O embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Todd Chapman, está exercendo pressão junto ao governo federal e a deputados para que o Brasil zere as alíquotas de importação de etanol de milho fabricado nos EUA.
A denúncia vem do deputado Alceu Moreira (MDB do Rio Grande do Sul) que preside a Frente Parlamentar Agropecuária e foi precedida por informações divulgadas pelo colunista do jornal O Globo, Lauro Jardim.
Os deputados democratas norte-americanos, Eliot Engel, presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos EUA, e Albio Sires, presidente da Subcomissão para o Hemisfério Ocidental, Segurança Civil e Comércio, reagiram abrindo averiguações sobre a atividade do embaixador que é ilegal, uma vez que é vedado a embaixador norte-americano atuar em favor de um dos candidatos no exterior.
Segundo o deputado Alceu Moreira, Chapman teria dito que dar primazia ao etanol dos EUA seria “muito importante eleitoralmente para o presidente Donald Trump”.
A medida teria o condão de agradar os empresários do agronegócio no Estado de Iowa, um dos maiores produtores de etanol à base de milho. Segundo o jornal New York Times, esse resultado poderia ser mostrado aos empresários de Iowa como uma vitória de Trump no terreno comercial.
Com a economia norte-americana em um despenhadeiro (acaba de ser anunciado o segundo trimestre com resultados econômicos entre os mais devastadores da economia do país em toda a sua história), empresários do setor que foram estimulados a enveredar por este ramo estão em dificuldade.
O deputado adiantou que atender a este lobby está fora de cogitação: “A economia no Brasil não tem como absorver isso. Nós estamos numa pandemia, com consumo de combustível reduzido, gastando menos que antes”.
E, referindo-se ao fato de que para a economia do Nordeste a produção e comercialização do etanol extraído de cana-de-açúcar é muito importante, declarou: “Fazer isso significa quebrar uma cadeira produtiva importantíssima para o Nordeste. Se liberar, será a mesma coisa de dizer que nós gostamos mais do povo americano do que do nosso. A gente gosta dos americanos, mas muito mais do nosso povo. Não vamos desproteger os nossos irmãos do Nordeste só para ajudar os americanos”.
O deputado relata detalhes de sua conversa com o embaixador na qual ele foi além dos termos diplomáticos e chegou a expressar ameaças ao Brasil: “Ele diz que eles têm um processo eleitoral. Ele não fala direto porque nós temos dito para ele o seguinte: ‘Assim como nós não temos ingerência em políticas americanas, vocês não têm o direito de fazer isso no Brasil’. Mas ele deixa claro que o produtor de etanol americano foi induzido no governo Trump a vender etanol e agora não tem para quem vender e isso prejudica eleitoralmente o Trump. Então, ele sempre faz alusão que se nós não concordamos com a liberação do comércio de etanol, nós vamos ter uma série de consequências em relação a outros temas que o Brasil tem parceria com os Estados Unidos”.
O presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, declara ainda que Chapman também tratou do interesse dos Estados Unidos por exclusividade na rede 5G, cujo leilão está previsto para 2021. Segundo o deputado, também nesta questão o embaixador disse que “pode haver consequências para o Brasil caso o país permita que a Huawei forneça equipamentos para a rede 5G”.
Todd Chapman diz que “empresas americanas podem repensar investimentos no Brasil para proteger propriedade intelectual”.
“Ele (embaixador) diz que se nós permitirmos que a China ganhe o direito de 5G aqui no Brasil, nós acabaremos passando para China todas as informações estratégicas do Brasil e que isso seria um desastre. Esse discurso é muito usado na linguagem diplomática. Trabalha-se muito a margem do risco para dizer que nós, para não corrermos o risco, deveríamos fazer o que querem. Mas não faremos. Vamos correr o risco de sofrer as sanções, mas não faremos” afirmou Alceu Moreira.
O embaixador americano também almoçou com o presidente da Única (União da Indústria de Cana de Açúcar), o ex-deputado federal Evandro Gussi (PV-SP), para pedir para zerar as alíquotas de importação para o etanol norte-americano.
Atualmente, o governo americano tem isenção para até 750 milhões de litros por ano. A partir desse número, a tarifa é de 20%.
A embaixada dos Estados Unidos deu uma resposta dúbia quando questionada sobre as pressões de Chapman. Disse que as “alegações” de que o embaixador estaria fazendo lobby em favor da reeleição de Trump “são falsas”, mas procurou um álibi para as pressões em torno do etanol dos EUA: “Os Estados Unidos há muito tempo têm como foco a redução de barreiras tarifárias e vão continuar a fazê-lo”.
Nada disso convence os deputados que pedem abertura de investigação sobre o caso. Eliot L. Engel, exigiu que Chapman preste esclarecimentos sobre “qualquer discussão” que tenha mantido com as autoridades brasileiras sobre as tarifas de etanol.
Segundo a agência italiana de notícias ANSA, o documento expedido pelo comitê que Engel preside determina que Chapman “apresente cópias completas e sem supressões de todo e qualquer documento relacionado a qualquer discussão” realizada “com funcionários do governo brasileiro, nos ramos Executivo e Legislativo, sobre tarifas de etanol, para assegurar ao Congresso e ao povo americano que nosso embaixador no Brasil está realmente representando os interesses dos Estados Unidos e não os interesses políticos do presidente Trump”.
CHINA DENUNCIA “OPRESSÃO INESCRUPULOSA” DOS EUA
Com relação à compra de equipamento da Huawei, que já esclareceu que a intensa prática de espionagem é parte central na política externa norte-americana, ou seja, de que os Estados Unidos, que perderam a corrida tecnológica no terreno das telecomunicações, acusam os chineses exatamente da ingerência e bisbilhotagem que eles mesmos praticam.
Vale dizer que as relações comerciais do Brasil com a China já chegam ao triplo dos valores transacionados pelo Brasil com os EUA e que, apesar da crise econômica mundial por conta da Covid-19, o comércio Brasil-China seguiu crescendo este ano.
“Para cada dólar exportado para os EUA, o Brasil exporta três dólares para a China”, afirmou um comunicado do Ministério da Agricultura brasileiro em 24 de julho.
O vice-presidente Hamilton Mourão já declarou que o Brasil não está disposto a excluir a Huawei do leilão do 5G. Ele declarou que é “difícil” excluir a empresa chinesa, que já atua no país há mais de uma década e tem participação importante no 4G, cuja infraestrutura será em grande parte reaproveitada para implementação do 5G, mas admitiu que há pressão política externa para que essa exclusão aconteça.
A agência alemã Deutsche Welle destaca que a “China criticou nesta quinta-feira (30) as advertências estadunidenses de ‘consequências’ se o Brasil escolher a empresa chinesa de telecomunicações Huawei para desenvolver sua rede 5G, acusando Washington de ‘opressão inescrupulosa’ contra as empresas de tecnologia do país”.