Sári Corte Real, que estava responsável pelo menino quando ele caiu do prédio, foi condenada a oito anos e seis meses de prisão por abandono de incapaz que resultou em morte, mas segue em liberdade
O Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região (TRT6) condenou o ex-prefeito de Tamandaré Sergio Hacker Corte Real e a esposa dele, Sarí Mariana Costa Gaspar Corte Real, a indenizar em R$ 2,01 milhões a família do menino Miguel, que morreu ao cair do 9º andar do prédio de luxo onde o casal morava, no Centro do Recife. A defesa do casal informou que vai recorrer da nova sentença.
Em outro processo, no âmbito criminal, Sarí, que estava responsável pelo menino quando ele caiu do prédio, foi condenada a oito anos e seis meses de prisão por abandono de incapaz que resultou em morte. Ela, no entanto, responde em liberdade até o processo tramitar em julgado, quando não houver mais possibilidade de recurso. Recentemente, ela foi aprovada no curso de medicina.
A decisão da Justiça do Trabalho foi tomada em 6 de setembro e determina que o valor seja repassado a Mirtes Renata Santana, mãe de Miguel, e Marta Maria, avó do garoto, por danos morais. Ambas trabalhavam na casa da família Corte Real, mas eram pagas com dinheiro da Prefeitura.
Na decisão, o juiz do trabalho João Carlos de Andrade e Silva argumentou que a mãe e a avó de Miguel devem ser indenizadas pela morte do menino e por terem trabalhado durante a pandemia de Covid-19.
“É um sentimento de satisfação pela sentença, e essas pessoas só sentem o peso dos seus atos quando mexem no bolso deles. Agora, estamos aguardando as próximas etapas. O meu foco é justiça pela morte do meu filho. […] Sei que isso não vai me dar meu filho de volta, mas me dá uma sensação de missão cumprida e de justiça”, comemorou Mirtes.
A mãe de Miguel também afirmou que, embora celebre a decisão trabalhista, ainda espera o julgamento de recursos sobre a condenação de Sarí Corte Real no âmbito criminal. O processo encontra-se na segunda instância do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE).
“Hoje o processo se encontra no segundo grau aguardando resposta dos desembargadores. E aproveito esse momento para pedir ao TJPE celeridade no caso do meu filho. Faz um ano e quatro meses que saiu a condenação e até agora estamos aguardando os desembargadores fazerem a parte deles”, declarou.
Nos autos do processo, o juiz do trabalho João Carlos de Andrade e Silva reconheceu que, ao permitir a presença de Miguel no local de trabalho da mãe, os patrões assumiram o risco de eventuais danos contra a criança.
“É nítido que a morte de Miguel decorreu diretamente dos atos ilícitos dos réus de permitirem a presença da criança no ambiente de trabalho e de não agirem da forma esperada na sua proteção”, disse a decisão.
Karla Cavalcanti, advogada que representa a família no processo trabalhista, disse que a condenação é uma medida socioeducativa e que jamais servirá de compensação pela perda sofrida pela família.
“É patente a violação sofrida por Mirtes e Marta não só quanto à morte de Miguel, mas também pelos inúmeros descumprimentos contratuais na relação trabalhista. Por mais que a Justiça aplique o direito, como fez nesse caso, condenando os ex-empregadores, não se pode esquecer que nenhuma decisão ou valor monetário substituirá a vida que Miguel teria no aconchego de sua família”, disse.
DANO MORAL COLETIVO
Em 28 de julho, o casal foi condenado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) a pagar R$ 386 mil por dano moral coletivo à família, pois as duas trabalhavam como empregadas domésticas na residência do casal, mas eram pagas pela prefeitura.
Os ministros do TST acataram o que disse o Ministério Público do Trabalho (MPT) sobre a existência de racismo estrutural, sexismo e classicismo na contratação de Mirtes e Marta.
No entanto, como se trata de uma ação civil pública, o dinheiro não vai para a mãe de Miguel, e poderá ser depositado no Fundo Estadual do Trabalho (FET), no Fundo de Amparo ao Trabalho (Fat) ou para órgãos e entidades que prestam serviços relevantes à sociedade.
MORTE DE MIGUEL
No dia 2 de junho de 2020, Miguel Otávio Santana da Silva, de 5 anos, caiu do 9º andar do Condomínio Pier Maurício de Nassau, um dos imóveis de luxo do conjunto conhecido como “Torres Gêmeas”, no Cais de Santa Rita, no Recife.
A mãe dele tinha descido ao térreo do prédio para passear com a cadela da patroa, Sari Corte Real, que ficou responsável por cuidar do menino. A manicure de Sari também estava no apartamento. Sari foi presa em flagrante à época da morte e autuada por homicídio culposo, mas pagou fiança de R$ 20 mil e foi liberada.
Em maio de 2022, quase dois anos após a tragédia, ela condenada a 8 anos e seis meses de prisão por abandono de incapaz com resultado morte, mas responde ao processo em liberdade. No mesmo ano, Mirtes entrou com recurso ao Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) pedindo para que a pena fosse aumentada.