As bancadas do Partido Comunista (PC) e da Federação Regionalista Verde Social (FRVS) no parlamento chileno realizaram uma coletiva de imprensa conjunta na sexta-feira, 15, para apresentar sua primeira avaliação acerca do acordo alcançado na madrugada desse mesmo dia por onze partidos políticos em torno da convocação de um plebiscito e abrir o debate sobre uma nova Constituição.
Tanto o PC, quanto a FRVS, mesmo tendo decidido não assinar o Acordo, o qualificaram como um “avanço inegável”, mas criticaram em pontos que geram dúvidas para a cidadania.
Em declarações ao jornal El Siglo, o presidente do PC, deputado Guillermo Teillier, afirmou que “estamos ante um processo que tem se iniciado em direção a uma Nova Constituição e isto aconteceu graças a todos os protestos, mobilizações, mortos, feridos, aqueles que têm sido torturados e os que não têm sido escutados suficientemente e que ninguém os tem levado em conta, que são os dirigentes sociais de nosso país”.
Assinalou ainda que “não se tomou em conta o verdadeiro protagonista desta história que é o povo do Chile e suas organizações mais representativas. Por isso não fomos, apesar de que nos convidaram à última hora, porque se fez, efetivamente, entre quatro paredes, de maneira excludente, com acordos de cúpula que depois quiseram fazer extensivos – por uma questão de imagem – a partidos como o nosso”.
Mas, apesar dos problemas apontados, o líder comunista ponderou que “este acordo entre a oposição e o Governo tem aberto as portas para a possibilidade de mudar a Constituição e isso é um fato que nós valorizamos. Não podemos negar nem dizer que aqui não tem acontecido nada, ou que não existiu nenhuma mudança. Há uma mudança. O importante é que isto se materialize e se materialize bem”.
“O desafio é corrigir os vícios desse acordo, e depois vem obter triunfos no plebiscito. Nós, no Congresso, vamos fazer todos os esforços para eliminar os vícios que encontramos na proposta. Vamos tentar aperfeiçoar o acordo, também, enquanto à integração, a paridade de gênero, sobre como se garante que participem os povos originários, queremos que estejam muito presentes todos os setores da sociedade”, acrescentou.
A deputada Alejandra Sepúlveda, da FREVS, disse que “valoramos o acordo, mas no marco das mobilizações sociais. Nada disto tivesse sido possível se a cidadania não estivesse nas ruas. Para nós isso é o mais valioso. De todas formas, temos profundas preocupações na redação deste acordo. Esperemos que não seja a cópia feliz do Edén [referência à frase do hino nacional chileno: ‘Chile é a cópia feliz do Edén’], com a mesma representatividade que tem a Câmara dos Deputados”.
Tanto o PC e a FREVS lembraram que ambas as coletividades tem sido atores importantes durante o debate prévio ao acordo. Sublinharam que grande parte do conteúdo estabelecido no que foi acertado na madrugada da sexta-feira tinha sido colocado num apontamento do deputado comunista Hugo Gutiérrez para estabelecer um plebiscito que incluísse a consulta sobre a mudança da Constituição e seu mecanismo, informou Igor Mora, em artigo no El Siglo.
Na mesma línha, a deputada Camila Vallejo apontou que “nós temos sustentado sem nenhum matiz a necessidade de que o ‘plebiscito de entrada’ pergunte pelo mecanismo. Evidentemente não podemos não valorizar esse avanço de poder escolher entre dos mecanismos para a mudança da Constituição”.
Outra questão que levantou preocupação é sobre quem poderá ser candidato para integrar a constituinte já que, segundo uma interpretação do acordo fechado, deveriam ser pessoas filiadas a partidos e, por exemplo, excluindo os dirigentes sociais ou sindicais de se postularem como constituintes.
Resumindo, a proposta divulgada nesta sexta-feira, chamada “Acordo pela paz social e pela nova Constituição”, estabelece que o “plebiscito de entrada” – defendido desde o início pela oposição – terá duas perguntas. Na primeira, o eleitor deve se pronunciar sobre se apóia ou não uma mudança constitucional. A segunda propõe dois mecanismos para a elaboração da Carta Magna: por “Convenção Mista Constitucional”, composta 50% por parlamentares e 50% por eleitos para a constituinte; ou por “Convenção Constitucional”, com 100% de escolhidos apenas com o objetivo de atuar na redação do texto.
O acordo inclui também que o plebiscito seja convocado para abril do próximo ano e que qualquer acordo a que chegue a instância que será criada requererá o apoio de 2/3 de seus membros para sua aprovação, aspecto criticado pelo PC.
PINOCHET RETIROU DO ESTADO A RESPONSABILIDADE COM SAÚDE E EDUCAÇÃO
Na atual Constituição formulada durante a ditadura de Augusto Pinochet (1973-1989) a saúde, educação e previdência não são atribuições do Estado e esses setores – os três pilares principais das reivindicações dos manifestantes hoje – funcionam a partir do mercado privado, ainda que contando com alguns subsídios. O direito à greve, o reconhecimento pleno da liberdade sindical e a negociação Coletiva Setorial são outras questões ausentes na Constituição e que fazem parte das exigências dos chilenos.
O deputado Teillier indicou que “a luta por demandas sociais não pode decair. Eu não pretendo dar instruções ao movimento social, porém desde meu ponto de vista, isso que tem sido essencial para produzir uma mudança de fundo, para encurralar o governo na questão constitucional, que são as grandes mobilizações, deve seguir adiante até conseguir respostas palpáveis em relação às suas exigências”. “Quando tenhamos que escolher a assembléia veremos como o faremos para que seja realmente representativa”, concluiu.
Em definitivo, o presidente do PC disse que “vamos participar de todo o processo, Vamos fazer tudo o que esteja ao nosso alcance para aperfeiçoá-lo, sobretudo a questão dos quóruns e outros temas onde temos dúvidas”.