“Seguir com os juros altos é apenas transferir renda de toda a sociedade para o 1% mais rico da população”, denunciou o economista
O economista e professor da UnB José Luis Oreiro definiu como “absurda” a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) de manter a taxa de juros da economia (Selic) em 13,75% ao ano.
Em artigo, publicado na noite desta quarta-feira (22), Oreiro destacou que o Copom manteve a taxa básica de juros em 13,75% ao ano “com um claro viés de alta. No comunicado, após o término da reunião, o Copom anuncia que: ‘O comitê enfatiza que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados e não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não ocorra dentro do esperado’. Mesmo que tudo ocorra conforme o esperado pelo Copom, a taxa básica de juros deverá permanecer elevada por um período de tempo prolongado. Com efeito, lê-se no comunicado, o Copom “segue vigilante, avaliando se a estratégia de manutenção da taxa básica de juros por período prolongado será capaz de assegurar a convergência da inflação’. Desses trechos, segue-se uma única conclusão lógica: Ou a Selic irá ficar em 13,75% ainda por muitos meses, ou poderá aumentar”, alertou Oreiro, que seguiu.
“A justificativa técnica para a decisão de manutenção da meta de taxa de juros em 13,75% a.a é absurda. Segundo o comunicado do Copom ‘Os episódios envolvendo os bancos nos Estados Unidos e na Europa elevaram a incerteza e a volatilidade dos mercados e requerem monitoramento’. WTF!!!! [expressão em inglês para What the Fuck] O Copom afirma que, face a um quadro de possível crise financeira global, a estratégia ótima do Banco Central Brasileiro é manter a taxa de juros real em 8% a.a. Esses episódios apontam para um risco deflacionário a nível mundial, o que requer precisamente o afrouxamento da política monetária nos Estados Unidos e na Europa, bem como no Brasil. Aliás, pelas Terras Brazilis existe um risco não desprezível de crise financeira devido ao elevado endividamento das empresas não-financeiras”.
O economista afirmou, ainda, que a decisão do Copom mostra que não adianta tentar tentar uma política de “apaziguamento” com a presidente do BC e sua diretoria.
“O Ministério da Fazenda havia desenhado uma estratégia para convencer o Copom a reduzir, ou ao menos sinalizar com a redução, a taxa básica de juros na reunião de hoje. A estratégia repetida várias vezes pelo Ministro da Fazenda era a coordenação entre as políticas monetária e fiscal. O Ministério da Fazenda fez uma reoneração parcial dos impostos federais sobre os preços dos combustíveis e introduziu um imposto de exportação sobre o petróleo com o objetivo de aumentar a arrecadação de impostos em cerca de R$ 27 bilhões, diminuindo assim a previsão de déficit primário para o ano de 2023. Uma vez feita a sinalização por parte do Ministério da Fazenda que o governo está comprometido com a “responsabilidade fiscal”, o Copom poderia então iniciar o processo de flexibilização da política monetária, alegando que parte da incerteza fiscal fora dissipada nas últimas semanas. Em teoria, tratava-se de uma bela estratégia, mas pelo visto faltou combinar com os russos”, disse Oreiro.
E acrescentou:
“O debate público no Brasil sobre a condução da política monetária se baseia na ideia tola de que se trata de uma questão técnica, que deve ser tratada apenas por hiper especialistas no assunto. Ledo engano. Em primeiro lugar, a economia não é uma hard science como a Física, onde é possível realizar experimentos em condições controladas que permitem descartar ou aceitar determinadas hipóteses…. Em segundo lugar, o “conhecimento econômico”, por assim dizer, não é neutro: os modelos econômicos não apenas refletem a visão de mundo dos seus construtores como ainda podem esconder os interesses econômicos de certas classes sociais. No caso da política monetária isso é bem claro, pois a taxa de juros é uma variável fundamental para determinar a distribuição da renda produzida na sociedade entre as classes produtoras (empresários e trabalhadores) e as classes rentistas (bancos e sistema financeiro em geral). Ao longo do ano de 2023, o pagamento de juros da dívida pública será superior a R$ 700 bilhões, trata-se da segunda maior rubrica do orçamento do governo, ficando atrás apenas das despesas da previdência social”, lembrou o economista, que ressaltou:
“Se as políticas de assistência social (bolsa família, seguro desemprego, abono salarial, aposentadoria rural) são transferências de toda a sociedade para os mais pobres e vulneráveis, os juros da dívida pública são uma transferência de renda de toda a sociedade para o 1% mais rico da população”, afirmou Oreiro.
Segundo o professor da UNB, “a magnitude dos interesses envolvidos explica o por que a estratégia concebida pelo Ministério da Fazenda não deu certo. Tal como disse D. Juan de Austria, na batalha de Lepanto, ‘Ya no es tiempo de razonar, sino de combatir’. É necessária a união de todas as forças progressistas da sociedade brasileira para forçar a demissão do Presidente e de toda a diretoria do Banco Central do Brasil… Cabe ao governo abandonar a política de apaziguamento com respeito ao Banco Central e convocar uma reunião de emergência do Conselho Monetário Nacional para rever a meta de inflação de 2023 para, no mínimo, 4% a.a”.