
“O objetivo do governo é reduzir as vagas nas universidades públicas do país. Assim, pensam eles, teríamos apenas a nossa ‘elite intelectual’ estudando”
O Ministro da Educação de Jair Bolsonaro, o colombiano Ricardo Vélez Rodriguez, afirmou recentemente, em entrevista ao jornal Valor Econômico, que o ensino universitário deve ser para poucos. “As universidades devem ficar reservadas para uma elite intelectual, que não é a mesma elite econômica [do país]”. E ainda completou: “A ideia de universidade para todos não existe”.
Realmente não se poderia esperar “soluções” diferentes deste colombiano. Afinal elas estão vindo de uma pessoa mais do que medíocre e sinistra, que até hoje, não se convenceu que Nicolau Copérnico e Giordano Bruno tinham razão sobre o heliocentrismo, que esclareceu que a terra gira ao redor do sol e não o contrário.
O colombiano advoga até hoje que foi correto o envio de Bruno à fogueira pela Inquisição por ele ter insistido na “heresia” de afirmar que “a terra gira em torno do sol. Vélez está convencido que os atuais defensores das ideias de Bruno e Copérnico são “perigosos doutrinadores marxistas”.
Ou seja, para o ministro – uma figura tão obscura quanto tacanha – o problema do Brasil é gente demais pensando, é gente demais estudando. Muita gente nas escolas públicas e nas universidades federais. Em sua opinião, isso é um verdadeiro sacrilégio.
O objetivo do governo é reduzir as vagas nas universidades públicas do país. Assim, pensam eles, teríamos apenas a nossa “elite intelectual” estudando, e mantendo tudo como está.
Essa é sua missão mesquinha e de subdesenvolvimento para o Brasil no Ministério da Educação. O que esse governo, entretanto, não levou em conta, é que essa missão obscurantista e retrógrada é impossível de ser colocada em prática. Isso porque a resistência vem de longe e será muito ampla.
Segundo historiadores, ao ouvir sua sentença de morte, Giordano Bruno disse a seus algozes: “Vocês pronunciam esta sentença contra mim com um medo maior do que eu sinto ao recebê-la”. A prepotência desta proposta excludente, será a arma da reação.
O ministro de Bolsonaro, além de defender a impostura da universidade só para a elite, resolveu atacar toda a população brasileira. Disse que o brasileiro comum, quando viaja “é um canibal”. Ele afirmou com todas as letras à revista Veja, que os brasileiros são ladrões.
“O brasileiro viajando é um canibal. Rouba coisas dos hotéis, rouba assentos salva-vidas do avião; ele acha que sai de casa e pode carregar tudo. Esse é o tipo de coisa que tem de ser revertido na escola”, disse Vélez.
Para assacar esses absurdos ao povo brasileiro indiscriminadamente, o ministro deve achar que todo o Brasil se comporta como Flávio Bolsonaro ou seu capanga, Fabrício Queiroz. Ele deve ter se esandalizado com os desvios milionários de dinheiro público patrocinado pelo filho do presidente e decidiu simplesmente creditá-los ao povo.
O aparvalhado Ministro da Educação resolveu generalizar sobre o conjunto do povo brasileiro os desqualificados e criminosos hábitos que são a marca registrada, não do povo, mas de seus chefes e padrinhos.
Indicado para o cargo por Olavo de Carvalho, guru da extrema direita, que gosta tanto do Brasil que reside há 14 anos em Richmond, Virgínia, a capital dos confederados – isto é, dos escravistas norte-americanos da Guerra Civil, Ricardo Vélez Rodriguez é um colombiano que, como seu padrinho de Virgínia, é um porta-voz do passado colonial, escravista, racista, ignorante e submisso até os cueiros às Cortes estrangeiras.
A solução que o ministro colombiano apresenta para a juventude brasileira não é aumentar as vagas e melhorar a qualidade do ensino no país. Não é ampliar o ensino de tempo integral, como queria Jango já na década de sessenta, e como fizeram Brizola e Darcy Ribeiro de forma esplendorosa, a partir de 1982.
Seu plano, e o de Bolsonaro, é exatamente o contrário, reduzir gastos com o ensino público para que só uma “elite” possa atingir a universidade e usufruir dela no Brasil. E também para que a elite financeira, ou seja, os especuladores, possam usufruir das verbas que deveriam ir para a educação. Melhor dizendo, o que ele quer mesmo é abrir espaço para desviar verbas do povo para os bancos.
Os cortes, pretendidos por Vélez e Bolsonaro na educação vão reduzir as vagas públicas e estimular as arapucas do ensino privado e, particularmente, a farra do ensino à distância. Área onde, coincidentemente, Paulo Guedes atua e tem negócios muitos rentáveis.
Para essa gente, as universidades públicas federais e as escolas públicas do ensino básico do país estão recebendo recursos até demais. Tem que reduzi-los, para assim aumentar os lucros do ensino privado.
O problema para eles, não é o estrangulamento dos salários dos professores e funcionários do ensino básico, nem os cortes de verbas em laboratórios e nos projetos de pesquisa no ensino superior, agravados com a imposição do teto de gastos sociais. Pelo contrário, querem limitar ainda mais esses gastos.
O que Vélez e o governo têm como objetivo, além de procurar encher os cofres dos banqueiros, é perseguir quem pensa com a própria cabeça, é atacar quem não se verga e não concorda com a destruição do ensino público e com o retrocesso civilizatório que eles querem impor ao país.
Em 2018, quando, na eleição presidencial, discutíamos a real situação da educação brasileira, vimos que a taxa de matrícula de estudantes no nível superior no Brasil era muito baixa, apenas 32,8% da população entre 18 e 24 anos estava matriculada em 2017. Esta taxa era de ridículos 34,6% em 2015, mas conseguiu cair ainda mais em 2017. E o pior é que desses cerca de 8 milhões de estudantes universitários, apenas 24,7% ocupava uma vaga pública.
O Plano Nacional de Educação (lei 13.005), aprovado em 2014, estabelece como meta para 2024 elevar a taxa bruta de matrícula na educação superior para 50% da população em idade que varia de 18 a 24 anos. Vélez deve achar isso um escândalo.
Outra estultice que demonstra que Bolsonaro e seu Ministro da Educação não pretendem destruir apenas o ensino superior, com os cortes de gastos já programados, mas também o restante das escolas, é a conversa de reduzir o ensino de tempo integral, estimular o ensino a distância e, até mesmo, acabar com as escolas, alimentando a ideia medieval e esdrúxula da “escola em casa”.
O pretexto para essa monstruosidade é que “a família não pode entregar seus filhos para o Estado doutrinar”.
A “Home School, como os serviçais gostam de dizer, é um conceito que era muito comum na idade média e que foi enterrado pelas conquistas do iluminismo.
Essas ideias estão agora de volta nos EUA de Trump, onde o povo pobre e preto vai sendo cada vez mais deixado de fora de tudo no país. O governo Bolsonaro, que bate continência para tudo o que eles fazem por lá, só quer imitá-los por aqui.
É a segregação educacional servindo as elites dominantes. O ensino público e gratuito é uma conquista que democratizou o ensino no Brasil. O que é imperativo é a sua melhoria, e não a sua extinção.
O ensino individual em casa, nos palácios, nos conventos, o ensino religioso e outros, todos privados e excludentes, estão sendo novamente defendidos para tirar o povo de cena, e desta maneira, sorrateiramente, abocanhar as verbas públicas.
As famílias, que já enfrentam as agruras do desemprego e da carestia de vida, das jornadas estafantes dos trabalhos e dos afazeres domésticos, tudo agravado pela radicalização da política neoliberal, pretendida por Paulo Guedes, terão também – se predominar o fanatismo de Velez&Cia – que tirar seus filhos das escolas e educá-los em casa. É claro que isso não ocorrerá. Só os ricos terão como pagar para ensinar seus filhos em casa.
Essa é o retrocesso que esta gente está querendo. O retrocesso à era medieval. Tudo para excluir o povo, reduzir os gastos sociais e desviar mais recursos para a parasitagem do mercado financeiro.
Nos nossos estudos vimos que, no caso do ensino básico (infantil, fundamental e médio), a falta de recursos e de apoio é muito grave. Ao contrário do ensino superior, a grande maioria dos estudantes está em escola pública: 73,5% dos 56,5 milhões (2017), enquanto 26,5% estudam em escolas privadas.
A escola pública do ensino básico oferece um débil processo de aprendizagem, por várias razões. A principal delas é que os Estados e municípios, que são os responsáveis, não dão conta sozinhos desta missão. Precisam de mais recursos.
O piso salarial do professor é muito baixo: R$ 2.455,35. A jornada é parcial na escola. Como consequência, os estudantes oriundos de escolas públicas têm dificuldades de se manter nos estudos e de ter acesso ao ensino superior.
A postura desse governo é tão desabonadora que a coordenadora do movimento “Todos Pela Educação”, Priscila Fonseca da Cruz, chamou a atenção do ministro da Educação para que ele pare se desviar dos problemas reais da educação brasileira, de ficar apontando falsas polêmicas, e passe a apresentar propostas concretas e urgentes para melhorar o ensino básico e a universidade brasileira.
Por trás da conversa fiada do governo e do ministro bolsonarista, de eleger como prioridade o combate a uma suposta “doutrinação dos professores” e o combate ao marxismo cultural, o que eles pretendem mesmo é impor sua visão retrógrada, vencer a resistência do povo e destruir o ensino público e gratuito, uma conquista da civilização contemporânea, que está ameaçada no Brasil.
Estaremos a postos para garantir esses e outros direitos. Não toleraremos este neocolonialismo, transvestido de modernidade na educação brasileira.
JOÃO GOULART FILHO