Ele ligou pessoalmente para o primeiro-ministro indiano Narendra Modi em favor da empresa Precisa, que vendeu a vacina superfaturada em 1000%. Contrato foi de R$ 1,6 bilhão
O Ministério Público Federal (MPF) já identificou indícios de crime na compra feita pelo Ministério da Saúde de 20 milhões de doses da vacina indiana Covaxin.
O servidor do Departamento de Logística em Saúde do Ministério da Saúde, Luiz Ricardo Fernandes Miranda, afirmou, em depoimento ao MPF, que recebeu pressões não usuais de seus superiores para apressar os trâmites do contrato de compra da vacina indiana.
Bolsonaro intercedeu pessoalmente em favor da empresa privada intermediária da Bharat Biotech no contrato. Ele ligou pessoalmente para o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi.
O MPF decidiu abrir uma investigação preliminar para avaliar os indícios de crime no contrato firmado entre o Ministério da Saúde e a empresa Precisa Medicamentos, que representa o laboratório indiano Bharat Biotech, no valor de R$ 1,6 bilhão. A decisão se deu logo após o depoimento de um servidor do Ministério da Saúde responsável pelo setor de importações que apontou sinais fortes de irregularidades no comportamento de diretores do órgão.
“A omissão de atitudes corretivas da execução do contrato, somada ao histórico de irregularidades que pesa sobre os sócios da empresa Precisa e ao preço elevado pago pelas doses contratadas, em comparação com as demais, torna a situação carecedora de apuração aprofundada, sob duplo aspecto cível e criminal uma vez que, a princípio, não se justifica a temeridade do risco assumido pelo Ministério da Saúde com essa contratação, a não ser para atender a interesses divorciados do interesse público”, lê-se no despacho da procuradora da República, Luciana Loureiro.
A empresa privada “Precisa Medicamentos” foi a intermediária do laboratório indiano, Bharat Biotech, na negociação com o governo brasileiro do contrato no valor de R$ 1,6 bilhão. Seu proprietário, Francisco Emerson Maximiano, será ouvido futuramente pela CPI da Pandemia, que também investiga o contrato. Segundo o senador Randolfe Rodrigues, vice-presidente da CPI, “não é só negacionismo, tem dinheiro na história”. “Houve acumpliciamento entre agentes públicos e privados. Quem se beneficiou? É isso que nos vamos investigar a partir de agora”, disse o senador.
Dono da Precisa vai depor à CPI a pedido do senador Alessandro Vieira (Cidadania- ES). Assista ao vídeo:
Diferente de outras vacinas, a Covaxin foi vendida ao Brasil antes de ser aprovada pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).
Jair Bolsonaro chegou a telefonar para o primeiro-ministro indiano para interceder em favor da “Precisa” que vendeu a vacina com um superfaturamento de 1000% em seu preço original.
O preço inicial era de US$ 1,34 a dose e acabou saindo, no contrato, por US$ 15 por cada unidade do imunizante, ou seja, cerca de R$ 80 por dose, causando um grande prejuízo aos cofres públicos.
A negociação suspeita também está sendo investigada pela CPI da Pandemia do Senado Federal. “Para a Pfizer não havia nem resposta. Qual era o negócio com a Covaxin? Amanhã (23 de junho) iremos receber na CPI o senhor Francisco Emerson Maximiano, da Precisa Medicamentos, empresa investigada por intermediar a compra da Covaxin pelo governo”, disse o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP). O depoimento foi adiado.
O depoimento na íntegra do servidor do MS alertando para a existência de pressões suspeitas exercidas sobre ele por seus superiores para “apressar” a avaliação do contrato de importação da Covaxin foi encaminhado para a CPI. O senador Randolfe Rodrigues viu no depoimento indícios muito fortes de que o servidor do Ministério da Saúde sofreu “pressões anormais” por meio de mensagens de texto, e-mails, telefonemas e pedidos de reuniões para superar entraves na compra da vacina indiana.
O relator da CPI, Senador Renan Calheiros (MDB-AL), destacou que “a Covaxin foi a única aquisição que teve um telefonema do presidente da República para o primeiro-ministro da Índia, indicando para ele a preferência do Brasil pela aquisição da Covaxin com todos esses problemas.” “Além do mais”, prosseguiu Renan Calheiros, “foi colocada na Câmara dos Deputados, naquele projeto de lei da aquisição de vacinas pela iniciativa privada, comprada por empresários, a possibilidade de compra da Covaxin”. Relatório do Tribunal de Contas da União revelou que o acordo para a compra da Covaxin foi o mais rápido de todos.
A seguir, trechos do depoimento de Luiz Ricardo Fernandes Miranda ao MPF
Procuradora: “Temos uma questão relativa à Precisa, que representa a vacina indiana. O senhor deve se recordar, já que prestou depoimento no inquérito durante a gestão de Ricardo Barros. Essa empresa teria os mesmo sócios da empresa Global. Aquela mesma empresa que teve aquela questão com o Ministério, que ficou de entregar uns lotes de medicamentos e acabou não entregando. O Ministério teve prejuízo. Teve uma antecipação de pagamento. Em relação a essa empresa, há algum tipo de pressão, tanto por parte dos escalões superiores do Ministério da Saúde, quanto por parte dos próprios representantes ou sócios, através de ligações? Existe algum tipo de pressão que indique algum tipo de favorecimento a essa empresa em especial?”
Servidor: “Recebi uma ligação aqui e rejeitei, desculpa. Então, nesse caso, sim. [Sobre a] Covaxin tem[os] recebido muita mensagem de vários setores do ministério, da secretaria executiva, da própria coordenação do trabalho e de outros setores, perguntando o que falta para fazer essa importação, inclusive sábado e domingo, e sexta, às onze horas da noite.”
Procuradora: “E isso não é usual, em relação às outras? Não tem havido a mesma cobrança?
Servidor: Não, entretanto, as outras, ela ainda não tá na fase de importação. A fase de importação, a da Pfizer inicia em abril, e a da Sputnik só depois que eles conseguirem autorização emergencial. No caso da Covaxin, que foi o que a gente fez, não houve esse tipo de ligação e mensagem, nada. Foi a única que a gente realizou e chegou ao Brasil que eu tenho como exemplo.”
O nome de quem seria um dos responsáveis pela pressão é o tenente-coronel Alex Lial Marinho, coordenador-geral de Logística de Insumos estratégicos para Saúde. A seguir, o trecho do diálogo em que ele é citado.
Procuradora: “E aí, só pra gente terminar aqui, você disse que a sua equipe está em reunião sobre esse processo neste momento. O que está sendo discutido sobre esse processo, o que o ministério está cobrando de vocês?”
Servidor: “Então, isso vem da alta gestão e do nosso coordenador direto. Tão cobrando a gente uma resolução de o que fazer, procurar acionar a empresa, pressionar pra ver se consegue esse documento o mais urgente possível, menos pontos do que a Anvisa colocou em exigência para tentar acionar o quanto antes.”
Procuradora: “E o coordenador direto da sua área, quem é?”
Servidor: “O nome completo me foge um pouco, mas acho que é Alex Marinho Lial.”
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