Ex-ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e juristas confirmam que Jair Bolsonaro cometeu crimes de responsabilidade em seus discursos nas manifestações de 7 de setembro.
Carlos Ayres Britto, que foi ministro do STF até 2012, disse que os discursos de Bolsonaro foram uma “nítida ameaça ao Supremo e mais ainda aos ministros Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso”.
Jair Bolsonaro “mais e mais se mostra no seu governo incompatível com a ordem constitucional. Uma ordem intrinsecamente virtuosa faz da democracia o princípio dos princípios jurídicos. Princípio continente de que tudo mais é conteúdo, inclusive a República, a federação e a livre iniciativa”.
“Os crimes do artigo 85 da Constituição se tipificam por um modo de governar que tem sido de costas para a Constituição. São crimes que pressupõem para o seu cometimento um estilo de governo de inadaptação à ordem constitucional”, continuou o ex-ministro, que foi ouvido pelo UOL.
Ayres Britto disse ainda que “em nenhum dispositivo da Constituição o presidente da República enquadra o Poder Judiciário. Menos ainda o ministro do Supremo, menos ainda o Supremo como um todo. Os ministros do Supremo e o Supremo como um todo é que podem enquadrar membros do poder executivo. Isso está na Constituição, isso faz parte das regras do jogo”.
Jair Bolsonaro pressionou explicitamente o presidente do STF, Luiz Fux, para “enquadrar” o ministro Alexandre de Moraes, que é relator do inquérito das fake news e dos ataques à democracia.
“Ou o chefe desse Poder enquadra os seus, ou esse Poder pode sofrer aquilo que não queremos”, discursou em ameaça à democracia.
O ex-ministro Celso de Mello, que saiu do STF em 2020, falou que “essa conduta de Bolsonaro revela a figura sombria de um governante que não se envergonha de desrespeitar e vilipendiar o sentido essencial das instituições da República”.
“É preciso repelir, por isso mesmo, os ensaios autocráticos e os gestos e impulsos de subversão da institucionalidade praticados por aqueles que exercem o poder”, disse ao G1.
Para Gustavo Binenbojm, professor da Faculdade de Direito da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), “o atentado à independência e harmonia entre os poderes e o descumprimento de decisões judiciais, configuram em tese a prática de um crime de responsabilidade pelo presidente da República”.
“O discurso do presidente me parece claramente um discurso de ameaça à independência e harmonia entre os poderes. E, em seguida, ele diz que não cumpriria mais nenhuma decisão proferida pelo ministro Alexandre de Moraes, que ele não existe mais para o presidente da República. Daí que ele ameaça também descumprir decisões judiciais”, continuou o jurista.
Binenbojm explicou que os crimes de responsabilidade podem “resultar em impeachment do presidente e na perda dos seus direitos políticos por 8 anos”.
O professor de Direito Penal da fundação Getúlio Vargas Thiago Bottino criticou os ataques do presidente ao sistema eleitoral.
“Eu fico muito surpreso de ouvir de uma pessoa que se elegeu durante oito vezes por esse sistema, que se elegeu presidente por esse sistema agora diga que esse sistema não funciona. Esse sistema vem funcionando muito bem justamente por conta da Justiça Eleitoral, que é a guardiã desse sistema eleitoral. Descumprir a decisão das urnas, quaisquer que seja ela, também caracteriza um crime de responsabilidade, né. À medida que o povo se manifestar e escolher tomar sua decisão, essa decisão tem que ser respeitada por todos. Você não pode, ao ensejo de questionar o processo, impor a sua vontade”, afirmou ao G1.