
“Todas as 60.734 consultas realizadas no FirstMile durante a vigência do contrato com a Abin foram, assim, ilegais em qualquer contexto”, afirma o relatório da PF
A Polícia Federal identificou mais de 60 mil pessoas espionadas no governo Bolsonaro, entre 2019 e 2021, com o FirstMile, programa espião adquirido por R$ 5,7 milhões do governo de Israel, com dispensa de licitação e sem autorização judicial. Foram quase 1,8 mil telefones monitorados.
O inquérito afirma que “todas as 60.734 consultas realizadas no FirstMile durante a vigência do contrato com a Abin foram, assim, ilegais em qualquer contexto, e disso não se tem dúvida.”
O documento afirma ainda que “o desvirtuamento do emprego da ferramenta tecnológica foi revelado pelo monitoramento de cidadãos do espectro político, jornalistas, advogados e servidores públicos, atendendo a interesses exclusivos do doravante denominado núcleo político, desviando-se de sua suposta finalidade de auxiliar em operações de segurança em áreas de alta criminalidade.”
Tudo isso era feito com a plena ciência do então diretor-geral da Abin e atual deputado federal, Alexandre Ramagem (PL-RJ).
ARTICULADORES
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o filho dele, o vereador fluminense Carlos Bolsonaro (Republicanos), eram os principais articuladores, segundo a PF (Polícia Federal), da chamada “Abin Paralela”.
Essa é a conclusão do relatório da PF, que investiga o uso ilegal da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) durante o governo Bolsonaro. O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes retirou o sigilo da investigação.
O documento da PF tem 1,2 mil páginas e indicia mais de 30 pessoas. Um dos destaques é que o ex-presidente Jair Bolsonaro e o filho dele, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos), são indiciados como os principais responsáveis por direcionar a espionagem.
Toda essa investigação paralela teria como objetivo manter Bolsonaro no poder e promover ataques aos adversários políticos e agentes do Estado, que não estavam alinhados com as posições políticas do ex-chefe do Executivo.
BOLSONARO ERA O PRINCIPAL DESTINATÁRIO
O documento também mostra que o principal destinatário das ações ilegais era o ex-presidente Jair Bolsonaro, e que a “Abin Paralela” usava toda a estrutura da agência — inclusive servidores e recursos públicos —, para promover ataques a autoridades, instituições e até ao sistema eleitoral brasileiro.
Entre os espionados, ilegalmente, não havia apenas opositores do governo de Jair Bolsonaro. Tinha também jornalistas, influenciadores e até religiosos.
O inquérito da PF revela dezenas de alvos da espionagem clandestina dentro da Agência Brasileira de Inteligência, como os ministros do STF, Alexandre de Moraes, na época ele era presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), e Luís Roberto Barroso, atual presidente da Corte.
OUTROS BISBILHOTADOS
Os deputados federais Kim Kataguiri (União-SP) e Arthur Lira (PP-AL), os senadores Omar Aziz (PSD-AM), Renan Calheiros (MDB-AL) e Randolfe Rodrigues (PT-AP), e o delegado do caso Marielle, Daniel Freitas da Rosa.
Também Evair Vieira de Melo (PP) e João Campos (PSB), hoje prefeito do Recife (PE), além do senador Alessandro Vieira (MDB) e do advogado Walfrido Warde.
A Abin também foi utilizada para interferir nas investigações da Polícia Federal contra Jair Renan Bolsonaro, filho do ex-presidente, e atual vereador de Balneário Camboriú (SC), eleito em 2024.
Agentes da inteligência receberam a missão de caçar podres de Alan Gustavo Lucena do Norte, ex-sócio e personal trainer de Jair Renan.