
O ministro justificou alta dos juros do BC e afirmou que “talvez não precise de recessão para colocar a inflação dentro da meta”
O assunto que tomou conta do noticiário econômico do país nesta quarta e quinta-feira (19/20) foi a decisão do Conselho de Política Monetária do Banco Central (Copom) de elevar taxa de juros básica (Selic) em um ponto percentual, para 14,25%, igualando-a ao nível atingido no auge da crise de 2016.
O BC justificou a decisão alegando em seu comunicado que os brasileiros estariam consumindo em excesso e que o desemprego estaria em baixa.
A decisão de subir os juros teria, então, como objetivo, segundo a diretoria do BC, “esfriar” a economia – leia-se, fechar empresas, reduzir salários e aumentar o desemprego. Ou seja, os diretores do BC seguem considerando – equivocadamente – que a atual inflação é de demanda e recomendam juros altos para provocar uma recessão e assim trazer a inflação para a meta. Como disse o presidente da CNI, Ricardo Alban, os juros altos, ao contrário do que afirma o BC, “não controlam inflação e só prejudicam a economia”.
Sobre a recessão, o titular da Fazenda, ministro Fernando Haddad, afirmou, em entrevista na EBC, na quinta-feira (20), que talvez não precise tanto. “Não acredito que precisa de uma recessão para baixar a inflação”, disse ele. Mas justificou a alta dos juros dizendo que ela já estaria ‘contratada’ desde o ano passado. “Penso que esse aumento estava contratado pela última reunião do Copom do ano passado. Ainda sob a presidência do antigo presidente do BC, nomeado pelo Bolsonaro”, argumentou Haddad.
Ele então advogou em defesa dos diretores que assumiram a direção do BC por indicação sua ao presidente Lula e que decidiram aumentar pela terceira vez os juros. “Você não pode na presidência do BC dar um cavalo de pau depois que assumiu, é uma coisa muito delicada. O novo presidente e diretores têm uma herança a administrar, assim como eu tinha uma herança a administrar depois de Paulo Guedes”, acrescentou o ministro.
Não se sabe exatamente com quem Campos Neto teria ‘contratado’ os três aumentos dos juros – certamente Campos Neto agia exclusivamente para os bancos -, mas o fato é que, se a promessa feita por ele lá atrás aos banqueiros é interpretada agora como um ‘contrato’, conforme disse Haddad em sua entrevista à EBC, como se explica que o novo presidente do BC, Gabriel Galípolo, não só tenha elevado os juros, como também prometeu um novo aumento da Selic para a próxima reunião do Copom. Teria feito, então um novo ‘contrato’?
O fato é que a falácia dos juros altos como instrumento de combate à atual inflação brasileira – que não é de demanda – segue na ordem do dia, como se vê nas teses da Fazenda. “Nós temos uma tarefa que é debelar o aumento dos preços que houve, isso tem que ser feito pelo executivo e pelo BC independente”, disse Haddad, após a alta do Copom. Ele alegou, também à Globonews, na mesma quinta-feira (20), que a economia estaria muito aquecida. “Recuperamos os salários e entramos em 2024 com a economia pressionada”, admitiu ele.
Ou seja, a partir dessa avaliação, de que a economia estava aquecida e ‘pressionada’, conclui-se que as decisões do BC são “técnicas” e buscam realmente combater ‘desequilíbrios’. “Os técnicos do BC são qualificados, vão fazer e buscar o melhor pelo país. Mas têm um trabalho a fazer, o Executivo também tem trabalho a fazer, marco fiscal a cumprir”, destacou Haddad.
“Vamos esse ano cumprir os nossos compromissos de meta. E o BC tem a meta de inflação também, assim como eu tenho a meta fiscal a cumprir. São metas sempre exigentes, mas que temos de buscar”, prosseguiu o ministro.
Como se pode notar, não é só a política absurda de juro alto que está sendo justificada. Também a política fiscal restritiva parece “imexível” na atual gestão. Haddad se vangloriou na mesma entrevista à Globo, que o governo aprovou um ajuste fiscal relevante no fim de 2024 e está cumprindo o arcabouço fiscal e buscando cumprir a meta de resultado primário.
Ele mesmo disse que o mercado projetava e esperava um déficit de 0,8% do PIB nas contas públicas em 2024 e que ele teria conseguido reduzir o déficit para 0,1% do PIB. “Até o FMI reconheceu esses esforço”, comemorou Haddad na entrevista. Ou seja, ele festeja o “arrocho fiscal” e os juros “técnicos” do BC.
Haddad acrescentou que, “assim como eu tenho a meta fiscal para cumprir, que é aprovada pelo Congresso Nacional, o Banco Central tem a meta a cumprir, que é a meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional. São metas sempre exigentes, mas que nós temos que buscar”, disse ele. A meta de inflação – que agora é contínua – é de 3%. Uma meta considerada por diversos economistas como fora da realidade econômica brasileira.
SÉRGIO CRUZ