“Os recursos do “orçamento secreto” eram distribuídos por vias obscuras, sem que os dados sejam registrados para efeito de controle por parte das autoridades competentes ou da população lesada”, disse Rosa Weber, ao suspender o desvio
Jair Bolsonaro saiu em campo para pressionar o pleno do Supremo Tribunal Federal (STF) contra a decisão liminar da Ministra Rosa Weber de suspender a escandalosa liberação de emendas do chamado ‘orçamento paralelo’. O mecanismo criado por iniciativa do Planalto e sua base é inconstitucional distribui verbas públicas para apaniguados do governo sem nenhuma transparência e nenhum controle da sociedade.
Bolsonaro inovou no desvio de dinheiro público ao utilizar as emendas de relator (RP-9) – antes previstas apenas para correções na peça orçamentária – como forma de distribuir recursos às margens da fiscalização do eleitor e de órgãos de controle do dinheiro público. Ele não explicou porque o processo de liberação de emendas do relator não tem nenhuma transparência. Achou que dava para convencer alguém de que não está comprando votos ara aprovar suas propostas e que “os argumentos usados pela relatora do Supremo não são justos”.
“Não é possível se falar em barganha se quem decide como e onde o dinheiro público deve ser enviado é o relator-geral do Orçamento, ou seja, um parlamentar”, disse ele, alguns dias depois de liberar R$ 1,2 bilhão às vésperas da votação da PEC dos Precatórios para interferir no resultado da votação. Alguns membros da oposição estão chamando o orçamento paralelo de “rachadinha federal” e “mensalão oficial”.
Bolsonaro acha que pode agir como fazia nas rachadinhas e meter a mão no dinheiro, distribuir para seus apaniguados em troca de apoio aos projetos do governo, sem nenhum controle da sociedade e dos órgãos de fiscalização. Quando o STF atende a parlamentares e suspende as irregularidades, ele reclama. “O Supremo age demais nessas questões. A gente lamenta isso aí, não é, no meu entender, papel do Supremo. Os poderes têm que ser respeitados”, declarou o presidente. “Quem quer ser presidente da República, quem quer decidir, que se candidate”, disse Bolsonaro.
O ‘orçamento secreto’ foi apontado como uma irregularidade gritante não só pelo Supremo Tribunal Federal mas também pelo Tribunal de Contas da União (TCU). A Constituição não permite nenhuma verba secreta e é exatamente isso o que ocorre com o esquema montado na Câmara pelo governo.
Na sexta-feira (5) Rosa Weber mandou suspender “imediatamente” a execução das emendas de relator-geral, mecanismo do orçamento secreto, até que os demais ministros da Corte julguem se o formato é ou não legal. A decisão de Rosa Weber respondeu a questionamento de quatro partidos, PSOL, Novo, Cidadania e PSB, que pediam a suspensão dos pagamentos de emenda de relator após o Estadão revelar o esquema.
A análise do mérito está marcada para ser feita no plenário virtual, a partir da 0h desta terça-feira. A decisão do STF foi um duro revés ao governo, que tem distribuído ilegalmente bilhões de reais a um grupo de deputados e senadores para aprovar projetos de seu interesse no Congresso.
O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) afirmou que esse é “o maior escândalo das últimas décadas”. Orlando argumentou que não é preciso aprovar a PEC dos Precatórios para ampliar o programa social do governo. “Bastaria uma MP solicitando crédito extraordinário para este fim e toda a oposição votaria a favor”, afirmou. “A insistência na PEC dos Precatórios tem o objetivo de garantir recursos bilionários para o orçamento paralelo”, denunciou. “Todo o país deve saber para onde vai a verba pública. Eu, que sou deputado, não consigo saber”, disse Orlando.
Na decisão, a ministra Rosa Weber afirmou estar “perplexa” com o esquema de distribuição de recursos públicos. “Causa perplexidade a descoberta de que parcela significativa do Orçamento da União esteja sendo ofertada a grupo de parlamentares, mediante distribuição arbitrária entabulada entre coalizões políticas, para que tais congressistas utilizem recursos públicos conforme seus interesses pessoais, sem a observância de critérios objetivos destinados à concretização das políticas públicas a que deveriam servir as despesas”, afirmou a ministra.
Rosa Weber pontuou ainda que os recursos do “orçamento secreto” eram distribuídos “sem qualquer justificação fundada em critérios técnicos ou jurídicos, realizada por vias informais e obscuras, sem que os dados dessas operações sequer sejam registrados para efeito de controle por parte das autoridades competentes ou da população lesada”.
A ministra da mais alta Corte do País reconhece que o Palácio do Planalto deu dinheiro a congressistas em troca de votos e obrigou o governo a instalar, em 30 dias, uma plataforma centralizada de acesso público, com ampla publicidade sobre os documentos encaminhados aos órgãos e entidades federais que deram base às demandas e/ou resultaram na distribuição de recursos das emendas do relator.
O deputado Alessandro Molon (PSB-RJ), líder da oposição na Câmara dos Deputados, denunciou a medida como sendo a oficialização da compra de votos e do toma-lá-dá cá. “Perto desse descalabro, o escândalo dos anões do orçamento, que ocorreu na década de 90, é muito pequeno”, destacou o parlamentar. Molon e o subprocurador-geral do Ministério Público junto ao TCU, Lucas Rocha Furtado, entraram com um pedido de suspensão das emedas no Tribunal de Contas da União (TCU).