Nesta segunda-feira (26), Jair Bolsonaro reclamou das críticas emitidas por apoiadores por não ter condições de vetar integralmente o chamado “Fundão Eleitoral”, de quase R$ 6 bilhões:
– Deixar claro uma coisa. Vai ser vetado o excesso do que a lei garante. O extra de 2 bilhões será vetado. Espero não apanhar do pessoal aí, como sempre. Se começarem a bater muito, vão escolher no segundo turno Lula ou Ciro. A crítica é válida quando tem fundamento.
O presidente, ao queixar-se das críticas, acrescentou:
– Já estão me criticando. De vez em quando, dá vontade de falar: ‘vocês merecem os presidentes que tiveram anteriormente’. Merecem, tá ok?.
Pois é, mas a crítica tem fundamento e, como bem assinalou o deputado Marcelo Ramos, 1º vice-presidente da Câmara e substituto imediato de Arthur Lira, “a máscara caiu”, pois o valor original de R$ 1,7 bilhão, turbinado aos quase R$ 6 bilhões com o apoio dos próceres bolsonaristas do Congresso Nacional, inclusive os filhos do mandatário, ficará, como o próprio Bolsonaro anunciou, em torno de R$ 4 bilhões, ou seja, mais do dobro do valor inicial.
O veto total inicialmente anunciado não passou de um blefe, pois Bolsonaro, enfraquecido e em processo acelerado de derretimento político e eleitoral, tornou-se contumaz na prática da blindagem parlamentar para evitar eventual processo de impedimento, diante das inevitáveis conclusões da CPI da Pandemia sobre o ou os crimes de responsabilidade perpetrados pelo presidente ao longo da crise sanitária que já tirou a vida de mais de 550 mil brasileiros.
Bolsonaro, literalmente, está em mar revolto e sua embarcação ameaçada por um naufrágio, depois de esgotadas as possibilidades de uma solução para a economia, em crise aguda e crônica, com suas funestas e trágicas manifestações sociais, agravadas na pandemia e sem fôlego para se recuperar diante da deterioração da produção, do emprego e da renda nacionais provocada pelo ultraliberalismo doentio de Guedes, a quem restou discursos altissonantes de recuperação econômica, incapazes de resistir a um sopro da realidade.
Nesse cenário, restava-lhe uma única tábua de salvação: a imagem, construída falaciosa e demagogicamente na campanha eleitoral de 2018, de que seu governo seria um oceano de peixes puros e incorruptíveis.
Os que o conheciam de perto, desde os tempos das ‘rachadinhas’ praticadas no Parlamento – que se reproduziram na esfera familiar, sabiam que se tratava apenas de um engodo que subsistiu tão-somente diante da falência moral de outras correntes que hegemonizaram, pela direta ou pela esquerda, o poder político central no Brasil nas últimas décadas.
Os escândalos já expostos pela CPI em relação à aquisição de vacinas, as revelações do orçamento secreto e o superfaturamento em algumas áreas governamentais são apenas alguns dos mais eloquentes exemplos de que o incorruptível Bolsonaro deu um salto em relação às práticas anteriores.
“Vocês merecem os presidentes que tiveram anteriormente”… Realmente, alguns ex-governantes, em vários aspectos, não mereceram o voto de confiança que o povo lhes conferiu, mas Bolsonaro, pelo conjunto da obra, na verdade, dos escombros, conseguiu superar a todos, perdendo, agora, o último reduto em que buscava manter a sua sobrevivência política.
Sobrou-lhe o recurso ao terrorismo político como se sua prenunciada derrota nas urnas, ou antes delas, resultasse, inexoravelmente, na volta a um passado rejeitado por boa parte da população brasileira – a mesma que o rejeita e busca novas alternativas, o que atemoriza Bolsonaro pela sua condição de tirá-lo do segundo turno.
Mais do que atemoriza, assombra Bolsonaro, e a demonstração disso está na admissão de um segundo turno entre Ciro e Lula – algo que apenas alguns setores da oposição avaliavam como possível, muito antes do que se previa e a muitas léguas do pleito.
Talvez ai resida a explicação de sua obsessão na construção de uma narrativa em torno da lisura do processo eleitoral vindouro que lhe sirva como base para uma provável virada de mesa – algo sobre o qual os democratas de todos os matizes devem ficar cada vez mais vigilantes.
MAC