Não faltavam motivos para o seu mau humor. Ele já tinha sido preterido na solenidade do Dia do Soldado e ainda viu sua ação contra o inquérito das fake news ser enterrada por Edson Fachin no STF. Três derrotas no mesmo dia foi demais para ele
Jair Bolsonaro reclamou bastante nesta quinta-feira (26) do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), pela rejeição ao seu pedido de impeachment do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). No mesmo dia, ele já havia sido escanteado nas comemorações do Dia do Soldado e, depois, ainda foi derrotado no próprio STF, com a decisão de Edson Fachin de arquivar seu questionamento ao inquérito das fake news.
“ESTOU PRATICAMENTE SOZINHO”
Natural que mais tarde ele aparecesse numa entrevista, como a da Radio Jornal, de Pernambuco, cuspindo marimbondo para todo lado. O mau humor, depois de ser derrotado politicamente três vezes num só dia, não podia ser menor. Voltou a ameaçar os ministros e a democracia, mas teve que admitir que está sozinho. “Vocês sabem que nessa briga eu estou praticamente sozinho”, disse ele aos ouvintes.
“A gente lamenta a posição do senhor Pacheco no dia de ontem, mas nós continuaremos aqui no limite, dentro das quatro linhas, para buscar garantir a liberdade para o nosso povo”, afirmou Bolsonaro. “O que são as acusações contra o senhor Alexandre de Moraes? Ele simplesmente ignora a Constituição Federal. Ele desconhece e ignora vários incisos do artigo 5º. Ele ignora o direito de ir e vir, a liberdade de expressão. Ele ignora tudo isso aí”, prosseguiu em suas reclamações.
Na sua decisão, rejeitando o pedido de impeachment, Rodrigo Pacheco deixou claro que as acusações feitas por Bolsonaro a Alexandre de Moraes eram completamente infundadas. O presidente do Senado reafirmou que o ministro do Supremo estava exercendo plenamente as suas atividades constitucionais ao tomar as decisões que tomou como relator do inquérito que investiga atividades criminosas de pessoas que conspiram contra a democracia, inclusive a decisão de incluir Bolsonaro como investigado depois de seus ataques e ameaças às eleições.
“ELES ESTÃO INVESTIGANDO QUALQUER UM“
Bolsonaro estava possesso com o avanço das investigações contra os golpistas de suas milícias física e digital. “Ele abriu o Inquérito das fake news e as fake news nem estão tipificadas no Código Penal e simplesmente começa a investigar qualquer um”, acrescentou o capitão cloroquina, citando a prisão de cúmplices como a do deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ), a do presidente do PTB e presidiário Roberto Jefferson e a do blogueiro Oswaldo Eustáquio.
Ele reclamou, também, da pressa de Pacheco em decidir pelo arquivamento. Seu plano era arrastar esse assunto até o 7 de Setembro para turbinar os atos antidemocráticos que ele está convocando. “Os Poderes são independentes. Eu entrei com a ação para com o intuito de que o processo fosse avante. Nem vou dizer cassar, ou não, o ministro Alexandre de Moraes. O presidente do Senado, o senhor Pacheco, ele entendeu e acolheu uma decisão da sua advocacia, advocacia lá do Senado. Agora, quando chegou uma ordem do ministro Barroso para abrir uma ordem da CPI da Covid, ele mandou abrir e ponto final. Ele agiu de maneira diferente de como agiu no passado”, alegou.
CÂNCER DO BRASIL
Assim que soube da decisão de Rodrigo Pacheco, Bolsonaro postou o trecho de um vídeo de uma live datada de abril nas redes sociais. Era mais uma ameaça contra o Brasil. Na publicação, o presidente afirma saber onde está o “câncer do Brasil” e relata que “sabe o que tem que fazer”. Ele destacou que “há como ganhar essa guerra”, caso a população esteja munida de informação. Embora não tenha citado nomes, a postagem foi vista como uma resposta indireta aos demais poderes.
As ameaças de golpe continuaram. “A gente só ganha a guerra, pessoal, se tiver informações. Se o povo tiver bem informado, tiver consciência do que está acontecendo, a gente ganha essa guerra. Alguns querem que a gente seja imediatista. Eu sei o que tem que fazer. Dentro das quatro linhas da Constituição”, afirmou. “Se o povo, cada vez mais, se inteirar, se informar, cutucar seu vizinho, mostrar para ele o futuro do nosso Brasil, a gente ganha essa guerra. Eu sei onde está o câncer do Brasil, nós temos como ganhar essa guerra. Se esse câncer for curado, o corpo volta à normalidade. Estamos entendidos? Se alguém acha que eu tenho que ser mais explícito, lamento”, bradou.
FUX: “NÃO É POSSIVEL JUIZES TRABALHAREM SOB PRESSÃO”
O presidente do STF, ministro Luiz Fux, condenou tanto o pedido de impeachment quanto as demais ameaças de Bolsonaro. “Não é possível que em uma democracia as decisões judiciais sejam criminalizadas. Aqueles que não aceitam as decisões judiciais devem se utilizar dos recursos próprios, das vias próprias jurisdicionais, e não do impeachment. A democracia brasileira não admite que juízes trabalhem sob o páreo de ter que corresponder à vontade de A ou de B sob pena de sofrer impeachment”, frisou, ao participar de um evento promovido pela XP Investimentos, nesta quinta-feira (26).
“Sabe o que restou dessa decisão?”, indagou Fux. “Restou exatamente a consagração de um dos requisitos que a sociedade exige do juiz, qual seja a sua independência. A sociedade espera do juiz nobreza de caráter, conhecimento enciclopédico e, acima de tudo, independência. E essa independência vem consagrada na Constituição Federal através das garantias da magistratura, que não podem ser conjuradas sob pena de atentado à democracia, sob pena de uma violação às garantias da magistratura garantidas na Constituição”, completou.