Para o ministro Luiz Fux, presidente do STF, decisão do desembargador “contribui para disseminar o vírus”
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, restabeleceu o ‘passaporte da vacina’ após ação da Prefeitura do Rio de Janeiro contestando a derrubada da exigência realizada por um desembargador do estado.
Com a decisão, volta a necessidade de apresentar comprovante de vacinação em locais públicos e privados da cidade, como clubes, pontos turísticos, museus, bibliotecas, teatros, academias e feiras de negócios.
“A decisão atacada representa potencial risco de violação à ordem público-administrativa, no âmbito do município do Rio de Janeiro, dados seu potencial efeito multiplicador e a real possibilidade de que venha a desestruturar o planejamento adotado pelas autoridades municipais como forma de fazer frente à pandemia em seu território, contribuindo para a disseminação do vírus e retardando a imunização coletiva pelo desestímulo à vacinação”, decidiu o ministro.
A ação da Prefeitura foi uma resposta a uma liminar concedida pelo desembargador Paulo Rangel para que o ‘passaporte da vacina’ fosse suspenso na cidade. Rangel chegou a comparar a exigência da vacinação para freqüentar locais públicos a uma “medida nazista”. “A carteira de vacinação é um ato que estigmatiza as pessoas criando uma marca depreciativa e impedindo-as de circularem pelas ruas livremente, com nítido objetivo de controle social. O propósito é criar uma regra não admitida juridicamente, mas que visa marcar o indivíduo constituindo uma meta-regra que está associada ao estigma do não vacinado”, dizia o desembargador.
Os procuradores do Ministério Público questionaram a decisão de Rangel pelo tipo de ação (habeas corpus) apresentado na Justiça estadual para discutir a questão.
“O habeas corpus não é medida apta a assegurar a defesa de supostos direitos daqueles que, ao arrepio das recomendações técnicas sanitárias, se insurgem em face de medidas restritivas que visam à contenção da disseminação do contágio por COVID-19”, diz o recurso da Prefeitura do Rio.
Segundo os procuradores, a decisão de Rangel “sepulta a política pública emergencial estabelecida para o enfrentamento da pandemia da COVID-19, violando, assim, a autoridade sanitária e epidemiológica, com elevados riscos à saúde pública e ao ordenamento administrativo”.
Fux se refere a decisões anteriores do STF, dizendo que o governo federal pode tomar ações para controlar a pandemia, mas que estados e municípios têm autonomia para impor restrições com o objetivo de conter a circulação do vírus.
Na decisão, Fux não analisou a legalidade do “passaporte da vacinação”. O ministro concluiu que, por conta de entendimentos fixados pelo Supremo, a Prefeitura tem o poder de estabelecer medidas para combater a disseminação do vírus.
“Não cabe ao julgador manifestar-se quanto ao mérito propriamente dito do que discutido no processo originário, eis que essa questão poderá ser oportunamente apreciada pelo Supremo Tribunal Federal na via recursal própria”, afirmou.
O ministro disse ainda que o ato normativo que estabelece o “passaporte da vacina” foi expedido no “exercício de competência legítima do Município”.
“Tratando-se de ato normativo expedido no exercício de competência legítima do Município, conforme já reconhecido pelo Plenário desta Corte, amparado em dados técnicos e científicos, e inexistindo patente desproporcionalidade ou irrazoabilidade em seu conteúdo, impõe-se o reconhecimento da plausibilidade da argumentação do requerente, de modo a ser privilegiada a iniciativa local nesse juízo liminar”, completou.
Decisão de Rangel representava “manifesto risco à saúde pública”
O recurso aprovado por Fux também contesta a suspensão do passaporte para toda população.
“Inexiste qualquer situação concreta apta a justificar concessão de ordem coletiva. Não restou esclarecida qual seria a lesão ou a ameaça à liberdade de locomoção e quem seriam os supostos lesionados. Quem é essa coletividade? Qual o risco concreto à liberdade de locomoção?”, diz o documento.
Os procuradores também ressaltaram que a decisão de Rangel representava “manifesto risco à saúde pública”.
“Em um quadro pandêmico com milhares de mortes registradas por todo o país, havendo vacinas aprovadas pela ANVISA gratuitamente disponibilizadas à população, seguindo o Plano Nacional de Imunização do Ministério da Saúde, representa um manifesto risco à saúde pública decisão judicial que priva o Poder Público de legitimamente adotar instrumentos constitucionais aptos a incentivar a vacinação e impedir a disseminação do vírus”.
“A decisão proferida, em flagrante violência aos princípios da solidariedade social e da supremacia do interesse público, expõe injustamente a população a risco de saúde pública, além de inviabilizar o programa municipal de enfrentamento à pandemia, demandando, assim, a sua imediata suspensão”, disse o documento.