Partidos entram com representação no Conselho de Ética do Senado por falta de decoro por parte do senador na compra do imóvel com dinheiro desviado da Alerj. Deputado Freixo
A compra, por Flávio Bolsonaro, da mansão duplex de 2.500 metros quadrados, localizada em área nobre de Brasília, por R$ 6 milhões, logo após a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ter anulado a quebra do sigilo bancário e fiscal dele e de outros tantos envolvidos no esquema da rachadinha, causou estranheza e perplexidade nos meios políticos.
A nova casa de luxo de Flávio tem dois andares, piso em mármore, academia, sauna integrada com a piscina, churrasqueira, forno de pizza, brinquedoteca, salas de jantar e estar, garagem para oito carros, além de um espaço para home theater e monitoramento por câmeras. A mansão fica no Lago Sul bem próxima do lago Paranoá, zona altamente valorizada na capital federal.
MANSÃO VALE TRÊS VEZES OS BENS DECLARADOS POR FLÁVIO
O novo patrimônio é mais de três vezes o declarado pelo senador na eleição de 2018 (R$ 1,74 milhão). O montante incluía um apartamento na Barra da Tijuca no valor de R$ 917 mil, salas comerciais no mesmo bairro no valor de R$ 150 mil, além de aplicações e investimentos de R$ 558.200 e um carro Volvo XC 2014 de R$ 66.500. Havia ainda R$ 50 mil referentes a sua participação em uma loja de chocolates, recentemente vendida pelo senador. Por coincidência o valor do imóvel, R$ 6 milhões, é idêntico ao valor que o MP calcula que foi desviado da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). O MP calcula que foram roubados R4 6,1 milhões.
A Rede, Psol e PT protocolaram, na quarta-feira (3), ofício cobrando abertura de processo por quebra de decoro parlamentar do senador Flávio Bolsonaro no Conselho de Ética do Senado Federal. Eles solicitam esclarecimento sobre a aquisição da mansão de R$ 6 milhões em Brasília. “Considerando o patrimônio de Flávio Bolsonaro declarado em 2018, ele teria que poupar R$53 mil ao mês para comprar essa mansão. O salário dele é R$25mil, então assumo que a loja de chocolates tem dado muito dinheiro nos últimos tempos”, disse a deputada Tábata Amaral (PDT-SP).
O deputado federal Marcelo Freixo (Psol-RJ), que é do mesmo estado de Flávio Bolsonaro, questionou a origem do dinheiro para a compra do imóvel de luxo. “Só com dinheiro de salário, acho praticamente impossível comprar uma casa de R$ 6 milhões. Ele não gastava com mais nada? É um deboche. Flávio é investigado por corrupção, com uma denúncia robusta do Ministério Público, incluindo sua loja de chocolate para lavar dinheiro”, afirmou.
O ex-governador Ciro Gomes (PDT) repercutiu nesta quarta-feira (3), em seu twitter, uma mensagem de uma apoiador que diz que “o que me chama mais atenção na compra da mansão de Flavio não é o preço abaixo do mercado e os juros bancários de pai pra filho que o BRB lhe deu. É a sensação de que eles já se consideram intocáveis, inimputáveis, façam o que fizerem. E, olhando bem, tem sido, não é?”
FLAVO FOI DENUNCIADO POR CORRUPÇÃO
Desde 2018, Flávio Bolsonaro é investigado por um esquema criminoso de desvio de salários de funcionários fantasmas em seu gabinete no período em que foi deputado estadual no Rio de Janeiro. Ele desviou 6,1 milhões de reais de proventos de 12 de assessores entre os anos de 2007 e 2018, segundo cálculos do MPF-RJ. Parte desses recursos abasteceram as contas de seu antigo braço direito, o ex-policial militar Fabricio Queiroz, hoje em prisão domiciliar. O MPF-RJ investiga o uso de sua loja de chocolate, que ele vendeu recentemente, como lavanderia de dinheiro desviado.
Só na conta de Fabrício Queiroz o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) flagrou uma movimentação suspeita de R$ 7 milhões entre 2014 e 2017. Ele não tinha renda compatível com essa movimentação. O esquema foi batizado de “rachadinha”, onde os funcionários fantasmas devolviam parte dos salários que eram embolsados pelo deputado.
Entre os fantasmas que foram contratados em seu gabinete estavam a mãe e a mulher, e depois ex-mulher, do miliciano Adriano Nóbrega, ex-capitão do Bope, chefe da milícia de Rio das Pedras e assassino profissional. Adriano foi morto na Bahia no ano passado, numa operação policial montada para capturá-lo. Queiroz, operador do esquema, chegou a depositar 21 cheques, até hoje não explicados, na conta da primeira-dama Michelle Bolsonaro, num valor total de R 49 mil.
O filho de Jair Bolsonaro foi denunciado no final do ano passado pelos crimes de lavagem de dinheiro, peculato e organização criminosa. A investigação detectou 19 imóveis que ele comprou e vendeu entre 2010 e 2017, pelos quais lucrou cerca de 3,1 milhões de reais. Tanto ele quanto o Planalto pressionam para que as investigações seja interrompidas. Recentemente, o STJ anulou a quebra de sigilo bancário feita contra ele. A defesa de Flávio ainda tenta também declarar ilegal o compartilhamento de relatórios do Coaf com o MPF.
SEM RENDA PRÓPRIA PARA BANCAR MANSÃO
A compra da mansão foi oficializada no dia 2 de fevereiro e revelada pelo site O Antagonista na última segunda-feira. Conforme a escritura, pouco mais da metade do valor casa (3,1 milhões de reais) foi financiada por meio do banco público BRB, banco público de Brasília. O empréstimo foi parcelado em 360 meses, com “taxa de juros nominal reduzida de 3,65% ao ano”, condições melhores do que o mercado costuma oferecer. Como beneficiária do financiamento também está a mulher de Flávio, Fernanda Antunes Figueira Bolsonaro, que há menos de dois anos trabalha como dentista na capital.
Segundo levantamento feito por especialistas, o casal gastará 18.744 reais mensais como prestação da casa. É pouco mais da metade da renda mensal deles juntos: 36.957 reais. De acordo com esse especialistas, as rendas são menores que a mínima exigida pelo BRB para contratação de financiamento nessas condições. O beneficiário do empréstimo deveria receber ao menos 46.401 reais, conforme simulador disponível no site da instituição.
O presidente do BRB, Paulo Henrique Costa, é um dos nomes que têm sido cotados para substituir André Brandão no comando do Banco do Brasil, segundo o portal Metrópoles.
NÃO HÁ COMPROVAÇÃO DA ALEGADA VENDA DE IMÓVEL
Flávio Bolsonaro postou um vídeo tentando explicar a compra da mansão. Acusou de “narrativa criminosa da imprensa em cima de uma simples compra e venda de imóvel”. Justificou que adquiriu sua nova casa após vender um imóvel e uma franquia de loja no Rio de Janeiro. Essas vendas, contudo, ainda não foram oficializadas em cartórios de registro de imóveis e na Junta Comercial do Estado. Ele disse que “foi um instrumento particular de compra e venda, que daqui a pouco vai ter uma escritura pública também, e está na fase de elaboração das certidões”.
A franquia a qual ele se refere é a da loja de chocolates Kopenhagen, que, conforme o Ministério Público do Rio, era usada para lavar o dinheiro dos desvios de recursos dos assessores do então deputado e hoje senador, já que boa parte das compras eram feitas em dinheiro vivo e em quantias iguais todos os meses. Flávio era dono de 50% da franquia. Ele também comprou os imóveis, inclusive o que ele cita agora que vendeu, com dinheiro vivo sem correspondência com sua renda declarada.