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Depois de praticamente extinguir o COAF, de intervir na Receita, de perseguir Sérgio Moro para tentar aparelhar a Polícia Federal, o alvo do governo agora são as forças-tarefas
Os bolsonaristas estão em comemoração pelos tentos obtidos até agora por seu chefe na cruzada do Planalto para pôr fim à luta contra a corrupção no Brasil.
Bolsonaro já havia detonado o COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), depois interveio na Receita e tentou aparelhar a Polícia Federal. Agora, Augusto Aras, seu procurador de estimação, arrematou iniciando o desmonte da Lava Jato.
ARAS CONTRA O “LAVAJATISMO”
O procurador, que não por acaso foi o escolhido por Bolsonaro por fora da lista eleita pelos procuradores, desrespeitando o método legítimo de lista tríplice para a indicação do procurador-geral da República, começou sua sabotagem à luta contra a corrupção atacando o que ele chamou, em reunião do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), de “lavajatismo”.
Reclamou dos “excessos” dos integrantes das equipes de investigação e passou a exigir ilegalmente que todas as informações sigilosas das forças-tarefas de combate à corrupção fossem enviadas a ele. Logicamente, com todo o denodo de Aras, tudo isso acabaria chegando nas mãos do interessado Jair Bolsonaro.
O que todos perguntaram é o que pretendia Augusto Aras com essa exigência absurda, que foi, em boa hora, barrada pelo ministro Edson Fachin, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) responsável pelos processos da Lava Jato?
INFORMAÇÕES SIGILOSAS SERIAM “DOSSIÊS” NAS MÃOS DE BOLSONARO
Não pode ser outra coisa a não ser proteger os corruptos. Impedir operações contra familiares de Bolsonaro, contra aliados e “amigos” do governo, ao mesmo tempo que entrega nas mãos do presidente, um verdadeiro “dossiê” para que ele possa fazer o que mais sabe: chantagear a todos. Principalmente, a quem tenha rompido ou tenha a pretensão de romper com seu desgoverno e bandear-se para a oposição.
O plano de desmonte está em pleno curso. Os bolsonaristas aproveitaram-se de erros e exageros cometidos pelo ex-coordenador da Lava Jato de Curitiba, Deltan Dallaganol, para dar seus passos na destruição dos instrumentos que ainda restam de combate à corrupção. A Lava Jato é a bola da vez e e está sob fogo cerrado do bolsonarismo e de seus aliados de ocasião.
Além de exigir as informações sigilosas dos processos, Augusto Aras indicou representantes nas forças-tarefas da Lava Jato com o claro objetivo de paralisar o seu trabalho. É o que ocorreu no órgão em São Paulo, onde sete procuradores pediram demissão por conta da sabotagem da procuradora Viviane de Oliveira Martinez.
DEMISSÕES EM SÃO PAULO
Em ofício a Aras, os sete procuradores alegaram “incompatibilidades insolúveis com a atuação da procuradora”.
Em outro ofício, dirigido a membros do Conselho Superior do Ministério Público Federal, os membros da força-tarefa de São Paulo, instalada em junho de 2017, relatam que, desde março deste ano, quando Viviane Martinez passou a ser “procuradora natural” – portanto, responsável pela representação judicial da Lava Jato em São Paulo -, as investigações sofreram por uma combinação de descaso e entraves, que acabaram por paralisá-las.
“Desde o início”, escrevem os procuradores da força-tarefa paulista da Lava Jato, “a Procuradora da República Viviane não teve qualquer iniciativa no sentido de chamar reuniões para compreender quais as linhas de investigação que vinham sendo conduzidas, de trabalhar no gabinete em que os demais integrantes da Força-Tarefa trabalham (e que conta com computador e mesa para tanto), e chegou mesmo a retirar parte da estrutura de servidores que existia, à época de sua antecessora, para auxiliar nos trabalhos da Lava Jato”.
GREENFIELD SEM NINGUÉM
O procurador responsável pela força-tarefa da Greenfield, em Brasília, a Lava Jato da capital, Amilcar Lopes, pediu demissão do cargo denunciando o esvaziamento do órgão. “Por maior que seja o espírito público e a vontade de lutar pela Justiça, permanecer como único membro de dedicação exclusiva à força-tarefa pareceu-me inaceitável”, afirmou o procurador.
“Hoje, a Greenfield é um universo imenso de casos e investigações, que envolve cifras bilionárias (ou trilionárias, considerando que temos dados bancários que somam cerca de três trilhões de reais, ao todo, em casos de nosso Simba), sendo de grande relevância e impondo enorme responsabilidade, não sendo possível que um só procurador da República se dedique com exclusividade a esse complexo investigativo. Por maior que seja o espírito público e a vontade de lutar pela Justiça, permanecer como único membro de dedicação exclusiva à força-tarefa pareceu-me inaceitável”, denunciou.
“Desse modo, decidi que este é o momento para meu afastamento da força-tarefa a que dei origem, deixando de ser seu procurador natural ao realizar a permuta de ofício (na Procuradoria da República no Distrito Federal) com o colega Cláudio Drewes, atualmente desonerado para cumprir a função de Procurador-Chefe da PR-DF”, disse o servidor.
Procurador natural da investigação, que desde 2016 apura fraudes em investimentos dos fundos de pensão, ele afirmou que o caso exigiria ao menos 15 membros do MPF em dedicação exclusiva. Ele era o único dos cinco integrantes da equipe nessa condição.
NEM COAF, NEM RECEITA NEM LAVA JATO
Para Bolsonaro não pode haver nenhum órgão autônomo de combate à corrupção e ao crime organizado. É só lembrar do que ele fez com o COAF depois que o órgão denunciou que seu filho, Flávio Bolsonaro, pela montagem de um esquema criminoso para desviar milhões em recursos públicos da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), quando era deputado estadual.
A lavagem de dinheiro, que envolveu até membros das milícias do Rio, usava funcionários fantasmas que devolviam parte dos salários para o parlamentar. O chefe da milícia de Rio das Pedras, o pistoleiro Adriano da Nóbrega, tinha mãe e ex-mulher alocadas no gabinete de Flávio na Alerj.
Segundo o COAF, Fabrício Queiroz era operador do esquema criminoso e movimentou R$ 7 milhões entre 2014 e 2017.
Bolsonaro não escondeu o seu ódio pelo COAF e perseguiu este órgão de todas as formas possíveis até praticamente extingui-lo.
Depois de retirá-lo do Ministério da Justiça sob Moro e transferi-lo para a Economia, não ficou satisfeito e acabou jogando-o no terceiro escalão do Banco Central. A Lava Jato, mesmo com seus problemas, não é confiável para Bolsonaro. Por isso a atual cruzada do Planalto contra ela.
PROTEÇÃO A FLÁVIO E QUEIROZ
Três decisões recentes revelam que a operação abafa dos bolsonaristas está a pleno vapor. A primeira foi a decisão do presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ter revogado a prisão preventiva de Fabrício Queiroz e de sua mulher, Márcia Oliveira, transformando-as em prisão domiciliar, inclusive, no caso de Márcia, ela obteve o habeas corpus de forma inédita na história da Justiça, por se encontrar na época na condição de fugitiva.
Outra decisão neste sentido foi a do ministro Gilmar Mendes, do STF, que atropelou a decisão do ministro Félix Fischer, do STJ, que havia mandado Queiroz e a mulher de volta para a cadeia. Gilmar Mendes agradou Bolsonaro, mantendo a prisão domiciliar de Queiroz.
Depois disso, o mesmo ministro Gilmar Mendes atropelou a decisão de outro colega, desta vez do decano Celso de Mello, que havia arquivado um processo aberto pelo senador Renan Calheiros (MDB) contra Deltan Dallagnol e voltou carga contra o ex-coordenador da Lava Jato.
Por último, mas não menos escandalosa foi a decisão da juíza Cristina Feijó, da 33ª vara cível do Tribunal de Justiça do Rio, de proibir qualquer notícia sobre os crimes cometidos pelo senador Flávio Bolsonaro. Exatamente no momento em que vem à tona que o assessor de Flávio, Fabrício Queiroz, fez 21 depósitos, num total de R$ 72 mil, na conta da primeira-dama Michelle Bolsonaro, surge a inusitada “ordem” para o silêncio.
Isso sem contar com os depósitos da mulher de Queiroz, Márcia Aguiar, no valor de R$ 17 mil, totalizando R$ 89 mil para Michelle Bolsonaro.
SÉRGIO CRUZ
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