O Ministério da Saúde pagou recentemente cerca de R$ 24,3 milhões a empresa Icaraí Turismo, uma empresa que fornece aeronaves para o transporte aéreo de índios e de profissionais de saúde e que tem como sócio um empresário suspeito de ceder pequenos aviões ao garimpo ilegal de ouro na terra indígena ianomâmi, a maior do Brasil.
Segundo o Jornal ‘O Globo”, a Justiça Federal já decretou a busca e apreensão de um avião em nome do empresário, por suspeita de uso em esquema de extração criminosa de ouro no território ianomâmi. A mesma aeronave chegou a ser fotografada por índios em suas terras, os mesmos enviaram as imagens à Polícia Federal (PF) e associaram o veículo ao garimpo ilegal, como consta em inquérito em curso na PF em Roraima.
Na mesma reserva, a empresa presta serviço de saúde indígena. Somente no governo de Jair Bolsonaro, já recebeu R$ 17 milhões pelo serviço prestado.
Além do suposto jogo duplo em território ianomâmi, a Icaraí Turismo Táxi Aéreo está proibida desde o último dia 17 de operar voos, por decisão da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).
O órgão suspendeu cautelarmente o certificado de operador aéreo da empresa, que “não demonstrou possuir controle sobre a qualificação de seus tripulantes, permitindo que estes tripulem aeronaves sem estarem aptos”. Mesmo assim, a empresa continuou transportando indígenas e profissionais de saúde dos distritos sanitários especiais indígenas (DSEIs), vinculados ao Ministério da Saúde.
Os primeiros contratos com a Icaraí Turismo Táxi Aéreo foram assinados, sem licitação, em 2018, último ano do governo de Michel Temer. Naquele ano, ela recebeu R$ 7,4 milhões para alugar aeronaves usadas em serviços de saúde indígena na terra ianomâmi, requisitadas pelo DSEI Ianomâmi, e em outras reservas, sob a responsabilidade de outros cinco DSEIs: Leste (que atende à reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima), Alto Rio Negro (responsável por comunidades na fronteira com a Colômbia e com a Venezuela, no Amazonas), Vale do Javari (fronteira entre Amazonas e Peru), Alto Purus e Alto Rio Juruá (estes dois últimos no Acre).
No governo Bolsonaro, os pagamentos se intensificaram, chegando a R$ 17 milhões. O mais recente foi feito no último dia 1º, no valor de R$ 600 mil. Somente a gestão do general Eduardo Pazuello, ministro interino da Saúde, pagou mais de R$ 1 milhão à empresa. Contratos seguem vigentes até 2021. Documentos citados pelo ‘O Globo’ e apontam suspeitas sobre aeronaves do sócio da Icaraí em garimpo ilegal na terra ianomâmi.
Contudo, o problema na região é histórico, com agravamento a partir da década de 80. Entre idas e vindas, a presença de garimpeiros na região explodiu em 2019, a partir do incentivo feito pelo próprio presidente Jair Bolsonaro. Associações de indígenas calculam que 20 mil garimpeiros estão dentro da terra indígena, onde vivem 26 mil índios, em Roraima (a grande maioria) e Amazonas (o território se estende pela Venezuela).
O aumento dos casos de Covid-19 nas aldeias é atribuído a essa presença dos garimpeiros, já responsáveis pela contaminação dos rios por mercúrio e por amplos desmatamentos de áreas para a exploração do ouro.