
Por pequena margem, 50,89% a 49,11%, Karol Nawrocki venceu a Rafal Trzaskowski, que disputou com apoio do premiê Donald Tusk, que anda para cima e para baixo, ao lado de Macron, Starmer e Merz, armando para esticar a guerra
A Polônia, principal retaguarda na guerra da Otan contra a Rússia através da Ucrânia (por onde transita o fulcro da sustentação imperial à guerra), manteve na presidência o Partido Ordem e Lei (PiS), de extrema-direita, com seu candidato Karol Nawrocki suplantando por 50,89% a 49,11% no segundo turno o candidato da direita tradicional, Rafal Trzaskowski, por sua vez apoiado pelo primeiro-ministro, o neoliberal ex-presidente do Conselho Europeu da União Europeia, Donald Tusk. 71,31% dos eleitores compareceram às urnas no domingo passado.
Com uma disputa tão acirrada, Trzaskowski chegou brevemente a comemorar a eleição, com base em pesquisa de boca de urna, mas é Nawrocki que tomará posse em agosto e deverá receber a faixa de Andrzej Duda, também do PiS (na sigla em polonês). Na Polônia, o presidente tem o poder de vetar leis e é o comandante em chefe das Forças Armadas.
A primeira conclusão evidente por si mesma é que a Polônia está dividida ao meio, com analistas apontando que a direita pró-União Europeia (Trzaskowski /Tusk) venceu nas regiões norte e oeste do país, enquanto o PiS levou o sul e o leste.
Como no primeiro turno Trzaskowski ficou na frente (31,36%) de Nawrocki (29,54%), é importante buscar entender como o pleito acabou tendo o resultado que teve. O que não pode ser computado principalmente nas questões de natureza identitária ou ao apoio declarado do presidente Donald Trump (inclusive o PiS adotou como slogan “A Polônia em primeiro lugar, os poloneses em primeiro lugar”).
Parece mais profícuo investigar o papel que a Polônia joga na guerra e suas consequências internas como o fator que decidiu a questão. Aliás, essa é a grande questão com que a Europa se vê no momento, diante do empenho de Londres, Berlim e Paris em manter a guerra na Ucrânia e rearmar o velho continente. E no período recente, Tusk vem sendo a face polonesa desse projeto.
Questão que se entrelaça, no caso polonês, com a existência de 1 milhão de refugiados ucranianos, crescentes conflitos entre agricultores poloneses e ucranianos e questões históricas não resolvidas.
Assim, ao final e ao cabo, o eleitorado do terceiro colocado, Slawomir Mentzen, considerado um “populista de direita” com presença nas redes sociais e que teve 15% no primeiro turno, se deslocou a favor de Nawrocki.
Sem declarar formalmente apoio e chamando seus eleitores a “votarem conforme a própria consciência”, Mentzen entrevistou os dois candidatos ao segundo turno, apresentando uma lista de exigências conservadoras, incluindo a oposição à Ucrânia na Otan. Nawrocki aceitou todas as demandas, enquanto Trzaskowski apoiou apenas algumas.
“CONHECIDO FALSIFICADOR DA HISTÓRIA”
Da parte dos russos, nada era esperado dos dois candidatos. Um respeitado analista russo Boris Rozhin, resumiu a folha corrida de Nawrocki: “conhecido russófobo, falsificador da história e ultradireitista apoiado por Trump” e sobre o qual existe uma investigação judicial na Rússia “por derrubar memoriais em homenagem aos soldados soviéticos”.
Ele acrescentou ainda, entre as peculiaridades de Nawrocki, “não gostar dos banderistas [a cúpula no poder em Kiev e que se assume como ‘herdeira’ de Bandera] por causa do massacre de Volyn” – onde 100 mil poloneses foram massacrados pelos colaboracionistas ucranianos na II Guerra -, e ser “contra a adesão da Ucrânia à OTAN”.
O jornal Vzglyad lembrou outra excentricidade de Nawrocki, hoje com 42 anos: foi hoolligan [torcedor violento] e participava de brigas de rua; atualmente se diz ‘boxeador amador’.
Ou seja, ironiza a publicação, “ele também martelava sua ‘verdade histórica’ com os punhos”.
No caso, uma referência à chefia de Nawrocki no Instituto Nacional de Memória, criado pelo PiS para lançar lama sobre os comunistas, tarefa à qual o historiador se dedicou com afinco, principalmente na destruição de monumentos aos soldados soviéticos e na ocultação da participação dos comunistas na resistência aos nazistas. Note-se que 600 mil soldados soviéticos morreram lutando pela libertação da Polônia do jugo nazista. Talvez seja isso que fez a BBC chamar tal historiador de “nacional-conservador”.
ACUSAÇÃO ÀS “ELITES EUROPEIAS”
Em sua campanha, Nawrocki, ao prometer apoiar o regime de Kiev, ele criticou Volodymyr Zelensky por “ingratidão”. Acusou as “elites europeias” (e seu “mordomo” Tusk) de alimentar a guerra. Prometeu que não enviará tropas polonesas para a Ucrânia.
Também acusou refugiados ucranianos de se aproveitarem da “generosidade polonesa” e prometeu proteger agricultores e caminhoneiros poloneses da concorrência desleal ucraniana. Ele se opôs a qualquer liberalização comercial entre a Ucrânia e a UE. Também prometeu manter o zloty como moeda polonesa, nada de euro.
Resta a pergunta de como a “direita civilizada” tem como prevalecer, quando tudo o que tem a oferecer é o predomínio da máfia de Bruxelas – gente como Madame Von Der Leyen – e a perspectiva de uma grande guerra na Europa em cinco anos, com corte de direitos para bancar o rearmamento, mais a perpetuação da guerra na Ucrânia? Que “democracia” poderá prevalecer sob tal ‘programa’?
MAIS PRÓ-IANQUE DO QUE EUROCÉTICA
Por sua vez, o cientista político Alexander Asafov assinalou que “sob todos os presidentes e primeiros-ministros do PiS, a Polônia sempre foi eurocética e tentou se tornar mais americana do que os próprios americanos”.
“Lembro-me da base militar na Polônia, que foi planejada para ser chamada de ‘Forte Trump’, da compra de sistemas de defesa aérea Patriot por um valor bastante alto para o orçamento de defesa polonês, bem como do confronto com Bruxelas em uma série de questões delicadas, seja a economia verde ou a crise migratória. Portanto, acredito que não veremos nenhuma grande mudança”, concluiu o pesquisador, sobre o que espera a Polônia”.