Denúncia conclui que Adriano da Nóbrega, chefe da milícia, participou do esquema de lavagem de dinheiro do gabinete
O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro afirmou, na denúncia contra o senador Flávio Bolsonaro, que o parlamentar tem “predileção pelo uso de dinheiro em espécie” e integrou ao seu patrimônio valores ilícitos de forma “sorrateira”, vindos de desvio de recursos públicos da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).
O procurador Ricardo Martins, que assina a denúncia encaminhada à Justiça, afirma que o denunciado “fazia pouquíssimo uso de serviços bancários como cartões de crédito e débito”. Num período de 36 meses, entre 2007 e 2009, o filho do presidente Jair Bolsonaro gastou pouco mais de R$ 7 mil com faturas de cartão de crédito, em uma média mensal de apenas R$ 195.
SALAS PAGAS EM CHEQUES DE TERCEIROS E DINHEIRO VIVO
Flávio comprou ainda 12 salas comerciais em condomínio na Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio, e desembolsou R$ 262 mil no mesmo período. Segundo o MP, “os extratos bancários do ex-Deputado não registraram nenhum débito que fosse compatível com as datas e valores dos recebimentos informados pelas imobiliárias”.
O procurador conclui “que 65% das despesas para a aquisição das salas comerciais no ano de 2008 foram quitadas com cheques de terceiros e depósitos em espécie, ao passo que o percentual restante foi pago mediante boletos bancários que não foram debitados na conta do parlamentar”.
Os investigadores informam que o MP teve dificuldade em apurar tais transações. Por isso, pede agora à Justiça que, “diante das reiteradas omissões da imobiliária em atender integralmente às requisições do Ministério Público ao longo da investigação”, haja uma ordem judicial para que a empresa informe, em 10 dias, a identificação de cheques de terceiros usados para pagar as salas comerciais.
O MP se debruçou na denúncia sobre a quitação de outras operações imobiliárias de Flávio Bolsonaro, como em uma cobertura em Laranjeiras, zona sul do Rio de Janeiro, e um apartamento na Barra da Tijuca, onde o parlamentar mora atualmente, quando não está em Brasília.
Foi encontrado, segundo os investigadores, um padrão de pagamento, que inclui depósitos em dinheiro feitos de forma fracionada, em valores que não obrigam o banco a registrar o depositante.
Ao menos em duas oportunidades foram identificados depósitos em dinheiro de Fabrício Queiroz, operador financeiro do esquema, e de Miguel Grillo, atual chefe de gabinete do parlamentar no Senado – mesmo cargo que ocupava na Alerj.
LAVAGEM DA MILÍCIA
A denúncia do Ministério Público contra Flávio Bolsonaro afirma ainda que o miliciano Adriano da Nóbrega, morto em confronto com a polícia da Bahia este ano, também era parte do esquema da lavagem de dinheiro do gabinete.
Segundo a investigação, em 2007, o então deputado estadual Flávio Bolsonaro nomeou Danielle Mendonça da Costa, mulher do ex-policial militar Adriano, assessora parlamentar. Naquele mesmo ano, Flávio contratou – também como assessor parlamentar – Fabrício Queiroz, que está em prisão domiciliar e é apontado como o operador do esquema.
Em 2015, a mãe de Adriano, Raimunda Veras Magalhães, também virou assessora parlamentar de Flávio Bolsonaro. O Ministério Público afirma que Danielle e Raimunda recebiam salário, mas eram fantasmas – não apareciam no gabinete. Diz também que a mãe de Adriano era, na verdade, dona de pizzarias que ela mesma administrava.
As pizzarias eram modestas e, mesmo assim, segundo os investigadores, foram usadas para movimentar parte do dinheiro desviado da Alerj. Os valores, diz a investigação, saíram dos restaurantes e entraram diretamente nas contas de Queiroz, em depósitos ou transferências bancárias. Além disso, os investigadores descobriram que o ex-policial [Adriano da Nóbrega], por meio da mãe e da mulher, transferiu outros R$ 400 mil para Queiroz, acusado de ser o operador de Flávio.
Na quarta-feira (4), reportagem do Jornal ‘O Globo’ revelou o depoimento que a ex-assessora Luiza Souza Paes deu ao Ministério Público em setembro. Ela disse que nunca atuou como funcionária de Flávio Bolsonaro e contou que era obrigada a devolver mais de 90% do salário.
Luiza apresentou extratos bancários para comprovar que entre 2011 e 2017 entregou por meio de depósitos e transferências R$ 160 mil para Fabrício Queiroz. Ela informou que, no dia em que iria depor no MP/RJ, participou de uma reunião com Frederick Wassef, que a coagiu a não comparecer ao MP e a destruir provas.