Enquanto o genro e a filha de Donald Trump inauguravam, em Jerusalém, ao arrepio da lei internacional, a nova embaixada dos EUA em Israel, o mundo presenciou, entre espanto e indignação, ao massacre de 58 civis palestinos desarmados, a tiros – com munição real – e bombas de gás lacrimogêneo e de ação neurológica, por tropas de ocupação israelenses na fronteira com Gaza. 2771 ficaram feridos.
As dimensões do massacre dessa segunda-feira (14), cujas imagens foram vistas ao vivo no planeta inteiro, foram reveladas pelo Ministério da Saúde da Palestina. 1.370 foram atingidos por munição real. Os franco-atiradores começaram desde o início da manhã a executar as ordens criminosas do Estado-Maior israelense de atirar para matar; mais tarde, até helicópteros foram chamados.
O Escritório de Coordenação de Assuntos Humanitários da ONU (OCHA) informou que as capacidades hospitalares e de pronto-socorro na Faixa de Gaza estão sobrecarregadas e apela para que se desloquem para a região, cirurgiões, anestesistas e ortopedistas, além do envio humanitário urgente de material hospitalar.
“As equipes médicas estão extenuadas e sobrecarregadas, tratando de centenas de casos de feridos, incluindo mulheres e crianças. Estão no limite das forças e há uma falta de medicamentos essenciais”, relatou Jamie MacGoldrick, coordenador do OCHA.
O secretário-geral da ONU, Antonio Gutteres, alertou, dizendo-se “alarmado”, que “há uma grave escalada de violência” e que “um grande número de palestinos foi morto e ferido nos protestos em Gaza”. O Alto Comissário da ONU para Direitos Humanos, Zeid Ra’ad Al Hussein, exigiu que “a morte chocante de dezenas de pessoas por tiros de munição real em Gaza deve parar imediatamente, e os autores dessas violações flagrantes dos direitos humanos devem ser responsabilizados”.
Também a Anistia Internacional classificou a ação da tropa israelense como “violação horrenda da lei internacional” e “crime de guerrra”. “É mais um exemplo horrível dos militares israelenses usando força excessiva e munição viva em uma forma inteiramente deplorável”, acrescentou a declaração.
Nos vídeos que nos chegam, as sirenes de ambulâncias soaram como um triste uivo de lamento em torno dos que tombavam ou eram feridos, com muitos entregando suas jovens vidas pela libertação do seu próprio povo.
Um dos mortos é um profissional de saúde cuja ambulância chegou em socorro a feridos, pois os franco-atiradores estão mirando também nas ambulâncias, socorristas e até jornalistas, para que a chacina não seja documentada. 6 jornalistas de agências palestinas e internacionais foram feridos no dia 14. Desde 30 de março, quando tiveram início os protestos, já haviam sido mortos por balas israelenses dois jornalistas.
O “dia histórico” para Trump e Netanyahu foi regado a champagne e sangue palestino. Desde o anúncio, pelo bilionário presidente, da transferência da embaixada do país para Jerusalém, premiando a ocupação da histórica e sagrada cidade palestina, eclodiram manifestações de revolta por toda a Palestina, e de repúdio nas principais cidades do mundo inteiro. A marcação da inauguração para o dia 14 foi uma evidente provocação aos milhões de palestinos que buscam seu direito internacionalmente reconhecido, mas sempre adiado, de seu próprio Estado, com capital em Jerusalém Oriental.
A “Marcha pelo Retorno” foi convocada pelos líderes palestinos na Faixa de Gaza, começando no dia 30 de março e com encerramento marcado para 15 de maio, Dia da Nakba – Catástrofe, em árabe, como é conhecida a implantação do Estado de Israel, nesta data, no ano de 1948, que redundou em massacres e limpeza étnica com a expulsão de 750.000 palestinos, que se tornariam refugiados em campos na Palestina não ocupada à época, em países árabes vizinhos e na diáspora em geral, com mais de 5 milhões de palestinos expatriados hoje.
Depois, o sofrimento dos palestinos seria agravado pela ocupação resultante da Guerra dos Seis Dias, pelo roubo das suas terras nos assentamentos ilegais e pela transformação de Gaza num imenso campo de concentração murado e pelos pontos de controle na margem ocidental do Jordão. Mais 6 mil presos políticos palestinos nas masmorras israelenses e a tirania diária e racismo de cada pequeno sicário da ocupação.
Com as mortes desta segunda-feira (14), já passam de 100 as mortes de civis palestinos em Gaza e mais de 12 mil feridos. A única ocorrência relatada do lado israelense foi um soldado ‘levemente ferido’. Não há como falar de “confrontos”, quando de um lado há civis desarmados, ou no máximo com uma pedra, e, do outro, a 200 metros, franco-atiradores de elite com fuzis e munição real.
Embaixadas de diversos países, sediadas em Tel Aviv, se recusaram a participar da inauguração da representação diplomática de Trump. Somadas as manifestações na Faixa de Gaza e na Cisjordânia são cerca de 100 mil manifestantes, nas marchas do dia 14. Manifestantes em Ramallah foram contidos a intensos disparos de granadas de gás lacrimogêneo quando se aproximavam do maior posto de controle israelense na Palestina ocupada, o de Qalandya. A Organização pela Libertação da Palestina (OLP) convocou uma greve geral, contra o massacre, e o governo palestino decretou três dias de luto pelos mártires.
NATHANIEL BRAIA