Valdir Bandeira Fiorentin*
A tragédia provocada pela Vale na barragem de Brumadinho, em janeiro, mais uma vez nos instiga a uma série de reflexões sobre o papel do Estado no fornecimento dos serviços públicos e, em especial, a preservação do meio ambiente.
Segundo dados da Agência Nacional de Águas (ANA), existem 24.092 barragens cadastradas no Brasil – das quais 790 são ligadas à mineração – necessitando fiscalização regular de forma a evitar tragédias ambientais.
Dessas 24.092 barragens, cerca de 10 mil estão no Rio Grande do Sul – das quais duas figuram como estruturas de risco, segundo a ANA. E o setor responsável pelo cuidado com essas barragens abriga apenas 20 técnicos para as demandas, que, além do mais, se dividem entre outras atividades de igual importância.
Especialistas avaliam que o número de fiscais é insuficiente, impedindo que as vistorias sejam feitas de maneira adequada. O que nos leva a duas perguntas: quanto tempo levará para lamentarmos um novo Brumadinho? Onde a próxima barragem vai estourar?
O quadro fica mais sombrio quando constatamos, nos últimos anos, um processo de desmonte das estruturas públicas no Rio Grande do Sul, onde fiscais e técnicos das mais diversas áreas foram aviltados pelos seus gestores. Órgãos de apoio à fiscalização, como a Cientec, foram desmontados e suas atividades, terceirizadas.
Iniciativas como essas podem colocar em risco o controle das atividades técnicas e a própria segurança da população, como na recente terceirização da atividade de fiscalização dos produtos de origem animal – apesar de toda a argumentação científica comprovar que o caráter público, e portanto isento, do serviço público é essencial para sua eficácia.
Recém passamos, por outro lado, por um processo eleitoral marcado pela defesa de conceitos vinculados às teorias do Estado mínimo, com o candidato vitorioso, que agora é presidente, defendendo que esse modelo é a solução para o Brasil. Além disso, foi amplamente mencionado por aspirantes a cargos políticos, muitos deles também eleitos, que o Brasil é um país com uma máquina pública “inchada” e “ineficiente”.
Mas vamos analisar: segundo relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), se relacionarmos a quantidade de servidores públicos com o total de trabalhadores, o Brasil ficará muito longe de liderar a lista. Enquanto na Dinamarca, país mais próspero do mundo, os servidores públicos representam 30% dos trabalhadores do país, no Brasil os funcionários públicos representam apenas 12%. No Reino Unido, os servidores representam 27%, no Canadá, 20%, e na Itália, 17%.
O momento exige reflexão. E ao menos outras duas perguntas fundamentais: queremos serviços públicos de qualidade no Brasil? E, se queremos, estamos dispostos a pagar por eles? O Brasil precisa de uma conversa franca consigo mesmo, em que a população sente-se à mesa e discuta suas prioridades.
Valdir Bandeira Fiorentin, engenheiro civil, arquiteto e urbanista é diretor do Sindicato dos Servidores de Nível Superior do Poder Executivo do Estado do Rio Grande do Sul – Sintergs