“Jair Bolsonaro já dissipou o poder que tinha com os 57 milhões de votos que obteve”, avaliou o ex-governador Ciro Gomes (PDT), ao analisar os primeiros seis meses do governo, em uma entrevista publicada na segunda-feira (08) no site GaúchaZH. Em tese, prosseguiu Ciro, “ele teria força para fazer qualquer coisa, mas perdeu toda essa possibilidade por despreparo e porque faltam projetos”.
“Além disso, está tudo na mão de grupos, num governo heterogêneo. O primeiro grupo fica ao redor do Paulo Guedes e impõe a Bolsonaro um diagnóstico estrutural completamente equivocado”, disse o pedetista. “O segundo são os militares que, para minha vergonha e constrangimento, estão violentando questões nacionais, como a negociata da Embraer, o acordo entre Mercosul e União Europeia e o esquartejamento da Petrobrás”, mencionou Ciro.
“Não tenho nada contra privatização, falo de descuido estratégico que vai comprometer”, afirmou o ex-governador, acrescentando que o terceiro a criar confusão no Planalto “é grupo é o da ‘praça da alegria’, e os mais lesivos desses doidos são os ministros da Educação e das Relações Exteriores”.
Ciro alertou para o fato de que quem está mandando de verdade no governo são os bancos. “O poder real não está na Presidência, mas no setor financeiro”, disse ele. “O que o setor quiser, tem mais potencial de passar no Congresso. Pouco importam as habilidades, grossuras e incapacidades do governo”, observou, ao avaliar as chances de aprovação da Reforma da Previdência.
“Paulo Guedes é um enclave do setor financeiro nas instituições brasileiras. A reforma tributária que poderia fazer alguma coisa pelo Brasil aponta para cima, para os ricos, com tributos sobre heranças mais progressivos e sobre lucros e dividendos. Aí o baronato não quer, então não vai aprovar”, avaliou Ciro Gomes.
Ele avalia Paulo Guedes escondeu o que representava. “Ninguém sabe quem é o Guedes. O que foi eleito foi o antipetismo, mais claro de ser entendido. Essa é a grande fragilidade do Bolsonaro. Ele está fidelizando um núcleo duro, que são obscurantistas, xenófobos, misóginos, um movimento internacional que se replica no Brasil”, afirmou.
Ciro criticou o hegemonismo que “impede a formação de frentes em torno de projetos para o país”. “Tudo o que se falou de frente, da redemocratização para cá, significa hegemonia de populistas, de personalistas, do PT”, salientou. “Se fosse ao redor de um projeto, tudo bem, mas qual projeto? Não tem. É um projeto de poder pelo poder, de concessões das mais variadas por uma pseudoética de que, pela revolução, pode fazer qualquer merda. Daí, a turma do PT relativiza tudo, como se Palocci não fosse réu confesso”, prosseguiu.
Ciro chamou de ‘pecadilho’ do PT “colocar (Michel) Temer na linha de sucessão ou depois, do impeachment, que chamamos de golpe, se associar ao presidente do Senado (à época, Renan Calheiros), que praticou o golpe, nas eleições de 2018”. “Como se fosse normal colocar como coordenador da campanha do (Fernando) Haddad o ex-presidente da Petrobras Sergio Gabrieli. Como assim? Não aprenderam nada?”, indagou o ex-governador.
“Nós, do PDT, escolhemos o caminho correto. Assumimos que fomos derrotados. Não quisemos transformar a luta no Congresso em terceiro turno da eleição. Compreendemos nosso papel, que era atrair Bolsonaro para o jogo democrático. Ele está cumprindo rigorosamente os prazos de tramitação pactuados conosco da reforma da Previdência. Por exemplo, caiu a capitalização, estamos no bastidor disso. Estamos atenuando danos.”, observou Ciro Gomes.
Sobre o juiz Sérgio Moro, Ciro disse que “é um herói com pé de barro, em processo de desmoronamento”. “Você pergunta a qualquer brasileiro: como um juiz deve se comportar numa partida de futebol? Deve visitar o vestiário de um time e mandar um jogador se jogar para marcar um pênalti? A resposta é que destrói o futebol. Mas aí inventaram isso de herói, que não existe. Para mim, Moro é um politiqueiro de quinta categoria”, afirmou Ciro.
Ciro não poupou críticas a Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI). “Pensei que seria uma figura diferente, é um merda também. Imagina um quilo de cocaína no avião do presidente e não cai nem o chefe do GSI? No meu governo, o ministro estaria demitido na hora”, disse.
“Durante a eleição estávamos numa encruzilhada, já percebia que o antipetismo era muito forte, mas não tinha percebido que era a força dominante. Normalmente, as pessoas votam pelo positivo. O cara que esculhamba não é quem ganha normalmente. Desta vez, o povo votou para negar. Me surpreendeu”, disse Ciro Gomes, ao concluir sua análise das eleições.