
“Essa não seria uma sinalização desejável ao mercado”
O ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, afirmou na terça-feira (29) que o governo federal descarta totalmente intervir na diretoria da Vale. A declaração foi vista como uma afronta ao país. Mesmo diante do crime hediondo, que até agora assassinou 99 pessoas, e das imagens de horror contra a população de Brumadinho, o governo simplesmente diz que “não é o caso de intervir”. “Não cabe ao governo avaliar”, disse ele.
“Essa é uma decisão do conselho de administração, e é evidente que nas empresas privadas, em que o governo é apenas um acionista, o papel do acionista é confiar no seu conselho de administração. Não há condição de haver qualquer grau de intervenção [do governo], até porque essa não seria uma sinalização desejável ao mercado”, afirmou o ministro.
Ou seja, quem fez com que a Vale passasse por cima de todas as normas de segurança, que assassinasse as pessoas e destruísse impiedosamente o meio ambiente, como fez em Mariana em 2015 e, agora, em Brumadinho, foi esse ente fantasmagórico que Onyx chama de “mercado”, mas que, não passa de uma seita macabra de monopólios, muitos deles multinacionais, em busca do lucro a qualquer custo. Mesmo que o custo desse desatino monopolista seja a morte de pessoas e a devastação de tudo que está em volta, é esse mesmo “mercado” que, segundo o governo, “não pode ser contrariado”.
“Temos que aguardar o andamento das investigações”, afirmou. “Não cabe ao governo federal apoiar qualquer empresa ou diretoria que não seja através de sua administração”, completou. Para o ministro, o governo deve saber que não pode interferir em tudo. “Governo tem que ter humildade para saber que não pode tudo e prudência, especialmente em um setor econômico que é muito relevante para o nosso país. Tem que haver algo muito importante, que é equilíbrio”, disse ele. É verdade, para Onyx, o governo só pode intervir se for contra os aposentados, para acabar com sua Previdência, contra os trabalhadores, para tirar os seus direitos. Numa empresa que comete um crime dessa dimensão contra a população, ele não admite nenhuma interferência governamental.
O Planalto, com essa atitude, sinaliza claramente de que lado permanecerá. E também deixa claro por que ninguém foi punido até agora no caso de Mariana. Revela também por que a Vale não pagou nenhuma multa ao Ibama três anos depois, e por que a população não viu a cor das indenizações até hoje. O poder de suborno desses monopólios da mineração falou mais alto do que o gemido dos moradores de Mariana e Brumadinho.
Onde já se viu querer punir os altos dirigentes da Vale privatizada? A prisão de engenheiros que atestaram a segurança da barragem já é o suficiente, argumenta Onyx. Eles querem que a coisa fique por aí. Mas, pretender que a população acredite que esses engenheiros agiram sem a anuência da direção da Vale é fora de qualquer propósito. A tragédia provocada pelo ganância da Vale foi tão estarrecedora que Jair Bolsonaro sobrevoou de helicóptero mas não teve coragem de pousar.
Segundo o relato de Maria Teresa Corujo, integrante do COPAM (Conselho Estadual de Política Ambiental), sobre a reunião do colegiado, realizada em 11 de dezembro de 2018, não foram os engenheiros que cometeram a “insanidade” de pressionar para o rebaixamento do nível de risco da barragem do Feijão, de nível 6 (mais alto), para nível 4. Quem estava lá eram os diretores da Vale. Quem dirigiu a reunião foi o Secretário do Meio Ambiente de Minas (do governo Pimentel e que permaneceu no governo Zema). “Foi uma sensação de muita violência e de dor. Aquilo era uma insanidade. Nós tentamos de tudo para que aquela autorização não saísse”, disse ela.
“Nós sabíamos dos riscos em função da ampliação das atividades ali. Cheguei a enviar uma correspondência à secretaria estadual de Meio Ambiente de MG pedindo que o processo não fosse votado pelo conselho, mas nosso pedido não foi acatado”, afirmou. Maria Tereza disse que aquilo era “uma reunião de cartas marcadas”. “Aquilo virou uma fábrica de licenciamento”, denunciou.
Portanto, é evidente que não são apenas os engenheiros que atestaram a segurança da barragem que devem pagar por esse crime monstruoso.
Diferente de Onyx, Maria Teresa fez questão de cobrar os responsáveis. “A primeira coisa que a gente tem que pensar é nesse termo “nós”. Quem é esse “nós”? O problema não somos nós, a sociedade que sofre as consequências do que está acontecendo lá em Brumadinho. O problema está em todos os atores que têm poder de tratar desse assunto. Foram esses os que não aprenderam nada. E não é sequer uma questão de ter aprendido ou não”, prosseguiu Maria Tereza. A intenção da Vale era aumentar a produção através do reaproveitamento do rejeito que estava na barragem que rompeu. Para isso forçaram a flexibilização das normas de segurança.
A fala do chefe da Casa Civil de Jair Bolsonaro, e a grita do chamado mercado, foi uma resposta ao que havia sido dito antes pelo presidente em exercício, Hamilton Mourão, que, diante da gravidade do que ocorria, aventou a hipótese de intervenção governamental. Não foi só Onyx que saiu em defesa da diretoria da Vale. O Financial Times, porta-voz de Wall Street, rasgou elogios ao presidente, Fábio Schvartsman. “Ele é muito competente. Foi o responsável pelo aumento dos dividendos dos acionistas da empresa”, comemorou a revista.
Ou seja, ele atendeu ao que interessa: aumentar os lucros da Vale. Se para isso precisa cobrir de lama uma população inteira, fazer o que?
Ele fez o Brasil ficar estarrecido com a tragédia de Brumadinho. As imagens são desoladoras. A destruição, as mortes, que não param de crescer, o desespero dos moradores em busca dos seus, os familiares de funcionários soterrados na lama da Vale.
Mais estarrecido ficou ainda o país quando se soube que tudo isso poderia ter sido evitado, não fosse a ganância desses diretores da Vale que, recebem salários milionários com o único propósito de aumentar sem parar os lucros dos acionistas. Foi Fábio Schvartsman, que recebe R$ 1,6 milhão por mês, quem autorizou que pressionassem o parlamento contra a legislação mais rígida e foi ele também que mandou seus capangas forçarem os órgãos de fiscalização de Minas para rebaixarem o nível de risco da barragem do Córrego do Feijão, meses antes do criminoso desabamento. E Onyx acha que o governo não deve se meter.
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Infelizmente o dinheiro e a obsessão por poder está sempre em primeiro lugar. De que Vale ter tanto dinheiro e poder se a vida não vale nada. É triste mas é a mais pura realidade que vivemos hoje .