Em uma enorme vitória para 700 mil filhos de imigrantes que chegaram aos EUA ainda na infância, a Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu na quinta-feira (18) manter em funcionamento o programa DACA, mais conhecido como ‘Sonhadores’, e determinou que o governo Trump não respeitou os mecanismos legais ao suspender o programa em 2017.
A decisão foi por cinco a quatro, com o voto vencedor proferido pelo presidente da corte máxima, John Roberts, dito de tendência conservadora, e que foi acompanhado pelos quatro juízes de perfil progressista. “A decisão do Departamento de Segurança Interna [Homeland] de acabar com o Daca foi arbitrária e caprichosa”, escreveu o juiz Roberts.
A Suprema Corte não decidiu sobre o mérito da questão, a legalidade do DACA, mas rejeitou os procedimentos utilizados pelo governo Trump para encerrar o programa, que foi criado no mandato de Obama, em 2012, e criou um mecanismo legal para que esses imigrantes pudessem estudar e trabalhar sem medo de serem deportados.
Apesar da imposição de Trump de 2017 suspendendo o programa, a pedido das entidades de direitos civis nos EUA juízes federais forçaram o governo a continuar a renovar as autorizações de quem já era beneficiário. Pela lei Daca, os indocumentados têm de atualizar os dados de dois em dois anos.
Trump reagiu ao revés pelo Twitter, chamando a decisão da Suprema Corte de “horrível”.
“Estas decisões horríveis e com carga política que saem da Suprema Corte são como tiros de espingarda na cara de pessoas que se orgulham de ser republicanas ou conservadoras”, lamuriou-se Trump através de sua plataforma predileta.
Aproveitou para fazer campanha entre seus fanáticos: “Precisamos de mais juízes na Suprema Corte ou perderemos a nossa Segunda Emenda (que garante o direito de portar armas) e todo o resto. Votem a favor de Trump em 2020″.
O velho xenófobo seguia desassossegado. Em nova tuitada, perguntou aos seguidores: “vocês têm a impressão de que a Suprema Corte não gosta de mim?”
Já entre os jovens imigrantes, o dia foi de comemoração. A rede United We Dream [Juntos Nós Sonhamos] chamou a decisão de “uma prova de nosso poder como jovens imigrantes e aliados que têm lutado para proteger o Daca dos ataques implacáveis do governo Trump”.
“Embora essa vitória traga alívio temporário para os jovens imigrantes e nossas famílias que vivem no limbo desde que Trump encerrou o Daca em 2017, nossa luta não está concluída”, disse Greisa Martinez Rosas, beneficiária do Daca e vice-diretora executiva da entidade.
Após denunciar as raízes supremacistas brancas e racistas nas forças de deportação e polícia, Rosas acrescentou que o Daca se tornou possível “porque os jovens imigrantes sonharam e exigiram”. “A decisão de hoje é outro lembrete de que quando as pessoas diretamente impactadas são aquelas que pressionam por soluções, é aí que a mudança transformadora acontece”, assinalou.
Em seu voto, a juíza Sonia Sotomayor foi além da análise feita por Roberts, e abordou diretamente o longo registro do presidente Trump de declarações racistas e xenófobas.
A comparação de Trump dos imigrantes indocumentados com “animais”, por exemplo, cria “a forte percepção de que a decisão de rescisão foi contaminada por animus discriminatórios impermissíveis”, escreveu Sotomayor.
“Eu não descartaria tão prontamente a alegação de que uma decisão executiva prejudica desproporcionalmente o mesmo grupo racial que o Presidente classificou como menos desejável apenas meses antes.”
Nas redes sociais, mais aplausos à decisão: “Ganhamos na Suprema Corte — #DACA está aqui para ficar! Hoje comemoramos e amanhã continuaremos a lutar contra os ataques de Trump à comunidade de imigrantes que devem acabar”.
Ainda, “sempre soubemos que pessoas com #DACA são parte central de nossas comunidades. Eles são nossos vizinhos, nossos professores, nossos colegas de classe, nossos colegas de trabalho, e nossos amigos. Seu #LarEAqui, e eles estão #AquiParaFicar.”
“Celebramos essa decisão, mas nossa luta continua”, tuitou a deputada democrata Pramila Jayapal, que imigrou para os EUA da Índia aos 16 anos. Ela convocou o Senado a aprovar a legislação de proteção aos imigrantes, o Ato da Promessa e Sonho Americano.
Como a sentença não entrou no mérito do programa Daca, o governo Trump não está impedido de tentar encerrá-lo novamente se o desejar. Mas, com as eleições a cinco meses, é duvidoso que a Casa Branca mantenha o pé no acelerador.
Apesar de todo o empenho de Trump, o clima não anda favorável à xenofobia – nem ao racismo. Pesquisa realizada pelo Pew Research Center no início deste mês mostrou que 74% dos americanos acreditam que os Sonhadores devem ter status legal permanente, incluindo 54% dos republicanos e eleitores independentes de inclinação republicana.