
Durante sua viagem à França, presidente recebe homenagem da Universidade Paris 8 e exalta papel da educação no combate às desigualdades sociais
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em discurso durante sua viagem à França, voltou a reiterar a importância da regulamentação as redes sociais, diante da resistência oferecida por setores do Legislativo brasileiro.
“Nós temos duas ou três empresas de aplicativo que mandam no mundo. Hoje as pessoas são ricas porque vendem aplicativos que a gente nem sabe se são bons ou não para a humanidade. Temos que trabalhar na regulação dessas redes que, de social, não têm nada”, afirmou o mandatário, numa referência às grandes big techs que operam no Brasil e em todo mundo e são avessas a qualquer tipo de regulamentação, o que faz com que suas estruturas digitais sejam, invariavelmente, utilizadas para a propagação de mentiras, fake news e, até mesmo, crimes contra crianças, adolescentes e cidadãos em geral.
Lula, diante das tentativas de regulamentação das grandes redes digitais, fez um desabafo, após destacar o papel do Estado na promoção da igualdade.
“Eu não sou um homem radical, eu não fico guardando mágoa de ninguém. Eu sou um homem da paz, mas eu não abro mão dos meus valores humanistas. Hoje eu tenho um compromisso: defender a igualdade, defender o direito de estudar, de fazer com que o pedreiro vire engenheiro. Ninguém nasceu para ser inferior ao outro e só quem pode garantir oportunidade a todos é o Estado”, sentenciou.
Lula também voltou a criticar o genocídio promovido pela ditadura israelense em Gaza: “não é possível permanecer indiferente ao genocídio do povo palestino em Gaza”. E reafirmou os princípios que guiam sua política internacional: “a gravidade do momento exige a defesa firme dos valores que unem a humanidade: a defesa da paz, do multilateralismo e do desenvolvimento sustentável”.
O presidente também manifestou preocupação com o avanço da extrema direita no mundo. “O que me entristece muito é que, na política, a gente não tem só avanços, tem muitos retrocessos. Estejam preparados porque há uma corrente no mundo hoje, de uma extrema direita fascista e nazista, que nega as instituições. Eles só têm um discurso: negar a imigração aqui na Europa e falar contra a corrupção”, afirmou Lula.
Em referência ao quadro político nacional, Lula citou Bolsonaro e indicou que espera que o ex-mandatário seja responsabilizado pelas condutas adotadas durante a pandemia. “Chegará o dia em que o Bolsonaro será julgado como criminoso por ter orientado a não tomar vacina contra a Covid”, disse.
Outra questão abordada por Lula foi a crítica ao negacionismo climático, característico de setores da direita radical: “Eles também não acreditam que estamos vivendo uma crise climática capaz de colocar a sociedade em risco”.
Também manifestou-se em defesa do sistema presidencialista, em contraposição às discussões recentes sobre uma eventual transição para o parlamentarismo. “Não fosse a democracia, eu não teria chegado à Presidência da República. Tem gente que fala do parlamentarismo como algo melhor para o Brasil, mas eu jamais teria sido escolhido no Congresso Nacional”, observou Lula.
Com o discurso, Lula buscou não apenas mobilizar sua base política, mas também enviar um recado claro sobre os riscos que enxerga no atual ambiente político nacional e internacional. Em meio à queda de aprovação e à pressão por resultados, o presidente reforçou o compromisso com a democracia, a justiça social e o combate às ameaças autoritárias.
EDUCAÇÃO PARA COMBATER A DESIGUALDADE
O presidente Lula foi laureado pelo título de Doutor Honoris Causa, concedido pela Universidade Paris 8, quando agradeceu pela homenagem, lembrando que “é uma honra ser o segundo brasileiro laureado, colocando-me ao lado de uma grande pensadora e filósofa, amiga, petista, Marilena Chauí”.
Lula dedicou o reconhecimento aos valores que norteiam sua trajetória: justiça social, educação emancipadora e a luta pelos direitos dos excluídos.
Em tom firme, Lula defendeu o papel da política como instrumento de enfrentamento da desigualdade, lembrando que o ensino superior no Brasil sempre foi elitizado até a chegada de governos progressistas ao poder. “Foi preciso que um metalúrgico sem diploma universitário chegasse ao poder pelo voto popular para mudar essa realidade”, disse, referindo-se à própria história.
O presidente referiu-se à universidade como símbolo de inclusão e resistência.
“Paris 8 foi pioneira ao abrir as portas para os filhos da classe trabalhadora, os imigrantes, os que não tinham sobrenome famoso. Mostrou que o saber não é privilégio — é direito”, afirmou.
Lula anunciou ainda a criação da primeira Universidade Indígena do Brasil, prevista para 2026, após consultas com povos originários, e reforçou o compromisso de seu governo em combater a fome. “Tirar o Brasil do mapa da fome, como fizemos em 2014, é o compromisso mais urgente do meu governo”, enfatizou.
O discurso serviu também para atacar a extrema direita ao fazer um paralelo entre o obscurantismo atual e os métodos repressivos das ditaduras latino-americanas. “A extrema direita tem medo da educação porque sabe que é onde nasce a consciência”, declarou.
Lula destacou que a França tem papel histórico na proteção de intelectuais brasileiros perseguidos e defendeu as universidades como trincheiras da ciência, da arte e da liberdade de pensamento, especialmente diante dos desafios contemporâneos como o avanço das tecnologias digitais e a crise climática.
Também vinculou o papel das universidades ao combate à crise climática: “de suas salas, sairão as jovens lideranças que unirão ciência, inovação e conhecimento tradicional para delinear os caminhos de uma transição ecológica justa”.
No fechamento de seu pronunciamento, Lula conclamou as novas gerações à ação transformadora: “que o dia de hoje seja mais uma semente lançada para fortalecer os laços humanos entre a França e o Brasil e para inspirar as novas gerações a sonhar, a questionar e a agir”. E encerrou numa referência ao educador Paulo Freire: “só o conhecimento pode romper as correntes da desigualdade e construir sociedades mais justas”.