento do presidente Jair Bolsonaro para temas da pandemia fora da estrutura do Ministério da Saúde. Os senadores querem apurar suspeitas de que o empresário financiou a propagação de fake news.
Ele não recorreu a habeas corpus para evitar responder determinadas perguntas. Antes da reunião, disse a jornalistas que chegou para o depoimento com “amor no coração” e “com a verdade ao seu lado”. No entanto, recusou-se a prestar o juramento de não mentir.
Hang chegou para o depoimento acompanhado de tropa de choque do governo, que incluiu o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), filho do presidente, que fazia tempo não comparecia nas reuniões da CPI.
TERGIVERSAÇÃO
O empresário afirmou não ser negacionista e que reconhecia a gravidade da pandemia, tanto que investiu recursos para combatê-la. No entanto, evitou comentar o outro sentido da palavra negacionista, no contexto da pandemia, que são agentes que se mostram contra práticas de distanciamento social, uso de máscaras e adeptos de medicamentos sem eficácia comprovada para o tratamento da Covid-19.
Hang também negou financiar a propagação de fake news, contrariando todas as provas em contrário apresentadas pela CPI.
MENTIRA E IRONIA
Hang afirmou nunca ter recorrido a empréstimos do BNDES, no que foi rebatido pelo presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM). Ele disse que o banco encaminhou documento que mostra 57 operações até 2014, que somavam R$ 27 milhões. Hang então ironizou a quantia: “Esses R$ 27 milhões é quanto a Havan fatura em um dia.”
Em um dos momentos mais tensos do depoimento, o empresário falou que não aceitaria que a morte da mãe dele, Regina Hang, fosse usada politicamente. Disse que foi aconselhado por amigos a levar sua mãe para um hospital da rede Prevent Senior e que adotou protocolo de tratamento da Covid-19 com o uso de medicamentos, como a hidroxicloroquina e a azitromicina.
Logo após a morte de Regina, o empresário divulgou vídeo no qual afirma que ela poderia estar viva se tivesse recebido tratamento preventivo.
“KIT COVID”
Dados do prontuário médico de Regina, porém, confirmam que ela foi medicada durante a internação com hidroxicloroquina, azitromicina, além de ter recebido ozonioterapia retal. Questionado sobre o assunto, Hang se apegou a um detalhe semântico para negar que tivesse mentido.
“Eu disse que eu lamentava que eu não tinha feito o tratamento preventivo com a minha mãe. Tratamento preventivo é antes de a pessoa adquirir o vírus. Então, eu faço tratamento preventivo, ainda, e fiz durante toda a pandemia”, afirmou, mentindo e tergiversando.
“Aqui eu vou desenhar: [Tratamento] Preventivo é uma coisa e inicial é outra. São duas coisas diferentes”, completou, provocando os senadores.
O empresário bolsonarista confirmou que a mãe dele recebeu o chamado “Kit Covid” desde o início do tratamento da doença, mesmo antes de sua internação, apesar das comorbidades.
CAMPANHA PARA COMPRAR “KIT COVID”
Hang também reconheceu que fez campanha com empresários da cidade natal dele, Brusque (SC), para comprar medicamentos do “Kit Covid”, que foram doados a hospitais.
“Nós fomos para as cidades juntamente com pessoas da minha cidade para ver o que estava sendo feito nessas cidades que deu certo. Brusque, de novo, talvez seja a cidade acima de 100 mil pessoas com a menor letalidade.”
Questionado pela senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), Hang confirmou que fez campanha para arrecadar recursos e doar a hospitais: “Fiz, está na rede social. Fiz e doamos o dinheiro”.
“BOBO DA CORTE”
O depoimento foi marcado por momentos de grande tensão. Logo no início, o relator Renan Calheiros (MDB-AL) chamou Hang de “bobo da corte”, o que provocou grande reação dos senadores governistas.
Em outro momento, Rogério Carvalho (PT-SE) afirmou ter sido ofendido pelo advogado de Hang, Beno Brandão, e pediu para que ele fosse expulso. O defensor teria falado com o dedo em riste e feito gestos irônicos.
Aziz decidiu determinar a sua saída e, após o tumulto que se instalou, suspendeu a reunião. Na volta, o advogado pediu desculpas, e Aziz reconsiderou sua decisão.
Hang também havia causado reação dos senadores ao mostrar placas, com dizeres como “liberdade de expressão”.
Após a sessão, o empresário afirmou que não descarta ser candidato nas eleições de 2022 e que vai tomar a decisão apenas no ano que vem. Ele é cotado para disputar uma vaga para o Senado por Santa Catarina.
M. V.