
A Cúpula da Otan – a agressiva aliança das ex-potências coloniais europeias e os EUA, com o Canadá de contrapeso, – se encerrou nesta quarta-feira (25) em Haia, na Holanda, após aprovar a ordem de Trump de aumentar o gasto com armas para 5% do PIB de cada integrante.
A nova meta de gastos — a ser alcançada nos próximos 10 anos — representa um salto de centenas de bilhões de dólares por ano em relação à meta atual da Otan de 2% do PIB.
A cúpula acabou reduzida a uma única sessão de trabalho de 90 minutos, para garantir que Trump estivesse presente até o final, ao invés de sair no meio, esvaziando, como fez no G7. As reuniões bilaterais foram canceladas, assim como a reunião do Conselho OTAN-Ucrânia.
Já Volodymyr Zelensky, o presidente ucraniano de validade vencida e estrela maior da cúpula belicista em anos recentes, teve de se contentar com um jantar informal. O novo secretário-geral da Otan, o holandês Mark Rutte, se esmerou em bajular Trump.
Líderes de países que haviam sido convidados para a efeméride, como o Japão e a Coreia do Sul, acharam mais oportuno não comparecer.
Considerando que, conforme o livro do ano de 2019 do respeitado Stockholm International Peace Research Institute (SIPRI), o gasto médio com “defesa” dos integrantes da Otan foi de 1,64% do PIB naquele ano (1,29% para a Europa Ocidental), e que no ano passado os países mais pesados europeus ocidentais estavam em torno de 2% do PIB, isso significa que os “5%” mais que duplica o gasto com armas e com guerras. Ou, quando a comparação é com 2019, triplica.
Na verdade, representa a volta ao patamar do auge da Guerra Fria, antes do Acordo INF, assinado por Reagan e Gorbachev, e do qual Trump retirou seu país em seu primeiro mandato, acelerando a destruição da arquitetura internacional de prevenção da guerra nuclear, criada a duras penas nas décadas precedentes e já sabotada por Bill Clinton e W. Bush.
RUSSOFOBIA DELIRANTE
Assim, em uma Europa sob ameaça do tarifaço de Trump e da desindustrialização autoinflingida pela recusa ao gás russo barato, e com crescimento econômico absolutamente raquítico, a meta que se colocaram é de aumentar nessa escala o gasto com armas.
O que exige como contrapartida pesados cortes nos gastos sociais e nas condições de vida de seus povos – ou aumento de impostos.
É verdade que os von der Leyen, Macron, Meloni, Merz, Starmer e assemelhados ali presentes escalonaram a loucura belicista para até 2035. Sendo que 3,5% do PIB terão que ser para a guerra propriamente dita, aquisição de armas, e os demais 1,5% para a infraestrutura que possibilite ir à guerra.
Na véspera da cúpula, o ministro das Relações Exteriores russo, Sergei Lavrov, observou que a União Europeia se tornou uma “extensão da Otan”.
A AMEAÇA É A OTAN
O aumento dos gastos bélicos foi aprovado sob a mentirosa alegação de que se deve à “ameaça russa” – quando todos sabem que a única ameaça que existe no teatro europeu é, exatamente, a Otan e sua expansão para leste, violando todos os compromissos assumidos quando da reunificação alemã.
Não foi a Rússia que se espichou para oeste, mas a Otan que sucessivamente anexou novos países e veio bater às portas da Rússia. Inclusive através de golpes como o de 2014 em Kiev, que depois subverteu o programa sob o qual a Ucrânia se tornou independente em 1991, tendo como cláusula pétrea a neutralidade e o status não-nuclear e os direitos das minorias étnicas. Além de colocar neonazistas no poder.
Quem decidiu pela anexação da Ucrânia foi W. Bush, levando o presidente Putin a fazer o famoso discurso de 2007 da Conferência de Segurança de Munique. Antes, fora Bill Clinton quem dera a partida na marcha a leste.
Nada consta na enxuta declaração de Haia sobre a “adesão da Ucrânia à Otan”, ponto central de cúpulas anteriores. Em 2024, o comunicado conjunto da cúpula da OTAN explicitou como “inevitável” a adesão da Ucrânia.
A declaração incluiu uma mesura diante do Artigo 5 do tratado da Otan, sobre o qual na véspera Trump dissera haver “inúmeras definições”. Além do hábito de Trump de dizer uma coisa pela manhã e outra à noite, sempre com a maior convicção. “Compromisso férreo”, asseverou o comunicado.
No mesmo sentido do “compromisso de 5% do PIB para a guerra” dessa cúpula, no mês passado, os Estados-membros da UE adotaram um plano de dívida de € 150 bilhões (US $ 170 bilhões) para financiar a produção de armas e compras militares.
“INCITAMENTO À GUERRA”, ADVERTE MOSCOU
A Rússia, que tem reiterado que não nutre nenhuma intenção hostil em relação a qualquer nação da UE, descartou tais acusações como “absurdas” e fomentadoras do medo usadas para justificar o aumento dos gastos militares.
Autoridades russas alertaram que esses aumentos de gastos equivalem a um “incitamento à guerra no continente europeu”. Moscou também descreveu a nova iniciativa de dívida da UE como uma continuação das políticas hostis e militarização do bloco.
Falando aos graduados da academia militar na segunda-feira, o presidente russo, Vladimir Putin, afirmou que o Ocidente “inventou essa história de horror” sobre um ataque russo e agora a está repetindo “ano após ano” para provocar uma nova corrida armamentista e justificar a “militarização global”.
TRUMP: MADRI PAGARÁ O DOBRO EM TARIFAS
Nesse quadro de capachismo explícito, a Espanha teve a hombridade de se negar a inchar suas despesas militares para 5% do PIB, apontando que os atuais 2,1% do PIB dão conta das necessidades reais do país.
Após negociações de última hora, a Espanha chegou a um acordo que a isenta do aumento dos gastos militares para 5% do PIB. O primeiro-ministro Pedro Sánchez enfatizou que alterar a taxa atual seria “desproporcional e desnecessário” e exigiria um aumento “drástico” de impostos.
O que levou Trump a ameaçar punir a Espanha na hora de negociar o tarifaço.
“É terrível o que a Espanha fez. Acho que eles são o único país que não vai pagar o valor total. Eles querem ficar em 2%, acho terrível. A economia está indo muito bem e pode ser destruída se algo ruim acontecer. Sabe, a Espanha é o único país que não paga. Acho uma vergonha ”, disse Trump, em uma coletiva de imprensa no final da cúpula da Otan em Haia.
“Sabe, o que vamos fazer? Vamos negociar um acordo comercial com a Espanha, vamos fazê-los pagar o dobro. Gosto da Espanha. É um ótimo lugar e eles são ótimas pessoas, mas a Espanha é o único país entre todos os países que se recusa a pagar”, enfatizou.
“Vou negociar diretamente com a Espanha. Eles vão pagar. Eles vão pagar mais assim . Você deveria dizer a eles para voltarem e pagarem. Você é jornalista. Diga a eles para voltarem”, comenta, dirigindo-se a outro repórter espanhol.
O primeiro-ministro Sánchez foi o mais direto, mas não é propriamente o único. Segundo o primeiro-ministro húngaro Viktor Orban, se as regras da UE não mudarem, ninguém vai chegar nos 5%.