Para especialistas, medida é inconstitucional
Em portaria publicada nesta segunda-feira (1°), o governo Bolsonaro determinou que empresas não poderão demitir quem se recusar a tomar a vacina contra a Covid-19.
A portaria, assinada pelo ministro do Trabalho, Onyx Lorenzoni, em mais sabotagem às medidas de combate à pandemia, vai na contramão das decisões da Justiça do Trabalho e das orientações do Ministério Público do Trabalho (MPT).
A portaria também está sendo denunciada por especialistas em Direito do Trabalho, que afirmam que a medida do Ministério do Trabalho e Previdência é inconstitucional. Na defesa da medida o governo afirma que a não apresentação de cartão de vacina contra qualquer doença não está inscrita como motivo de justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador. No entanto, para especialistas, a saúde da coletividade se sobrepõe ao direito individual de optar por tomar ou não a vacina contra a Covid-19.
“As fundamentações para a edição da referida portaria se contradizem ao verificamos que o inciso XXII, do artigo 7, da Constituição, garante aos empregados a segurança e saúde em suas atividades empregatícias. Além disso, já se tornou quase que unânime, perante os tribunais do trabalho, perante o Ministério Público do Trabalho e perante o próprio Tribunal Superior do Trabalho, que a saúde e segurança da coletividade se sobrepõem à do indivíduo”, afirma o advogado trabalhista Luis Fernando Riskalla.
Riskalla questiona, ainda, “como poderão os empregadores, além das ações que já lhes competem, garantir a saúde e integridade de seus empregados se não podem, ao menos, ter o controle de quem está, de fato, imunizado?”.
O professor da FGV Direito Rio e especialista em direito trabalhista, Ciro Ferrando, afirma que a portaria contraria decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) e que “por vários aspectos a portaria é inconstitucional. Eu entendo que o Supremo já decidiu sobre isso. E ela [portaria] extrapola os limites da competência, que é o que a gente chama de inconstitucionalidade formal e material”.
Para o advogado Donne Pisco, a portaria nitidamente infringe o art. 87, inciso II, da Constituição Federal também porque um ministro de Estado não tem competência para criar normas, apenas para instrumentalizar o cumprimento das leis de sua alçada. Segundo Pisco, Lorenzoni usurpa competência do Legislativo com a Portaria.
“O ato normativo do Ministério do Trabalho e Emprego não tem o efeito de vincular a livre apreciação do tema pelos juízes: a restrição imposta, que busca impedir a demissão por justa causa de pessoas que se recusem à vacinação, não tem fundamento legal — inclusive, porque a resistência imotivada à imunização atenta contra o esforço coletivo para a contenção da pandemia, pondo em risco a saúde da população”, defendeu.
Por sua vez, César Augusto de Mello, advogado especializado em Direito do Trabalho e Sindical, denunciou, em artigo, o que chamou de “negacionismo legalizado”, argumentando que “e não há impedimento por determinação médica e se há vacina gratuita e disponível, a negativa individual se tona insustentável, pois destoa dos princípios constitucionais de proteção coletiva à saúde”.
E concluiu: “como tantos outros, eu defendo ambiente de trabalho saudável e maior proteção nas relações de emprego, mas não haverá emprego e não haverá direitos se não houver VIDA”.