Relator pediu ao presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para quebrar interstício (prazo) de cinco sessões para votação da proposta em 1º turno. Prazo para apreciação em 2º turno também deve ser superado
Por 16 votos a 10, a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado aprovou, nesta terça-feira (30), a chamada PEC dos Precatórios (PEC 23/21), apelidada de “PEC das Pedaladas”. O texto agora vai a votos no plenário, em dois turnos de votações. O interstício (prazo) de cinco sessões para apreciação da proposta, em 1º turno, poderá ser quebrado.
O colegiado é composto por 27 senadores. Mesmo com todas as negociações e acordos, a votação foi apertada. No plenário não vai ser diferente.
A proposta, é a principal aposta do governo para bancar o programa social Auxílio Brasil e engordar o orçamento secreto. A equipe econômica afirma que, se aprovada, a PEC deve abrir ‘espaço fiscal’ superior a R$ 106 bilhões no orçamento.
Entre outros pontos, a proposta aprovada na comissão: limita o pagamento anual das dívidas da União reconhecidas pela Justiça; e altera o período de cálculo de inflação que reajusta o chamado teto de gastos.
QUEBRA DE INTERSTÍCIO E MUDANÇAS
Relator da PEC, o senador Fernando Bezerra (MDB-PE) disse que pedirá ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que paute a proposta em plenário ainda nesta terça-feira, para votação em 1º turno. O interstício de três sessões para votação em 2º turno também pode ser suspenso. Assim, o Senado pode votar a liquidar essa fatura para o governo ainda nesta terça-feira.
Bezerra fez série de mudanças no texto em relação ao que foi aprovado pela Câmara dos Deputados, em 10 de novembro. Se o plenário do Senado aprovar as alterações, a PEC deverá ser votada novamente pela Câmara.
Mais cedo, nesta terça-feira, o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que a PEC dos Precatórios é a opção “menos ruim” para o Brasil no momento. Isto não é verdade. Haveria, se o governo quisesse, pelo menos duas direções bem diferentes a serem tomadas: cortar percentual de isenções, seria um caminho, e/ou taxar lucros e dividendos de investidores, seria outra possibilidade.
Todavia, para fazer isso, o governo precisaria mexer com o “andar de cima”. Porém, sendo legítimo representante dos ricos e afortunados, Bolsonaro e Paulo Guedes (Economia) sempre optam por arrochar o “andar de baixo”.
Também nesta terça-feira, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, declarou que a solução encontrada pelo governo para bancar o Auxílio Brasil cobrou preço “muito grande” em termos de credibilidade.
Cálculo divulgado nesta segunda-feira (29) pela IFI (Instituição Fiscal Independente), vinculada ao Senado, mostra que a PEC dos Precatórios pode gerar “bola de neve” de R$ 850 bilhões em precatórios não pagos até 2026.
AUXÍLIO BRASIL PERMANENTE
Alteração relevante do texto. A proposta na CCJ prevê mudança na Constituição, a fim de incluir no texto que “a redução da vulnerabilidade socioeconômica de famílias em situação de pobreza ou extrema pobreza” deve ser objetivo da assistência social prestada a quem dessa necessitar.
De acordo com o relator, Fernando Bezerra, essa medida dará caráter permanente ao Auxílio Brasil.
A definição de que o Auxílio Brasil não seria programa transitório foi exigência de senadores durante as negociações de Bezerra para aprovação da PEC dos Precatórios. Os senadores apontavam a possibilidade de o programa ter fins eleitoreiros e durar somente até 2022. O texto aprovado pela Câmara previa que o programa durasse até 31 de dezembro de 2022.
SEM FONTES CLARAS NO FUTURO
O texto aprovado, contudo, não define qual será a fonte de recursos que custeará o programa nos próximos anos.
No relatório de Bezerra, entretanto, está escrito que não se pode “desde logo definir suas fontes de financiamento a partir do exercício de 2023”. O Ministério da Economia confirma não ter encontrado a fonte dos recursos.
Pelo relatório, a criação do Auxílio Brasil permanente fica “dispensada da observância das limitações legais quanto à criação, à expansão ou ao aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento de despesa”.
A medida foi alvo de críticas de senadores, que apontaram para “drible” na LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal).
COMPLEMENTO DO VOTO
Para permitir a votação no colegiado, nesta terça-feira, Bezerra apresentou complemento à proposta, em que determinou que “os limites, condições, normas de acesso e demais requisitos” do programa permanente serão determinados até 31 de dezembro de 2022.
O novo texto determina também que a regulamentação “fica dispensada da observância das limitações legais quanto à criação, à expansão ou ao aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento de despesa”.
Assim, de acordo com relator, a medida faz com que a “excepcionalidade” sobre a LRF seja exclusiva para 2022.
“Para os anos subsequentes, há que atender aos requisitos da Lei de Responsabilidade Fiscal”, escreveu o relator.
CRÍTICAS À SAÍDA PROPOSTA PELO GOVERNO
O debate concentrou-se a maior parte do tempo em torno da solução escolhida para criar o espaço fiscal, o parcelamento dos precatórios — medida que, segundo os opositores, abala a confiança dos investidores nas contas públicas do Brasil. Senadores mais antigos na Casa, entre eles Alvaro Dias (Podemos-PR) e Esperidião Amin (PP-SC), lembraram que ao longo da história foram aprovadas várias leis e emendas à Constituição postergando o pagamento de precatórios, com consequências negativas para a economia do País.
“Um dos males da Administração Pública é essa estratégia de rolar, de se transferir a responsabilidade para o amanhã. É o que fazemos aqui”, lamentou Alvaro Dias.
Autores de substitutivo global à PEC, Alessandro Vieira (Cidadania-SE), José Aníbal (PSDB-SP) e Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) insistiram que não seria necessário, segundo eles, mexer na regra do teto de gastos para bancar o Auxílio Brasil. O substitutivo resolvia a questão retirando do teto, excepcionalmente em 2022, as despesas com precatórios.
OUTRAS MUDANÇAS
Bezerra também definiu os percentuais de pagamento dos precatórios referentes ao Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental).
O texto prevê cronograma para pagamento de três parcelas anuais, com o pagamento de:
1) 40% até 30 de abril de 2022; 2) 30% até 31 de agosto de 2023; e 3) 30% até 31 de dezembro de 2024.
Há, também, a previsão de que as receitas devem ser aplicadas “na manutenção e desenvolvimento do ensino fundamental público e na valorização do magistério”.
Em mudança de última hora no texto, Bezerra acatou nesta terça-feira pedido de senadores e decidiu excluir os precatórios do Fundef do cálculo do teto de gastos. A medida, segundo ele, abre espaço de R$ 10 bilhões para o pagamento de precatórios alimentícios.
COMISSÃO MISTA
Bezerra também incluiu no relatório a criação de comissão mista no Congresso, composta por deputados e senadores, para fazer análise sobre o pagamento dos precatórios em prazo de 1 ano.
O colegiado contará com a cooperação do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e o apoio do TCU (Tribunal de Contas da União) e terá, entre as atribuições, apurar o desempenho dos órgãos do Executivo responsáveis pela representação judicial e pelo acompanhamento dos riscos fiscais decorrentes das ações judiciais em curso.
As conclusões da comissão devem ser encaminhadas aos presidentes do STF (Supremo Tribunal Federal) e do STJ (Superior Tribunal de Justiça).
MAIS MUDANÇAS
Na semana passada, Bezerra já havia trazido mudanças em relação ao texto da Câmara, como garantir que todo espaço aberto no orçamento seja vinculado ao pagamento de auxílio social. Além disso, estabeleceu como permanente o pagamento de R$ 400 do Auxilio Brasil.
Leia quais foram as alterações:
- Auxílio Brasil foi transformado em programa permanente e condicionado ao espaço fiscal aberto pela correção do teto de gastos e não mais pelo limite no pagamento de precatórios;
- Foi retirada a exigência de fonte de financiamento para o programa;
- Ficou definido que as receitas recebidas por Estados e municípios pelo pagamento de precatórios do Fundef serão aplicadas na manutenção e desenvolvimento do ensino fundamental público, e na valorização do magistério;
- Pelo menos 60% do montante deverá ser repassado aos profissionais do magistério, incluindo aposentados e pensionistas, na forma de abono;
- Foi vinculado o aumento do espaço fiscal à ampliação de programas sociais de combate à pobreza e à extrema pobreza e gastos com Saúde, Previdência e Assistência Social; e
- Foi tornada obrigatória a inclusão, no orçamento das entidades de direito público, de verba necessária ao pagamento de seus débitos, oriundos de sentenças transitadas em julgado, constantes de precatórios judiciários apresentados até 2 de abril, fazendo-se o pagamento até o final do exercício seguinte, quando terão seus valores atualizados monetariamente.
M. V.