A ideia é constituir um pool de empresas brasileiras para assumir o controle da estratégica fabricante de lançadores de mísseis, diz reportagem da revista DefesaNet
Reportagem da revista Defesanet desta terça-feira (20), tendo como fonte a CNN, informa que o governo brasileiro decidiu defender a permanência da Avibrás, uma empresa militar de alta tecnologia e um dos principais símbolos da indústria de defesa brasileira, sob controle nacional. A ideia é constituir um pool de empresas brasileiras para assumir o controle da fabricante de lançadores de mísseis.
A Avibrás vive atualmente uma crise financeira e chegou a ser cobiçada pela empresa australiana DefendTex, mas os militares, os funcionários da empresa e o governo brasileiro resistiram ao negócio, já que ele representaria a total desnacionalização da companhia. Uma outra proposta foi feita pela empresa chinesa Norinco, que se dispôs a comprar 49% das ações da Avibrás, entrando no projeto mas mantendo-a sob controle nacional.
No governo, a proposta dos chineses foi considerada mais abrangente e poderia significar uma mudança significativa para o futuro da empresa. Entretanto, o governo norte-americano fez insinuações e ameaças com sanções à Avibrás se ela se associasse com a Norinco. Com as sanções, o Brasil enfrentaria dificuldades, em um segundo momento, para vender o míssil AV-MTC ou outros produtos da Avibrás para países-membros da Otan e parceiros ocidentais em geral.
Além disso, os Estados Unidos poderiam também vetar a integração de equipamentos e sistemas incorporados pela Avibrás, pelo simples fato de que ela teria participação da empresa chinesa. É consenso, na cúpula do Exército, que a situação não pode continuar como está.
O ponto alto da parceria da força terrestre com a Avibrás gira em torno do projeto estratégico Astros. O Astros tem como objetivo dotar a força com um sistema de foguetes de artilharia de longo alcance e elevada precisão. A maior pendência do projeto é a entrega do míssil tático de cruzeiro AV-MTC, que permitiria à artilharia do Exército atingir um alvo a 300 quilômetros de distância com erro de, no máximo, nove metros. Apenas 11 países detêm essa capacidade, atualmente.
Na avaliação de altos oficiais, o Astros é um equipamento tão importante para o poder dissuasório do Exército quanto os novos caças Gripen para a Força Aérea Brasileira (FAB) ou o futuro submarino nuclear para a Marinha. Os mísseis são guiados por GPS e, pela alta precisão, causam danos colaterais mínimos.
Diante dessas ameaças externas, cresceu dentro do governo e entre os militares a opção pelo pool de empresas nacionais. O BNDES foi então mobilizado pelo Palácio do Planalto para encontrar potenciais sócios da Avibrás no próprio Brasil. Como se trata de um grupo reduzido de candidatos, a tarefa tem sido bastante desafiadora, conforme relataram assessores presidenciais à reportagem da DefesaNet.
A resistência à desnacionalização da Avibrás vem crescendo também na sociedade brasileira. Audiências públicas foram realizadas na Assembleia Legislativa de São Paulo e na Câmara dos Deputados, em Brasília, para discutir o tema. Os trabalhadores da empresa, que está incluída no Sistema Nacional de Defesa, lutam pela estatização da Avibrás como solução para a crise.
O comandante Robinson Farinazzo, ex-oficial da Marinha e editor do canal Arte da Guerra, afirmou em Brasília que a Avibrás é uma empresa estratégica e jamais poderia ser vendida para estrangeiros. “Nós não podemos perder uma empresa como a Avibrás, que tem 60 anos de expertise. E a Avibrás está quebrando por quê? Porque o principal comprador, que deveria ser o governo brasileiro, não compra na proporção exata”, advertiu o militar.
Ele acrescentou que “é baixíssimo o incentivo à indústria nacional”. “A indústria de defesa não é como uma padaria, ela não existe para dar lucro, ela existe para atender à soberania de um país. Nós não podemos perder a Avibrás de forma alguma”, destacou.
Farinazzo falou também sobre a falta de continuidade de projetos militares. “Vários projetos que eu conheci na Marinha nasceram e morreram. A Marinha tinha um projeto excelente, o projeto das fragatas classe Niterói dos anos 70. Infelizmente, por diversos fatores, não foi dado continuidade. Se o Brasil tivesse dado continuidade à classe de fragatas Niterói, não sei onde estaríamos hoje”, observou.
O deputado federal Guilherme Boulos (PSol-SP), candidato à prefeitura da capital, também entrou nesta luta contra a desnacionalização da Avibrás e apresentou no mês passado um projeto de lei na Câmara dos Deputados tornando a fábrica de lançadores de mísseis uma empresa de utilidade pública, com uma cláusula de proibição de sua venda para grupos estrangeiros. O projeto de Boulos “declara a desapropriação por utilidade pública da empresa Avibrás Indústria Aeroespacial S/A, nos termos que especifica”. Na prática, o PL 2957/2024 defende a nacionalização da empresa.
Fundada em 1961 por um grupo de engenheiros do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), a Avibrás tornou-se um dos principais símbolos da indústria de defesa brasileira. Ela tem sede em Jacareí (SP) e foi uma das pioneiras no país de equipamentos bélicos de ponta, como mísseis e lançadores de foguetes. Hoje, a empresa é controlada e presidida por João Brasil Carvalho Leite, filho de um dos fundadores, e está em recuperação judicial. Suas dívidas somam R$ 600 milhões.
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