“Há algum embasamento científico para a decisão inicial de considerar apenas a ‘vacina de Oxford’ no calendário do Ministério da Saúde?”, questiona o MPF
O MPF (Ministério Público Federal), representando três estados, pediu explicações ao Ministério da Saúde sobre as decisões anunciadas recentemente em relação ao plano de vacinação contra a Covid-19.
O presidente Jair Bolsonaro mandou cancelar um acordo anunciado pelo ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, para a compra de 46 milhões de doses da vacina Coronavac, que está sendo testada no Brasil em parceria com Instituto Butantan.
O MPF quer saber os motivos do cancelamento. A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) também foi questionada sobre a oposição criada em relação à Coronavac.
À agência, o MPF pergunta se há “algum embasamento científico para a decisão inicial de considerar apenas a ‘vacina de Oxford’ no calendário do Ministério da Saúde? Uma delas está em estágio mais avançado de testes que a outra? E quanto aos demais imunizantes em fase de testes?”, questiona o MPF.
A Procuradoria também pede informações sobre as etapas do processo de aprovação de vacinas, com dados sobre a fase em que se encontra cada uma delas.
A Anvisa foi questionada sobre os embasamentos científicos que levaram a agência a incluir apenas uma vacina no cronograma da Saúde, em referência ao PNI (Programa Nacional de Imunizações). Além disso, o órgão também foi questionado sobre como andam os testes das vacinas e se há uma estimativa de prazo para a aprovação de registro das mesmas.
O “planejamento inicial do Ministério da Saúde, previsto para abril de 2021, teria considerado apenas aquela [vacina] conhecida como ‘vacina de Oxford’, não tendo contemplado vacinas na mesma fase de testagem, como a ‘Coronavac'”.
Além disso, o MPF também questiona o ministério se a compra de doses da Coronavac foi, de fato, cancelada após manifestação de Bolsonaro via redes sociais. Caso o cancelamento seja real, a procuradoria requer a justificativa técnica para tanto.
O governo de São Paulo e o Instituto Butantan também foram questionados. O MPF pede esclarecimentos ao governo paulista sobre o acordo que havia sido firmado com o Ministério da Saúde e pergunta ao Butantan se a demora na liberação de importação de insumos para a vacina foi “justificada de alguma forma”.
Na última semana, o diretor-geral do Instituto Butantan, Dimas Covas, afirmou que a Anvisa estava retardando a autorização para a importação da matéria-prima da farmacêutica Sinovac que possibilitará a fabricação da vacina no Brasil.
Dimas Covas afirmou que aguardava há mais de um mês a liberação da Anvisa para importar insumos, e que isso poderia “impactar” o começo da vacinação em profissionais da saúde até o fim do ano, caso a eficácia seja comprovada na última fase de testes. A agência negou o atraso e disse que o processo já havia sido analisado, mas que “foram identificadas discrepâncias” – não citou, porém, quais.
Um dia após as declarações do diretor-geral do Butantan, a Anvisa liberou a importação de 6 milhões de doses da Coronavac, que estavam aguardando pela liberação do órgão.
O Butantan disse que o cronograma de São Paulo para a produção da vacina CoronaVac no país está mantido mesmo com o atraso da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Jair Bolsonaro afirmou, numa entrevista à Jovem Pan, na noite de quarta-feira (21/10), que, mesmo que a Coronavac, vacina desenvolvida pelo Instituto Butantan em parceria com a empresa chinesa Sinovac, seja aprovada pela Anvisa, ele não vai comprá-la.
“Com a China, lamentavelmente, já existe um descrédito muito grande por parte da população, até porque, como muitos dizem, esse vírus teria nascido por lá”, afirmou o presidente. A declaração não tem nenhuma base na realidade e está eivada de preconceito e de ignorância.
Pesquisas mostram que as vacinas que estão em teste no Brasil – no total são quatro – são a grande esperança da maioria da população para se livrar do vírus que segue matando cerca de 400 pessoas por dia. Mas, Bolsonaro, indiferente a todo esse sofrimento, ao se negar a comprar a vacina, está sabotando a luta contra a Covid-19.
Um estudo publicado pela Revista Nature, renomada revista científica britânica, revelou que 85,3% dos brasileiros estão dispostos a se vacinar contra a Covid-19 se “um imunizante comprovadamente seguro e eficaz estiver disponível”.
De acordo com a pesquisa, o percentual brasileiro de aceitação é o segundo mais alto do mundo. Fica atrás apenas da China, primeiro país a controlar a pandemia, onde a aceitação chega em 88,6% da população. O levantamento divulgado pela Nature envolveu especialistas dos Estados Unidos e da Europa que analisaram as respostas de 13,4 mil pessoas, nos 19 países mais atingidos pela Covid-19.
Segundo o Datafolha, nove em cada dez brasileiros adultos (88%) declararam que pretendem se vacinar quando a vacina contra a Covid-19 estiver disponível. Somente 9% não pretendem se vacinar e 3% não sabem. Esta pesquisa do Datafolha mostra que a grande maioria da população quer e vai se vacinar contra a Covid-19 e esse resultado é o que motiva o MPF a questionar os motivos que levaram o presidente interferir e se recusar a usar a vacina que estiver pronta para ser usada, só porque ela poderia ser da China.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) reagiu às declarações de Bolsonaro descartando a Coronavac por sua origem. “Nós escolhemos a ciência. (O debate) não é a respeito da nacionalidade, e essa é a beleza de ser multilateral, esse é o ponto da ONU. Nós escolhemos a ciência e deveremos escolher a melhor vacina. E, como se sabe, não vamos apoiar nenhuma vacina até que seja provado que ela teve o mais alto padrão de segurança e o nível certo de eficácia”, disse Margaret Harris, porta-voz da OMS.
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