O Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) decidiu passar por cima do “acordão” selado por Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Jair Bolsonaro, que suspendeu as investigações dos crimes cometidos por Flávio Bolsonaro (PSL), e abriu um novo inquérito para apurar a existência de “funcionários fantasmas” no gabinete do então deputado estadual pelo Rio de Janeiro.
Esta investigação pôde ser aberta porque não demanda informações compartilhadas por nenhum órgão de controle, esclareceu o MP-RJ.
Dias Toffoli aceitou pedido de Flávio Bolsonaro e interrompeu, desde julho, todas as investigações que tiveram por base o compartilhamento de dados do antigo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) com os órgãos de investigação, sem autorização judicial. Em seguida, Gilmar Mendes proibiu a continuidade das investigações do filho do presidente.
O compartilhamento de dados era uma prática rotineira, automática e legal, não necessitando autorização judicial, nas investigações do crime organizado, de corrupção, do narcotráfico e da lavagem de dinheiro. Desde a decisão de Toffoli, que beneficiou Flávio Bolsonaro, as investigações estão paradas em todo o Brasil. O Supremo iniciou a discussão do mérito e deverá decidir sobre a questão nos próximos dias.
O antigo Coaf, hoje UIF (Unidade de Inteligência Financeira), detectou no final do ano passado e início deste ano, uma movimentação financeira suspeita na conta de um ex-assessor de Flávio, o policial aposentado Fabrício Queiroz. Entre 2016 e 2017 foram movimentados R$ 1,2 milhão na conta do funcionário.
Se forem computadas as movimentações de 2014 a 2017, esse valor atinge a cifra de R$ 7 milhões. Até um cheque nominal de R$ 24 mil endereçado à primeira dama, Michelle Bolsonaro foi encontrado pelo Coaf.
A partir deste momento, o governo Bolsonaro iniciou uma perseguição implacável ao órgão de controle que acabou mudando de nome e sendo jogado para o terceiro escalão do Banco Central.
O MPRJ informou que já foram iniciadas diligências referentes ao novo inquérito, como a expedição de ofícios para a Alerj com a requisição de informações.
Há casos escandalosos no gabinete do ex-deputado e, agora, senador do PSL, como é o caso do tenente-coronel da Polícia Militar do Rio, Wellington Servulo Romano da Silva. Ele passou 248 dias fora do Brasil durante o período de um ano e quatro meses em que estava formalmente lotado no gabinete. De acordo com a Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), Servulo Romano da Silva nunca tirou licença no período em que trabalhou na Casa.
Outros casos envolvem familiares de Fabrício Queiroz. Sua mulher, Márcia Aguiar, e suas duas filhas, Nathalia Melo de Queiroz e Evelyn Melo de Queiroz, são investigadas por suspeita de serem laranjas no gabinete de Flávio Bolsonaro. Nathalia Melo Queiroz, filha de Queiroz, era lotada no gabinete de Flávio, mas trabalhava em outro emprego, cumprindo horário comercial, como personal trainer.
Depois, ela foi transferida para o gabinete de Jair Bolsonaro, em Brasília, mas continuou trabalhando como personal trainer no Rio de Janeiro todos os dias da semana. Nathalia só saiu do gabinete de Jair Bolsonaro no dia 15 de agosto de 2018.
De acordo com os registros da Câmara, Nathalia recebeu R$ 225 mil em salários em quase dois anos em que esteve lotada no gabinete do presidente eleito e mais R$ 25 mil em auxílios.
Outros casos que serão investigados pelo novo inquérito são as nomeações para o gabinete de Flávio Bolsonaro da mãe e da mulher do miliciano foragido, Adriano Nóbrega, ex-PM, assassino profissional, chefe do Escritório do Crime, espécie de central de assassinatos das milícias do Rio.
Ex-capitão do Batalhão de Operações Especiais (Bope), Adriano foi expulso da PM em 2014. No Escritório do Crime, Nóbrega era chefe de Ronnie Lessa, vizinho de Jair Bolsonaro, e assassino da vereadora Marielle Franco e de seu motorista Anderson Gomes.
Raimunda Veras Magalhães, mãe de Adriano Nóbrega, aparece no relatório, que originou a investigação sobre Flávio Bolsonaro entre os oito assessores que fizeram repasses para a conta de Queiroz. Ao todo, foram R$ 4,6 mil na conta dele ao longo de 2016. Danielle Mendonça da Costa da Nóbrega, mulher do miliciano, também era fantasma no gabinete de Flávio.
Mensagens contidas no telefone de Danielle Nóbrega, apreendido pelo Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do Rio, durante a Operação “Os Intocáveis”, revelaram que Fabrício Queiroz demitiu Danielle para tentar blindar Flávio e evitar que se tornasse pública a vinculação do gabinete do atual senador com o criminoso de aluguel.
No mesmo dia em que veio a público a investigação por movimentações milionárias na conta de Queiroz, em dezembro de 2018, ele comunicou por Whatsapp a Danielle Nóbrega, que ela estava exonerada do gabinete de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa (Alerj).
Por mensagem de texto, Queiroz pediu à Danielle que evitasse usar o sobrenome do miliciano. Para reforçar o pedido, encaminhou uma foto, divulgada pela mídia na época, na qual ele e Flávio aparecem juntos, lado a lado, no gabinete. Queiroz explicou que o motivo era o fato de que os dois eram alvo de uma investigação.
As duas, mulher e mãe de Adriano, recebiam salários mas não compareciam no gabinete. Outro fato que chama a atenção dos investigadores é que Flávio Bolsonaro homenageou Adriano Nóbrega duas vezes. A primeira, foi uma moção concedida em outubro de 2003, por comandar um patrulhamento tático-móvel, quando estava no 16º BPM (Olaria).
Na época, Nóbrega era primeiro-tenente. No pedido, Flávio escreveu que ele devia ser homenageado “pelos inúmeros serviços prestados à sociedade”.
Dois anos depois, em 2005, Adriano recebeu a medalha Tiradentes, principal honraria da Assembleia Legislativa, também com elogios à sua carreira na PM. Ele estava preso, à época, respondendo pela morte do guardador de carros Leandro dos Santos Silva, de 24 anos, na favela de Parada de Lucas, Zona Norte do Rio.
Familiares disseram que antes de morrer Leandro tinha denunciado PMs que praticavam extorsões a moradores na comunidade. Em 2005, o então deputado federal Jair Bolsonaro discursou em defesa de Adriano, dias depois da condenação do policial a 19 anos e seis meses de prisão pela morte do guardador de carros.
SÉRGIO CRUZ
O Brasil entrou numa furada com esse Bolsonaro e sua familícia…