Pesquisadores do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) divulgaram nesta semana (17) uma carta aberta na qual defendem uma injeção de investimento público para combater impactos do coronavírus na economia brasileira.
“As medidas econômicas anunciadas pelo governo brasileiro são paliativas: suficientes apenas para impedir a ruptura do sistema de crédito sem conseguir estimular a economia, pois o aumento da liquidez deverá ficar empoçado no sistema financeiro. Entretanto, a política de gastos governamentais deveria assumir papel central na reativação econômica e na economia de guerra na área da saúde. Para tanto, são necessários gastos adicionais ao previsto no orçamento para a infraestrutura de combate à doença e coordenação do governo central em virtude da baixa capacidade fiscal dos estados e municípios”, afirmam os 75 professores da UFRJ que assinaram a “Carta Aberta de Professores do Instituto de Economia da UFRJ: Impacto Econômico da Covid-19 e Medidas de Combate à Crise Econômica”.
As reformas não foram eficazes e ampliaram as vulnerabilidades diante da crise, destacam os professores da UFRJ.
“As reformas já aprovadas (Emenda Constitucional 95/2016 do “Teto dos gastos”, reformas trabalhista e previdenciária) não foram capazes de proporcionar a retomada do crescimento econômico e, em alguns casos, ampliaram as vulnerabilidades para enfrentar os desafios atuais das crises de saúde e econômica provocadas pela Covid-19. A EC 95/2016 [PEC do teto de gasto], por exemplo, alterou o cálculo do mínimo constitucional na área de saúde que implicou uma redução de mais de R$ 20 bilhões nos recursos federais que deveriam ter sido utilizados para saúde pública desde 2018. Ademais, somada a um resultado primário rígido, essa emenda constitucional impede a execução de políticas fiscais anticíclicas que permitem, durante a crise, manter o fluxo de renda da população, por meio de instrumentos de transferência de renda e da ampliação de investimentos”, destacam os professores.
Os economistas alertam que a resposta do governo Bolsonaro é insuficiente para evitar que o Brasil entre em recessão.
“A economia brasileira será profundamente afetada por essa conjuntura crítica decorrente do avanço na Covid-19 no país, o que é agravado pela nossa situação prévia de baixo dinamismo e incapacidade para recuperar os níveis de produção anteriores à recessão de 2015-16. Nesse quadro, que já era preocupante antes de a pandemia se instalar, a resposta do governo brasileiro para enfrentar a crise econômica (plano divulgado no dia 16/03/2020) gera ainda maior preocupação ao não propor nenhum recurso novo, apenas antecipação de recursos ou diferimento de pagamentos. Ademais, o ministro da Economia mantém o discurso de que a melhor resposta para combater a crise econômica seria a aprovação das reformas administrativa e tributária”.
“Diante desse quadro, a economia brasileira deverá mergulhar numa recessão em 2020, provocando a ampliação do número de desempregados e da população em situação de extrema pobreza. Segundo estimativas realizadas por Warwick McKibbin & Roshen Fernando a economia brasileira deverá perder, em 2020, dois pontos percentuais de crescimento, num cenário mais favorável, e até oito pontos percentuais num cenário mais desfavorável”, afirma os economistas, com base no estudo: The Global Macroeconomic Impacts of COVID-19: Seven Scenarios, de Roshen Fernando e Warwick MacKibbin, da Universidade Nacional da Austrália.
Os professores alertam também que em uma economia sob efeito da Covid-19, haverá um esgotamento da capacidade instalada, escassez da mão de obra, elevação do desemprego, além da falta de produtos e insumos.
“A recessão está contratada e pode ter a gravidade de uma depressão caso não sejam utilizados todos os instrumentos disponíveis de política econômica, sobretudo os fiscais, para combater a crise. Em uma economia sob efeito da Covid-19, haverá um esgotamento da capacidade instalada e escassez da mão de obra no setor saúde, combinados a desemprego e falta de produtos e insumos nos outros setores. Nesse contexto, a necessidade de priorizar os objetivos imediatos do país – a luta contra a pandemia e a contenção dos seus efeitos sobre a atividade econômica – em detrimento do equilíbrio fiscal de curto prazo não é uma questão ideológica”.
Por fim, os 75 professores da UFRJ sugeriram as seguintes medidas para combater a crise:
1) Ampliação dos benefícios e de programas de transferência de renda para famílias, de trabalhadores formais e informais que perderem ou tiverem sua capacidade de geração de renda diminuída pela crise, em especial para as famílias afetadas pela pandemia com filhos em idade escolar, garantindo que estes possam permanecer junto aos pais.
2) Eliminação da fila do Bolsa Família e reajuste do benefício.
3) Recomposição da verba de saúde em relação aos mínimos constitucionais definidos antes da EC 95/2016 e garantia de recurso extra para ampliação de testes, de leitos e aquisição de equipamentos para emergência.
4) Recomposição das verbas para Ciência e Tecnologia, especialmente para áreas capazes de enfrentar a pandemia, de forma a garantir nossa capacidade de desenvolver medicamentos e vacinas.
5) Alteração das demais regras fiscais vigentes, além do Superávit Primário, como a Regra de Ouro e a suspensão do Teto de Gastos, de forma a se criar um espaço legal para a necessária política de expansão dos gastos públicos.
6) Suspensão de multa, juros e penalização sobre pagamento atrasado de contas dos serviços de utilidade pública.
7) Ajuda fiscal aos estados e municípios, seja por meio de transferências do governo federal, seja pela renegociação de dívida, de forma a permitir aos entes subnacionais elevar seus gastos para fazer frente à emergência médica e seus impactos sociais mais imediatos.
8) Política de expansão de crédito e alongamento de dívidas utilizando os bancos públicos, para socorrer empresas e famílias mais afetadas pela pandemia.