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A mortalidade por Covid-19 no Brasil equivaleu a quatro vezes a média mundial por milhão de habitantes: 2.932 mortes contra 720. Segundo o Boletim do Observatório Covid-19 Fiocruz, divulgado na quarta-feira (9), o país teve 6,7% dos registros da doença no planeta, mas concentrou 11% das mortes em dois anos de pandemia.
O Boletim do Observatório Covid-19 Fiocruz, apresenta um balanço de dois anos da pandemia de Covid-19, declarada Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (Espin) pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em 30 de janeiro de 2020 e de importância nacional pelo Ministério da Saúde em 3 de fevereiro daquele ano.
A análise apresenta uma perspectiva da evolução da pandemia, dividida em fases, desde a descoberta do vírus até os dias atuais, com base nos estudos realizados pelos pesquisadores da Fiocruz, e sintetiza a dimensão das perdas, totalizando 388 milhões de casos no mundo e 26 milhões no Brasil (6,7% do total), com 5,71 milhões de óbitos no planeta e mais de 630 mil no país (11% do total).
O estudo aponta para um cenário ainda preocupante, com rápida transmissão da variante ômicron e especulação sobre o fim da pandemia. Para os pesquisadores do Observatório Covid-19 Fiocruz, a cada fase da pandemia se apresentam novos desafios.
“Se o diagnóstico e tratamento correto, adequação dos hospitais e estabelecimentos de saúde foram cruciais para a redução do impacto da doença inicialmente, a vacinação hoje é considerada prioridade para o controle da pandemia”, avaliam. No entanto, os pesquisadores ressaltam que as medidas não-farmacológicas continuam sendo importantes, uma vez que o distanciamento físico e uso de máscaras são os principais meios de redução da exposição e infecção pelo vírus.
O monitoramento da nova variante, associado ao estudo genético de suas mutações, sugere rápido crescimento de casos, por conta da sua capacidade de propagação, até 70 vezes maior que a delta, em alguns estudos. Alguns pesquisadores defendem que se trata de uma variante menos agressiva, uma vez que a ocorrência de hospitalizações e óbitos não acompanha a curva de crescimento dos casos. Porém, não há consenso sobre o assunto, observam os pesquisadores.
Alguns países e agências de saúde já discutem ou vêm adotando a transição de pandemia para endemia. Para os pesquisadores, a mudança não representa a eliminação do vírus e da doença, nem mesmo a desobrigação de medidas de proteção individuais e coletivas. “A classificação da doença como endêmica representaria a incorporação de práticas sociais e assistenciais na rotina do cidadão e dos serviços de saúde e só poderia ser pensada após drástica redução da transmissão pelas novas variantes e por meio de campanha mundial de vacinação”, aponta o documento.
Apesar das controvérsias e incertezas ainda existentes, os pesquisadores atestam que a explosão de casos cria temporariamente imunidade ao vírus, mesmo que a duração seja curta ou temporária e este cenário pode ser encarado como uma janela de oportunidades. “Em um momento em que há muitas pessoas imunes à doença, se houver uma alta cobertura vacinal completa há a possibilidade de tanto reduzir o número de casos, internações e óbitos, como bloquear a circulação do vírus”, afirmam.
O documento sugere que para que isso seja possível é essencial colocar em prática quatro estratégias de saúde pública. Garantir oportunidade de aplicação de vacina, com a disponibilidade em unidades com horário de funcionamento expandido e em postos móveis, realizar busca ativa por pessoas que ainda não iniciaram seus esquemas vacinais, massificar a campanha de incentivo à vacinação de crianças e reforçar os benefícios gerados pela correta higienização, assim como o bom uso de máscaras.
O Boletim aponta que o avanço da vacinação no Brasil, depois de um ano, tem ocorrido, mas não de forma homogênea e evidencia as diferentes realidades do país.
Enquanto as regiões Sul e Sudeste apresentam elevado percentual da população imunizada, áreas das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste ainda têm bolsões com baixa imunização para Covid-19. “Estes bolsões se constituem em locais de menor Índice de Desenvolvimento Humano, populações mais jovens, menos escolarizadas, baixa renda e residentes de cidades de pequeno porte. Para estes locais, o fim da pandemia parece mais distante que para grandes centros como Rio de Janeiro e São Paulo, que já apresentam elevada cobertura vacinal com duas doses”, avaliam os cientistas.
CASOS, ÓBITOS E LEITOS
Com os óbitos que chegam a 5,71 milhões em todo o mundo, o Brasil representa 11%, com mais de 630 mil mortes desse número. Além de impactar na saúde da população e sobrecarregar os sistemas de saúde, resultou em uma combinação de efeitos sociais e econômicos que agravam as desigualdades estruturais da sociedade. De acordo com o Boletim, a pandemia não atingiu todos os grupos sociais e territórios uniformemente.
“A redução da gravidade da doença, da sua mortalidade e das demandas por internação são devidas à alta cobertura da vacinação alcançada para a população adulta e idosa, bem como uma menor virulência dessa variante em relação às cepas anteriores”, indica o documento.
O quadro atual, embora preocupante, constitui um cenário muito diferente do observado entre março e junho de 2021, no momento mais crítico da pandemia no Brasil. Os pesquisadores afirmam que as diferenças dizem respeito à parte da população brasileira estar vacinada contra a Covid-19, as características da doença produzida pela variante Ômicron e à disponibilidade de leitos de UTI, hoje significativamente menor.
O documento manifesta a preocupação com o crescimento consistente das taxas de ocupação de leitos de UTI observado nas últimas semanas, bem como os indícios da interiorização dos casos frente à desigual cobertura vacinal no país.
DESIGUALDADE DA VACINAÇÃO
A desigualdade da vacinação no Brasil expõe problemas de base, como acesso geográfico, logística de distribuição, armazenamento, gestão de estoques e velocidade na informação. Mesmo considerando a população elegível, mais jovem e predominante, sobretudo na Região Norte, a diferença na cobertura é elevada quando comparada com as regiões Sul e Sudeste.
“Em meio a pandemia, problemas que deveriam ter sido enfrentados antes, para trazer mais equidade e eficiência no processo de imunização, podem tornar populações com baixa taxa de cobertura mais vulneráveis e permitir o surgimento de novas variantes, como observado em áreas mais pobres do continente africano”, explicam no documento. Dados de outros países indicam que áreas com baixa vacinação favorecem a ocorrência de surtos localizados, com intensidade amplificada devido à movimentação das pessoas e queda no cuidado com medidas não farmacológicas.
Para os pesquisadores, a falta de ampla campanha de comunicação para sustentar os benefícios das vacinas e das medidas não farmacológicas se mostrou muito prejudicial. Mesmo com a trajetória de sucesso do PNI, manter a qualidade e o desempenho de um programa dessa natureza, em um país com as características do Brasil, não é tarefa fácil. Sendo assim, é preciso planejar e investir permanentemente de modo a promover o acesso, a equidade e a universalização dos cuidados de saúde necessários.
Veja o boletim na íntegra: