A Confederação Israelita Brasileira, Conib, condenou a equiparação de medidas do Supremo Tribunal Federal, STF, no sentido de reunir provas em uma investigação que inclui o ministro da Educação de Bolsonaro, Abraham Weintraub, com a “Noite dos Cristais”, ação perpetrada de forma articulada e direcionada como largada do terror vandálico nazista para o extermínio de milhões de judeus na Europa, durante a Segunda Guerra Mundial.
“Não há comparação possível entre a Noite dos Cristais, perpetrada pelos nazistas em 1938, e as ações decorrentes de decisão judicial no inquérito do STF, que investiga fake news no Brasil”, diz a nota da Conib, publicada no dia 27.
“A Noite dos Cristais, realizada por forças paramilitares nazistas e seus simpatizantes, resultou na morte de centenas de judeus inocentes, na destruição de mais de 250 sinagogas, na depredação de milhares de estabelecimentos comerciais judaicos e no encarceramento e deportação a campos de concentração”, prossegue a entidade que congrega todas as federações de organizações judaicas de todo o Brasil.
A Conib ressalta ainda que “as ações do inquérito, por sua vez, se dão dentro do ordenamento jurídico, assegurado o direito de defesa, ao qual as vítimas do nazismo não tinham acesso”.
“A comparação feita pelo ministro Abraham Weintraub é, portanto, totalmente descabida e inoportuna, minimizando de forma inaceitável aqueles terríveis acontecimentos, início da marcha nazista que culminou na morte de 6 milhões de judeus, além de outras minorias”, finaliza a declaração.
Em mensagem por twitter, Weintraub chama a ação de busca e apreensão como “dia da infâmia”, “vergonha nacional” e “Noite dos Cristais brasileira” e termina investindo contra a imprensa que, nas palavras dele, seria, a um só tempo “oligarca” e “socialista” e que estaria saudando a operação da Polícia Federal, fazendo a famigerada saudação nazista: “Sieg Heil!”
Este é twitter de Weintraub, que se escuda em ser neto de sobrevivente do genocídio nazista para as estúpidas referências:
O Instituto Brasil-Israel, IBI, repercutiu a nota da Conib acrescentando que “na luta aberta que estamos assistindo entre o poder executivo e o poder judiciário, alusões ao nazismo apareceram novamente na cena pública brasileira. Dessa vez, em jogo reverso”.
“Como todos sabem, ministros do governo federal têm sido criticados por trazerem à tona discursos que se assemelham ao nazismo, em forma e conteúdo. Em meados de janeiro, o ex-secretário de cultura Roberto Alvim divulgou um vídeo emulando a estética e o discurso de Joseph Goebbels; e ainda este mês, a Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência (Secom) publicou uma variação da frase escrita nos portões do campo de concentração de Auschwitz: ‘O trabalho liberta’”.
“Agora”, prossegue a declaração do IBI, “invertendo as acusações, membros do executivo nacional e aliados de Bolsonaro reagem ao inquérito das Fake News do STF”, como se o conjunto dos instrumentos legais de busca e apreensão equivalesse a um tratamento nazista contra os ministros, empresários e parlamentares que montaram uma rede de mentiras para difamar, desinformar e intimidar.
O posicionamento do IBI traz informações sobre outras atitudes similares à do ministro Weintraub (que, dias antes das medidas tomadas pelo STF, disse durante reunião ministerial que “os vagabundos do STF” deveriam ir “para a cadeia”.
– Roberto Jefferson, presidente nacional do PTB, investigado por disseminação de fake news e ataques a instituições nas redes sociais, se referiu ao STF como o Tribunal do Terceiro Reich, instituído por Hitler.
– Allan do Santos, jornalista do portal Terça Livre e alvo da mesma operação da Polícia Federal, compara o Ministro Alexandre de Moraes a Hitler.
“Agora, Alexandre de Moraes usa de toda a força do Estado. Assim como Hitler, ele age como os nazistas agiram e como os comunistas costumam agir“. “Se aqui fosse os EUA, as minhas prerrogativas constitucionais estariam sendo respeitadas, mas não estão. Estamos no Brasil e não estamos vivendo em uma democracia”, disse o jornalista.
RISÍVEL E TRÁGICO
“É risível e trágico: aqueles que incorporam a linguagem e a estética nazista agora acusam os outros da mesma coisa para se vitimarem. Apenas parem. Vocês ofendem a memória das verdadeiras vítimas do nazismo e não enganam ninguém”, conclui o IBI.
“Trata-se de mais uma tentativa de representantes do governo Bolsonaro, de manipular a história em seu benefício. Em especial, a história e os símbolos judaicos”, afirma Jayme Brener, jornalista, diretor do Observatório Judaico dos Direitos Humanos no Brasil “Henry Sobel”.
Mais grave por vir de um ministro da Educação que, em sua gestão, notabilizou-se apenas pela ignorância e pela violência verbal. E por usar sua origem judaica, quando interessa a seu governo, como um escudo de proteção contra as bobagens que fala. Não caímos nessa”, acrescenta Brener.
A organização norte-americana American Jewish Committee, AJC, também se insurgiu contra o despropósito de Weintraub e outros bolsonaristas.
“A repetida instrumentalização política de linguagem referente ao Holocausto por funcionários do governo brasileiro são profundamente ofensivas ao judaísmo no mundo inteiro e um insulto à vítimas e sobreviventes do terror nazista, afirma o AJC.
EMBAIXADA DE ISRAEL CONDENA FALA DE WEINTRAUB
A embaixada de Israel também se manifestou afirmando que “houve um aumento da frequência de uso do Holocausto no discurso público” e que isso “banaliza sua memória e a tragédia do povo judeu”.
A embaixada insiste que “pela amizade forte de 72 anos entre nossos países, pedimos que a questão do Holocausto fique à margem da política e ideologias”.
O cônsul geral de Israel em São Paulo, Alon Levi, também achou absurda a comparação de Weintraub com “a maior tragédia da história moderna, onde 6 milhões de judeus, homens, mulheres, idosos e crianças foram sistematicamente assassinados pela barbárie nazista”.
NOITE DOS CRISTAIS
A Noite dos Cristais foi uma etapa no processo que levou ao extermínio de judeus perpetrado pelo nazismo, vejamos alguns elementos desta tragédia:
Na noite de 9 para 10 de novembro de 1938, em um incidente conhecido como “Kristallnacht” (Noite dos Cristais), os nazistas alemães incendiaram sinagogas, vandalizaram lares judeus.
Naquela noite, cerca de 100 judeus morreram em meio à explosão de brutalidade da turba açulada pelos nazistas.
Nos dias que se seguiram àquela fatídica noite, cerca 30.000 judeus foram internados em campos de concentração nazistas.
Desde 1933, quando Adolf Hitler tornou-se chanceler da Alemanha e antes da Kristallnacht, começaram a ser colocadas em prática medidas discriminatórias e de perseguição contra os judeus. Mas nada fora, até ali, similar à violência que aquela noite mostrou.
Nos anos que antecederam àquela noite, foram tomadas medidas, como a que determinava que os judeus não podiam mais exercer atividades ligadas a serviços públicos e encetadas campanhas de propaganda, como a que instava os alemães a boicotarem lojas de judeus.
Em maio de 1933, livros e trabalhos de autores judeus e outros considerados anti-germânicos, foram queimados em uma pira erguida diante da Casa da Ópera em Berlim.
Em 1935, as casas comerciais alemãs anunciaram que não atendiam mais judeus e outras leis determinavam que somente os arianos poderiam ser considerados cidadãos alemães plenos. O casamento entre arianos alemães e judeus passou a ser ilegal. Mas a Noite dos Cristais pode ser considerado momento do desatar da violência física contra os judeus que desembocaria no morticínio que viria a ser denominado de “Solução Final” teve início.
NATHANIEL BRAIA