
A decisão se dá logo após a reprimenda de Trump a Zelensky no Salâo Oval, atestado de que a guerra da Otan contra a Rússia por procuração exercida por Kiev está perdida
Todo o equipamento militar norte-americano que não se encontra atualmente na Ucrânia está suspenso por ordem de Trump, inclusive as armas que estão sendo transportadas por aviões e barcos, ou que esperam para serem enviadas da Polônia, apontaram a Bloomberg e a Fox News, citando fontes da Casa Branca sob anonimato.
A suspensão imediata da entrega de mais armas à Ucrânia foi ordenada por Trump até que os líderes do país demonstrem um compromisso de boa fé com a paz, disse na segunda-feira (3) à Bloomberg um funcionário do Pentágono. Ainda segundo essa fonte, Trump determinou ao secretário da Defesa, Pete Hegseth, que executasse a pausa.
Outro funcionário anônimo, este da Casa Branca, observou que os EUA estão pausando e revisando a ajuda para assegurar-se que está contribuindo com uma solução. “Isto não é o fim permanente da ajuda, é uma pausa”, ele explicou à Fox News.
A mesma ação foi registrada pelo Wall Street Journal, que lembrou que o financiamento havia sido suspenso nas últimas semanas em meio a uma proibição da assistência a países estrangeiros por 90 dias.
A decisão se dá após o colapso da reunião de sexta-feira na Casa Branca de Trump com o chefe do regime de Kiev, Volodymyr Zelensky, inicialmente programado para ser a assinatura de um acordo de entrega da riqueza mineral ucraniana aos EUA, após um bate-boca em que o presidente norte-americano lhe disse que “não tinha as cartas, estava quase sem soldados e com o país destruído e brincando com a III Guerra Mundial” e sendo desrespeitoso trajado de rambo ucraniano.
Após a reunião, Trump assegurou que Zelensky “não está pronto para a paz”, acrescentando que o político ucraniano “se sente muito [alto] porque tem os EUA ao seu lado”, mas que perderá o conflito com a Rússia se seguir lutando sem o apoio que recebia sob o governo de Joe Biden.
Conforme a Reuters, citando fontes da Casa Branca, a ajuda foi congelada nas primeiras horas desta terça-feira (4), e todas as entregas militares para Kiev foram suspensas. O governo da Rússia celebrou a decisão, classificando-a como “a melhor contribuição para a paz”, mas alertou que aguardaria detalhes sobre os próximos passos do governo americano.
Nesta terça-feira, Trump irá falar ao Congresso no tradicional discurso anual sobre a situação do país, seu primeiro discurso ao parlamento desde a posse.
A suspensão também segue à cúpula europeia pró-guerra na Ucrânia, realizada em Londres, no fim de semana, com o primeiro-ministro britânico Keir Starmer delirando em voz alta sobre “botas no solo e aviões no ar” na Ucrânia para “manter a paz”, com o presidente francês Emmanuel Macron ao lado, enquanto o prejudicado ego de Zelensky era paparicado com um beija-mão ao rei Charles III.
Declaração de Zelensky à AP, de que o fim da guerra “está muito longe”, provocou uma reação irada de Trump.
“Esta é a pior declaração que poderia ter sido feita por Zelensky, e a América não vai tolerar isso por muito mais tempo! Esse cara não quer que haja paz enquanto tiver o apoio da América. E a Europa, na reunião que teve com Zelensky, declarou categoricamente que não pode fazer o trabalho sem os EUA. Provavelmente, não foi uma grande declaração em termos de demonstração de força contra a Rússia. O que eles estão pensando?”, disparou Trump.
Após o anúncio da suspensão da entrega de armas, o chefe do regime de Kiev encenou um recuo, se dizendo favorável a uma “trégua” – na verdade, repetindo a proposta de Macron de um “Minsk III”, para rearmar a Ucrânia e parar a ofensiva de verão russa. Apresentada na mesma “cúpula dos chihuahuas” – a descrição é de um blogueiro – que debateu centenas de bilhões de euros para rearmar a Europa “contra a ameaça russa”.
Como a Rússia tem reiterado, a guerra na Ucrânia não começou em 2022, mas em 2014, quando a CIA deu um golpe em Kiev, derrubou o presidente legítimo e instaurou no poder nazistas e partidários da anexação do país pela Otan.
Um regime cuja violência contra a população de ascendência russa, majoritária no leste e no sul, chegou ao ponto de queimar vivos oposicionistas em Odessa, e que proibiu a língua russa e a principal igreja ortodoxa, levando ao levante no Donbass e ao referendo de reunificação da Crimeia com a Rússia.
A anexação da Ucrânia pela Otan foi ordenada em 2008 pelo então presidente W.Bush, apesar da advertência da Rússia de 2007 contra a “ordem unipolar” e a violação do compromisso, no processo de reunificação alemã, de que a Otan não avançaria um centímetro para leste.
E posta em marcha por Obama, até a Ucrânia implodir, inclusive com a sabotagem dos acordos de Minsk e aceleração do armamento do regime de Kiev.
No primeiro mandato de Trump, sua opção pela retirada dos EUA do Tratado de Proibição de Mísseis Intermediários (INF) de 1987, que tirara o continente europeu da iminência diária da guerra nuclear, tornou ainda mais explosiva a situação, já que a Rússia não teria como admitir que mísseis norte-americanos fossem instalados na Ucrânia, a poucos minutos de Moscou e dos seus centros estratégicos, ao mesmo tempo que se recrudesciam planos de expulsão dos russos étnicos das suas terras milenares na Ucrânia, a exemplo do que os sionistas sonham fazer em Gaza. Trump também anunciara que não pretendia (se reeleito) estender por mais cinco anos, como previsto, o único tratado de contenção de armas nucleares ainda existente, o Novo Start.
Em dezembro de 2021, a Rússia apresentou aos EUA e à Otan propostas de restauração da segurança coletiva e indivisível na Europa, cuja essência era a volta à situação de armamentos de 1997, quando Rússia e Otan assinaram o assim-chamado Ato Fundador e, dentro desta, a manutenção da neutralidade da Otan.
Washington e Bruxelas se recusaram, enquanto Kiev redobrava as provocações, a ponto de em fevereiro de 2022 a Rússia iniciar sua operação militar especial, com o objetivo de fazer Kiev voltar à mesa de negociações, o que chegou a ser conseguido e inclusive rubricado um acordo em Istambul, do qual Zelensky se retirou após receber ordem de Biden, encaminhada pessoalmente pelo então primeiro-ministro britânico Boris Johnson.
Contra a Rússia, os EUA, sob Biden, desencadearam a mais maligna campanha de sanções já feita contra qualquer país, acreditando que ia derreter sua economia e provocar a ascensão de algum novo Yeltsin, enquanto apostou tudo o que podia na guerra por procuração para anexar a Ucrânia e na expectativa de que a Rússia se fragmentasse em uma dezena de estados que seriam vítima fácil da pilhagem, dentro da “visão” estratégica de primeiro estraçalhar a Rússia para depois encarar a China.
A Rússia tem reiterado que quer uma paz duradoura, com base na neutralidade da Ucrânia, aliás, estabelecida ao se separar da União Soviética, desnazificação, desmilitarização, fim da perseguição aos russos étnicos e reconhecimento das novas realidades territoriais, que representam a volta à Mãe Rússia de territórios do sul e do leste que haviam sido alocados à nova Ucrânia, como parte do fortalecimento da União Soviética e do socialismo.
Nos EUA, a eleição de Trump trouxe uma reorientação em relação ao projeto de Biden, para a coexistência em algum nível com a Rússia, uma espécie de Kissinger reverso, sendo considerada imprescindível para ter fôlego para encarar a China.
O que se refletiu nas negociações em Riad entre EUA e Rússia, que debateu um caminho para a restauração à normalidade das relações diplomáticas, quase rompidas, de uma saída para a guerra na Ucrânia e retomada da discussão das armas estratégicas, na expectativa de uma cúpula Putin-Trump.