Ministério Público do Trabalho do Estado recebeu 21 relatos referentes a bloqueios nas estradas e atos ilegais após segundo turno
As eleições se encerraram, em segundo turno, em 30 de outubro. Todavia, até as 11h da manhã da última sexta-feira (11), o MPT-SC (Ministério Público do Trabalho em Santa Catarina) havia recebido 21 denúncias contra empregadores que teriam coagido trabalhadores a participar dos atos golpistas que contestam o resultado das eleições e bloquearam ilegalmente rodovias no Estado.
Os casos foram registrados entre 30 de outubro, data do segundo turno da eleição presencial, e a última sexta-feira. Os nomes das empresas acusadas não foram divulgados.
Os bloqueios de rodovias começaram em 30 de outubro, depois de confirmada a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a derrota de Jair Bolsonaro (PL).
Santa Catarina chegou a ter quase 70 atos simultâneos nas estradas. No entanto, não há registro de novos bloqueios desde a última segunda-feira (7).
A Polícia Rodoviária Federal (PRF) informou ao Supremo Tribunal Federal (STF) que, de 30 de outubro a 6 de novembro, foram identificadas e multadas 40 pessoas físicas e 10 empresas pela organização de atos golpistas. Segundo relatório da PRF, ao menos 23 pessoas são citadas como “lideranças que atuam nesses movimentos, bem como [proprietários de] alguns veículos utilizados nos bloqueios”.
ASSÉDIO ELEITORAL
Desde agosto, o MPT-SC já registrou 313 denúncias de assédio eleitoral envolvendo 205 empresas (indústria e comércio), associações e federações de classe e sindicatos patronais. A maioria dos episódios ocorreu na região do Oeste catarinense.
O assédio eleitoral ocorre quando, em ambiente ou situação de trabalho, empregados se sentem intimidados, ameaçados, humilhados ou constrangidos por um empregador ou colega de trabalho que tenta influenciar ou manipular seu voto ou opinião política.
Os bloqueios ilegais em vias do país, que começaram a se formar logo após a conclusão do segundo turno das eleições, no domingo (30), e ganharam maior proporção no dia seguinte, causaram danos a muitas pessoas que precisaram se deslocar por essas ruas e estradas, limitando o direito de ir e vir.
RISCOS AO ABASTECIMENTO E À VIDA
Além dos transtornos a quem precisava passar pelas vias interditadas e foi impedido, a ação também prejudicou o transporte de insumos para a produção de vacinas no Instituto Butantan e impediu o tratamento de pessoas que precisam fazer hemodiálise em Santa Catarina. Até voos foram cancelados.
A Abiquim (Associação Brasileira da Indústria Química) denunciou que os bloqueios estavam causando “risco extremo e iminente a preservação da vida” ao impossibilitar a entrega de oxigênio medicinal em clínicas e hospitais.
A Abras (Associação Brasileira de Supermercados), divulgou que 70% dos supermercados já estão com problemas de abastecimento, em sete Estados – Santa Catarina, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Rio de Janeiro e São Paulo – e no DF.
No Ceará, quem teve prejuízo foram os donos de 18 veículos de manifestantes multados em mais de R$ 100 mil pela PRF nos atos de pequena proporção e duração realizados em dois pontos de Fortaleza, em Pacajus e em Brejo Santo.
BLOQUEIO COMPLETO DAS VIAS
A Constituição de 1988 diz no artigo 5º, inciso XVI, que “todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público”. Contudo, isso não deve afetar o direito de ir e vir do outro, outra garantia legal prevista no inciso imediatamente anterior: “XV – é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz”.
A advogada Rocicler Galdino de Sousa, membro da Comissão de Estudos em Direito Penal da OAB-CE, ressalta essas conquistas do texto constitucional. “A livre manifestação pacífica e ordeira é um direito fundamental. É um direito do cidadão fazer sua manifestação”, destaca.
Ela reforça que não há ilegalidade em manifestações pacíficas, “desde que não haja prejuízo para a sociedade como um todo. Não deve haver ameaças, violências”, enfatiza.
MULTA PARA INFRAÇÃO PODE SUPERAR R$ 17 MIL
A criminalista afirma, contudo, que “o bloqueio deliberadamente sem nenhum sentido, com outras motivações, é crime, sim, caracterizado pelo artigo 253 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Mas desde que haja uma conversa, que essas pessoas fiquem se manifestando, liberem parte da via, não há porque ser considerado movimento ilegal”.
A infração de bloquear a via com veículo é infração gravíssima, conforme o CTB. A pena aplicada é de multa, no valor de R$ 293,47, além de remoção do veículo.
Também aplicável a esses movimentos, o artigo seguinte, 253-A prevê penalidade ainda mais severa. De acordo com o dispositivo, quem “usar qualquer veículo para, deliberadamente, interromper, restringir ou perturbar a circulação na via sem autorização” é punido com a multa para infração gravíssima multiplicada por 20 (R$ 5.869,40), tem a suspensão do direito de dirigir por 12 meses e a remoção do veículo.
Para os organizadores, a multa é multiplicada por 60 (R$ 17.608,20).
Rocicler Galdino de Sousa pondera que, no caso de dois direitos fundamentais estarem em conflito, o de manifestação e o de ir e vir, “tem que haver uma intervenção para que esses direitos sejam viabilizados”.
M. V.