O ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles mentiu em depoimento ao negar participação em encontro com madeireiros, afirma o Ministério Público Federal (MPF). Salles é investigado no inquérito da operação Akuanduba, que tramita há cerca de dois anos.
Ele prestou dois depoimentos às vésperas do fim do mandato do ex-presidente Jair Bolsonaro: um ao MPF e outro à Polícia Federal. À PF, ele disse que não participou do encontro, mas o Ministério Público acredita que ele mentiu sobre o episódio e esteve, sim, com os madeireiros. A informação foi publicada pelo Metrópoles.
Salles, que hoje é deputado federal pelo PL de São Paulo, disse à PF que “acabou não participando do encontro” e “sequer ficou sabendo do que foi tratado”, em versão sustentada no relatório da investigação apresentado pelos policiais aos procuradores.
Já o MPF afirma que o ex-ministro mentiu sobre o episódio e esteve, sim, no evento e por isso os procuradores buscaram outro depoimento, o de Olivaldi Alves Borges Azevedo, tenente-coronel da Polícia Militar Ambiental de São Paulo.
Ele foi recrutado por Salles para o ministério para compor a diretoria de proteção ambiental do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e é réu ao lado do ex-ministro. Segundo o MPF, “o depoimento de Olivaldi revela que Ricardo Salles não disse a verdade”.
Ao ser ouvido, o tenente-coronel disse que chegou ao ministério no dia 6 de fevereiro (de 2020) e que a reunião com madeireiros já havia acontecido. Ele relatou que encontrou Salles “de saída” e que o então ministro teria “conhecimento do assunto da reunião”. Afirmou também que Salles ainda teria conversado com um interlocutor sobre manobras para solucionar as demandas dos madeireiros.
A participação de Salles no evento é peça-chave para a polícia investigar se ele teve participação em organização criminosa envolvida com a exportação ilegal de ipês e jatobás. Procuradores querem descobrir se ele liberou cargas retidas nos Estados Unidos. Seu depoimento foi prestado ao delegado Alexandre Almeida Ferreira, o quarto a assumir o caso, na sede da PF de Altamira, no interior do Pará.
Nas mais de quatro mil páginas do inquérito, o contexto do encontro entre o “homem da boiada” e os contrabandistas de madeira, peça-chave do caso, foi investigado superficialmente e esclarecido em uma versão pouco convincente somente no dia 6 de dezembro de 2022, dez dias antes de encerrada a apuração.
Pessoas que poderiam confirmar a participação de Salles no ato, como secretárias e outros presentes, não foram ouvidas. Tampouco foram acionadas estratégias usadas para obtenção de prova, como cruzamento de dados do celular do ex-ministro, que a PF alegou que não ter conseguido desbloquear.
O relatório parcial do inquérito entregue ao MPF, dez dias depois do depoimento, diz que “foi indicado” “por diversos depoimentos” (sem citação de nenhum outro) que Salles “não” esteve presente “na referida reunião”.
Durante as sucessivas trocas de delegados que investigaram o contrabando de madeira, a que mais chamou atenção foi a de Alexandre Saraiva, ex-superintendente da PF no Amazonas. Ele foi afastado por Jair Bolsonaro depois de ter enviado ao STF (Supremo Tribunal Federal) um pedido de investigação contra o ex-ministro.
Na semana passada, a Justiça Federal no Pará acolheu denúncia e tornou Ricardo Salles réu, sob a acusação de liderar um esquema de contrabando para os Estados Unidos e Europa de madeira extraída ilegalmente na Amazônia.