Somente nos últimos 14 meses, a capital fluminense registrou três das quatro operações mais letais de toda a história
Moradores do Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, denunciam a atuação do governo Claudio Castro (PL), em mais uma chacina nas comunidades cariocas. A filha de Letícia Marinho de Sales, morta na quinta-feira (21) após ter o carro alvejado por policiais durante uma ação das polícias do Estado, questionou se é esta a política do governo para a população das favelas.
“É o que o governador tem pra gente? Entrar e matar?”, questionou Jéssica Sales, em frente ao IML onde foi reconhecer o corpo de sua mãe. Ela definiu a ação da polícia como “covarde e despreparada”.
“Neste momento é só dor, revolta e injustiça pelo que fizeram com a minha mãe. Ela foi covardemente alvejada sem transmitir nenhum tipo de perigo para os policiais”, disse a filha da vítima.
“Minha mãe era uma pessoa que só se prestava a ajudar. Eles acham que todo mundo que mora na comunidade é marginal. A gente não mora ali porque a gente gosta, a gente mora ali porque não dá pra pagar IPTU, IPVA, aluguel e as outras contas. É isso que o governador tem pra gente? Eu quero saber os responsáveis. Eu cobro do governador Cláudio Castro, o que ele vai fazer?”, questionou a filha.
“Um policial totalmente despreparado atirou na minha mãe. É isso que o governador tem pra gente? Entrar e matar? Toda vez ele só vai mandar matar? A polícia do Rio de Janeiro está aprendendo o quê? A matar um trabalhador?”, questiona Jéssica Salles.
Denilson Glória, namorado de Letícia, contou que levava a namorada para casa quando parou em um semáforo e o carro foi alvejado. “Não estava havendo confronto, chegando no sinal eu parei. Mesmo assim, eles viram os vidros abertos, alvejaram o carro”, denunciou ele. Após isso, a namorada foi atingida e morreu. “Eu vi ela caindo para o meu lado, quando olhei tinha um furo no peito”.
Também presente no carro, Eduardo da Silva ficou ferido por causa dos estilhaços e acusa a polícia. “Fomos alvejados por policiais despreparados, desqualificados, saindo de casa para ir trabalhar. Não tinha bandido. Não estava tendo tiroteio”.
Além de Letícia, outra moradora do Complexo do Alemão morreu baleada na manhã desta sexta-feira (22). Segundo testemunhas, Solange Mendes, de 49 anos, foi atingida por um policial na localidade da Caixa D’Água, na parte alta do complexo.
19 MORTES
Com a morte de Solange, já são 19 mortes no conjunto de favelas desde as primeiras horas de quinta-feira, quando forças de elite das polícias Civil e Militar iniciaram uma operação supostamente contra roubos.
A PM afirmou que a base da UPP de Nova Brasília foi atacada por criminosos e negou revide. “Não houve confronto envolvendo os policiais militares que estavam no local”, disse, em nota.
“Após cessar o ataque criminoso, uma mulher foi encontrada ferida e foi socorrida pelos policiais militares para o Hospital Estadual Getúlio Vargas.”
Vizinhos disseram que Solange morava no Beco do Borges, no Largo da Vivi, e tinha uma pensão. Moradores contestam a versão da PM.
“Quando ela chegou aqui na esquina, começaram os tiros. Eu olho novamente e está ela caída”, narrou uma vizinha.
“Eles [PMs] tamparam o rosto dela, enrolaram o rosto dela com uma roupa deles mesmos para nem saber quem é. Um dos policiais ainda gritou que era moradora, mas como grita que é moradora e não mostra quem é?”, emendou.
CHACINAS
A letalidade do governo de Cláudio Castro (PL) no Estado e em comunidades do Rio de Janeiro vem crescendo. Somente nos últimos 14 meses, a capital fluminense registrou três das quatro operações mais letais de toda a história. Nesse período, foram 72 mortos em apenas três ações na cidade do Rio.
A mais letal entre todas as ações envolvendo agentes públicos aconteceu no Jacarezinho, na Zona Norte, em maio de 2021, quando 28 pessoas morreram. Um ano depois, em maio de 2022, 25 pessoas foram mortas durante uma operação policial na Vila Cruzeiro, também na Zona Norte.
As três operações organizadas por forças de segurança pública estão em destaque em uma lista que contabiliza mortes.
Veja as operações mais letais da cidade do Rio de Janeiro:
- Jacarezinho (maio de 2021) – 28 mortos;
- Vila Cruzeiro (maio de 2022) – 25 mortos;
- Complexo do Alemão (julho de 2022) – 19 mortos;
- Complexo do Alemão (junho de 2007) – 19 mortos;
- Senador Camará (janeiro de 2003) – 15 mortos;
- Fallet/Fogueteiro (fevereiro de 2019) – 15 mortos;
- Complexo do Alemão (julho de 1994) – 14 mortos;
- Complexo do Alemão (maio de 1995) – 13 mortos;
- Morro do Vidigal (julho de 2006) – 13 mortos;
- Catumbi (abril de 2007) – 13 mortos;
- Complexo do Alemão (agosto de 2004) – 12 mortos;
Quando questionado sobre as operações de alta letalidade, Castro costuma repetir que os mortos são criminosos, apesar de constantemente haver denúncias sobre o assassinato de inocentes e de suspeitos que não apresentavam resistência – o que é ilegal.
DESUMANIDADE
Aliado de Castro, Jair Bolsonaro (PL) se negou, nesta sexta, a prestar solidariedade às vítimas da operação no Complexo do Alemão, Rio de Janeiro, na véspera. Bolsonaro só lamentou a morte do cabo Bruno de Paula Costa, a quem chamou de “irmão paraquedista”.
“Você que se solidarize com essas pessoas, tá ok?”, disse a jornalistas, quando questionado sobre as demais vítimas. Bolsonaro visitava um posto de gasolina para celebrar a queda no preço dos combustíveis.