Procurador Geral da República também reconheceu direito de estados e municípios de atuarem contra a pandemia
O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), disse que o presidente Jair Bolsonaro “dispõe de poderes para exonerar o seu ministro da Saúde, mas não para eventualmente exercer política pública de caráter genocida”. A afirmação foi feita durante sessão do Supremo, realizada por teleconferência nesta quarta-feira (15), que decidiu que os governos estaduais e municipais têm poder para determinar regras de isolamento, quarentena e restrição de transporte e trânsito em rodovias em razão da epidemia do coronavírus.
O plano de Jair Bolsonaro de impor aos estados e municípios a sua visão irresponsável sobre a pandemia do coronavírus sofreu uma dura derrota. A decisão dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) que participaram da votação foi unânime, determinando que a União não pode derrubar as decisões tomadas pelos outros entes da federação.
Dos dez ministros, nove votaram contra a MP e um, (Luiz Roberto Barroso) se declarou impedido. Foram nove votos a favor do parecer defendido pelo relator, ministro Marco Aurélio Mello, na ação do PDT contra a medida provisória editada pelo presidente Jair Bolsonaro no sentido de desautorizar governadores e prefeitos. A posição do Procurador Geral da República, Augusto Aras, também foi no sentido da autonomia dos municípios e estados.
Os ministros do Supremo Tribunal Federal votaram a favor de que, além do governo federal, os governos estaduais e municipais possam editar normas para determinar isolamento, quarentena e restrição de transporte e trânsito em rodovias em razão da epidemia do coronavírus. Cinco dos nove ministros que votaram entenderam ainda que governadores e prefeitos têm legitimidade para definir quais são as chamadas atividades essenciais, aquelas que não ficam paralisadas durante a epidemia do coronavírus.
A decisão liminar ao pedido do PDT foi tomada em março. O ministro Marco Aurélio Mello, relator do caso, concedeu liminar para reforçar que tanto União como estados e municípios têm competência para legislar sobre medidas de saúde.
Portanto, no entendimento dele, governadores e prefeitos podem estabelecer regras de isolamento, quarentena e restrição de transporte e trânsito em rodovias e portos. O relator argumentou que houve desentendimento no meio da crise. “Há de ter-se a visão voltada ao coletivo, e talvez o que falte nesta quadra, presidente, é entendimento”, afirmou o Marco Aurélio.
O PDT havia argumentado que a medida provisória modificavam a lei ferindo a Constituição. Também argumentou que é tarefa de União, estados e municípios, em conjunto, a competência para estabelecer políticas relacionadas à saúde; e que só por lei complementar – para a qual é necessária maioria absoluta de votos no Senado e na Câmara – é possível estabelecer regras de cooperação no tema entre União, estados e municípios.
O ministro Alexandre de Moraes afirmou que a competência comum não permite que todos os entes federais possam fazer tudo porque isso gera uma “bagunça ou anarquia”. De acordo com ele, a coordenação das medidas compete ao governo federal, mas, a partir de critérios técnicos. “Estados e municípios, dentro de seus espaços normativos, podem fixar regras de distanciamento social, suspensão de atividade escolar e cultura, circulação de pessoas”, argumentou. Ele ressaltou que governadores conhecem melhor as realidades regionais e os prefeitos, as locais. “Não é possível que a União queira ter monopólio da condução administrativa da pandemia. É irrazoável”, declarou.
Edson Fachin, por sua vez, defendeu que estados e municípios podem, inclusive, estabelecer quais são as atividades essenciais, aquelas atividades que não sofrem restrições de funcionamento durante a crise. Ele afirmou que a atuação do governo federal deve seguir parâmetros, inclusive, internacionais. “As regras constitucionais não servem apenas para proteger a liberdade individual, mas também o exercício da racionalidade coletiva, isto é, da capacidade de coordenar as ações de forma eficiente”, afirmou.
Para a ministra Rosa Weber, da saúde é uma competência comum administrativa e que “cabe ao Brasil valer-se da estrita federalização para evitar o caos”. Segundo a ministra, é possível que sejam editadas medidas diferentes e até mais rígidas de controle do coronavírus diante das realidades de cada local, respeitando o princípio da proporcionalidade.
Luís Roberto Barroso se declarou impedido de participar do julgamento “por motivo de foro íntimo”, mas aproveitou para cobrar unidade em torno das ações para combater a crise. “Eu acho que o enfrentamento dessa questão da Covid-19 [doença provocada pelo coronavírus] exige coordenação, liderança, racionalidade e exige cooperação entre os entes estatais. Não pode ser tudo centralizado e nem de uma forma que cada um corra para um lado”, afirmou.