A ministra da Cultura, Margareth Menezes, defendeu o restabelecimento da Cota de Tela para filmes nacionais no Cinema. Criado em 2001, o mecanismo busca promover a produção audiovisual brasileira, obrigando os cinemas comerciais de todo o país a destinarem parte de sua programação à exibição de filmes nacionais.
“O projeto sobre Cotas de Telas está no Senado. Na próxima semana, ele deve ir à votação e queremos dar boas notícias”, disse a ministra, durante a cerimônia de abertura do 51º Festival de Cinema de Gramado, realizada no sábado, na cidade da Serra Gaúcha, a cerca de 150 quilômetros de Porto Alegre.
Em abril de 2019 foi o fim da cota de tela, que havia sido modificada e reduzida ainda no governo Temer e não foi assinada pelo então presidente Jair Bolsonaro, a situação do cinema nacional piorou muito.
Recentemente, as principais estreias de cinema do mês de julho, as duas maiores do ano, os filmes hollywoodianos, “Barbie” e “Oppenheimer”, chegam ao Brasil dominando os cinemas. Cerca de 80% das salas do país estão reservadas para sessões dos longas americanos, e Barbie tem três vezes mais telas que o Oppenheimer.
A trama sobre a boneca da Mattel, estrelada por Margot Robbie e dirigida por Greta Gerwig estreou com exibição em 2.056 salas de 767 cinemas. Já o drama de Christopher Nolan sobre o criador da bomba atômica ocupa 710 salas em 511 endereços.
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Divulgados pelo braço da Warner Bros no Brasil, responsável pelos lançamentos de “Barbie” e “Oppenheimer”, produzido pela Universal, os dados equivalem a 60,45% e 20,87% das salas de cinema em território nacional, respectivamente.
Filmes brasileiros, incluindo os comerciais, ainda sofrem com exibição em péssimos horários, o que acarreta na diminuição do público. As produções nacionais estão programadas para sessões antes das 16h, quando as salas têm menos público. Dados do Sistema de Controle de Bilheteria da Ancine mostram que a participação de filmes brasileiros nas sessões após 17h caiu de 14% (2018/2019) para 7% no último ano. Filmes nacionais também são mais exibidos em dias úteis, com ingresso mais barato, o que gera menor arrecadação. Em 2020, apenas 4,2% dos frequentadores de cinema escolheram filmes brasileiros, contrastando com a média de 15% nos anos anteriores.
A queda de público não se relaciona com lançamentos, já que em 2020, 246 filmes nacionais foram lançados (37% do total), mas a audiência não aumentou. Em 2021, até junho, 152 filmes brasileiros foram exibidos, arrecadando 0,9% do público total.
Produtores culpam a falta da cota de tela, pois os melhores dias e horários das salas são majoritariamente ocupados por filmes estrangeiros. O último modelo de cota de tela vigente expirou em setembro de 2021, sem substituição até agora.
Segundo o último levantamento da Ancine, a Agência Nacional do Cinema, o Brasil tinha 3.401 salas de cinema até o fim do ano passado. Assim, sobra pouco espaço para produções menores e nacionais.
Embora tenha sido criada por meio de uma Medida Provisória (MP nº 2.228) de 2001, a Cota de Tela tem origem em iniciativas adotadas ainda nos anos 1930, quando o governo Getúlio Vargas publicou um primeiro decreto de proteção do cinema brasileiro – tomando como exemplo iniciativas semelhantes de outros países.
Como a MP foi editada antes da publicação da Emenda Constitucional (EC) nº 32, de 2001, a qual estabelece que o Congresso Nacional tem até 45 dias para apreciar as MPs sob risco delas paralisarem todas as demais deliberações, a cota de tela permaneceu em vigor até 2020, mesmo jamais tendo sido votada pelo Congresso Nacional.
Em 2021, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou constitucional a norma que reserva um número mínimo de dias para a exibição de filmes nacionais nos cinemas brasileiros, bem como a regra que determina que 5% dos programas culturais, artísticos e jornalísticos sejam produzidos no município para o qual foram outorgados os serviços de transmissão de rádio e TV.
Segundo Margareth Menezes, o restabelecimento da Cota de Tela faz parte das ações que o governo federal vem propondo e executando para “o fortalecimento econômico do setor cultural”. O que inclui também iniciativas para regulamentar os serviços de vídeo sob demanda (VoD, na sigla em inglês), que compreende o fornecimento de conteúdos audiovisuais por plataformas digitais (streaming).
“Compreendemos que a conquista dos streamings será uma revolução não só para o setor audiovisual e artístico, como fortalecerá e será crucial para a estabilização da independência financeira da produção cinematográfica brasileira”, acrescentou a ministra ao criticar o que classificou como “a descontinuidade das políticas públicas para a cultura” da gestão federal anterior, quando o Ministério da Cultura foi rebaixado a uma mera secretaria nacional, vinculada ao Ministério do Turismo.
“A descontinuidade das políticas públicas de Cultura causou um prejuízo imenso ao nosso setor. Muito se perdeu. As ações de censura, de perseguição e de criminalização dirigidas ao setor artístico, mas sobretudo ao setor audiovisual, foram uma temeridade”, comentou Margareth, assegurando que a atual gestão federal tem planos de retomar todas as políticas públicas para o setor audiovisual interrompidas nos últimos anos. “Queremos fortalecer o setor de todas as maneiras que nos couber.”