O ex-chefe da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem, mantinha uma lista de procuradores que investigavam Jair Bolsonaro e seus famíliares ou fizeram representações contra o antigo governo, revelou a Polícia Federal.
Um documento listando os membros do Ministério Público Federal (MPF) ou do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MPTCU), considerados “contrários” ao antigo governo, foi encontrado em posse de Ramagem.
O arquivo digital tinha como título “Levantamento – Ataques do MPF” e era, segundo a Polícia Federal, “reiteradamente atualizado”.
O documento encontrado com Ramagem divide os procuradores entre os aliados de Bolsonaro que eram afetados por sua atuação. O primeiro “tópico” é referente à ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro.
Há, ainda, uma lista de procuradores que agiram para que crimes cometidos pelos filhos de Jair Bolsonaro fossem apurados. O arquivo aponta também procuradores que investigavam aliados de Jair, como sua ex-esposa, Cristina Bolsonaro, e o empresário Luciano Hang.
Os procuradores atuavam de forma legal, dentro da lei.
Já Alexandre Ramagem e Jair Bolsonaro criaram dentro da Abin um órgão de espionagem ilegal.
Segundo o jornal O Globo, o documento traz o nome da procuradora do MPF, Haliuc Bragança, que tem destacada atuação no combate ao garimpo ilegal e em favor da preservação ambiental.
Outra procuradora citada é Célia Regina Souza Delgado, que assinou uma notícia de fato determinando 72h para o governo Bolsonaro enviar um documento relativo às mortes pela pandemia de Covid-19.
O documento de Ramagem anota que Célia “assinou medida extrajudicial recomendando a suspensão de todas as atividades ‘não-essenciais’ por 14 dias’ no período da Covid”.
Enrico Rodrigues de Freitas, outro procurador do MPF, foi listado pela “Abin paralela” por recomendar às Forças Armadas que não comemorassem o golpe de 1964 e punissem os militares que o fizessem.
José Gladston Viana Correia é outro que foi citado. Ele tentou responsabilizar o ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, pela crise de falta de oxigênio medicinal no Amazonas.
Em janeiro de 2021, por conta do negacionismo do governo Bolsonaro, que tinha Pazuello na Saúde, pelo menos 60 pessoas morreram asfixiadas pela falta de oxigênio nos hospitais de Manaus.
Lucas Rocha Furtado, do MP-TCU, é citado no documento e tem suas ações contrárias ao governo detalhadas.
A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) publicou uma nota repudiando e manifestando “preocupação com a constatação de que, por terem exercido suas funções, membros do MPF foram objeto da atuação” de Alexandre Ramagem.
“Em um Estado Democrático de Direito, não é papel das instituições de Estado, menos ainda do serviço de inteligência, monitorar a correta atuação funcional de membros do Ministério Público e elaborar lista de pessoas em razão do desempenho de suas funções. Não se trata de um caso corriqueiro, que possa ser naturalizado ou relativizado, mas, sim, da constatação do desvio de finalidade da ABIN, que deve ser apurado e punido”, diz a entidade.
A associação informou que vai buscar “a responsabilização dos envolvidos e a reparação dos danos que se constatar”.
Ramagem foi eleito deputado federal com apoio de Jair Bolsonaro e hoje é pré-candidato à Prefeitura do Rio de Janeiro.
Em seu depoimento à Polícia Federal, foi confrontado com o documento listando procuradores, mas ele disse não lembrar de como ele foi produzido.