
Bolsonaro, antes da posse, já conseguiu bater vários recordes.
Não, leitores, não estamos nos referimos ao que, segundo alguns jornais, seria o menor número de chefes de Estado de outros países, em uma posse de um presidente brasileiro, desde o fim da ditadura.
Nem ao fato de ter nomeado, para ministros, algumas mediocridades inéditas – pelo menos em um Ministério brasileiro -, incapazes de administrar uma plantação de goiaba lá onde o vento faz a curva ou de ensinar catecismo no interior da Colômbia (sem falar daquele sujeito que acha Trump a nova encarnação de Deus).
Também não queremos falar, aqui, que Bolsonaro levou para a Câmara o maior bando de arruaceiros do Legislativo brasileiro (sobre esse recorde, reservaremos outro artigo).
Não, leitores.
Apesar de nenhum presidente ter realizado antes tais façanhas, não é a esses recordes que estamos nos referindo, mas a outros.
Nem um presidente (nem Collor) conseguiu, antes da posse, ter o seu círculo apanhado em tantas transgressões quanto Bolsonaro – é verdade que, todas, de baixo coturno, mas só agora a turma poderá entrar nas de alto coturno.
É um tal de confiscar salários de funcionários, de receber auxílio-moradia tendo moradia, de funcionário-fantasma prá cá e funcionário-fantasma prá lá (inclusive um irmão de Bolsonaro, que recebia R$ 17 mil sem trabalhar), que, finalmente, entendemos por que em uma entrevista à Globo, disse ele: “sou do baixíssimo clero “.
O que não impediu que tivesse – ele e os três filhos que elegeu – uma espetacular evolução patrimonial (v. Valor de bens de clã Bolsonaro sobe 276% acima da inflação,Valor Econômico, 22/08/2018).
Então, agora vejamos a última do Onyx, grande articulador bolsonarista, coordenador da “equipe de transição” e ministro da Casa Civil de Bolsonaro.
Há poucos dias, a “Folha de S. Paulo” descobriu que Onyx Lorenzoni (DEM-RS), usava o dinheiro da Câmara para gastos seus na campanha de Bolsonaro.
O dinheiro da Câmara dos Deputados pagou, inclusive, a ida de Lorenzoni ao Rio, na escolha de Bolsonaro como candidato do PSL, e sua ida a Juiz de Fora, no dia do ato público de campanha em que Bolsonaro foi atingido pela facada de um doido, um certo Adélio Bispo de Oliveira.
Lorenzoni usou R$ 100 mil da Câmara dos Deputados, só em passagens (mais de 70) para o Rio de Janeiro e São Paulo. Lorenzoni é gaúcho – e fora eleito pelo DEM do Rio Grande do Sul, do qual é presidente.
Esse uso da verba pública é, evidentemente, ilegal – a Câmara somente pode pagar viagens destinadas à atividade parlamentar de um deputado. Não aquelas que se destinam à campanha eleitoral de um candidato a presidente.
Sobretudo quando Lorenzoni também usou o dinheiro da Câmara para pagar viagens de campanha para outras pessoas, além dele próprio.
E, sobretudo, quando Onyx declarou – e repetiu no Twitter – alguns dias antes da descoberta de suas despesas pela Câmara:
“Eu vou abrir mão do meu cartão corporativo. Mas acabar com ele ainda é uma coisa que vai ser discutida. Aquela coisa de pagar jantar, pagar vinho, pagar uísque não sei quantos anos, nesse governo não vai ter não. Eu vou dar meu exemplo pessoal. Desde que eu fui nomeado ministro da transição, eu poderia ter usado avião da FAB, eu nunca fiz isso.”
O exemplo pessoal de Lorenzoni, até então, estava em receber R$ 300 mil da JBS – e confessar, arrependido, que recebeu R$ 100 mil (v. Sérgio Moro e o caso Onyx Lorenzoni/JBS).
Na segunda-feira, 31/12, Lorenzoni, em entrevista à Rádio Gaúcha, confessou que usou verba pública para uso na campanha de Bolsonaro – e, disse mais, que fazia o que quisesse com o dinheiro destinado pela Câmara ao seu gabinete:
“Eu não tenho que me defender de nada. Está tudo dentro, rigorosamente, dentro da legislação da Câmara dos Deputados. Enquanto congressista e deputado, eu tenho a prerrogativa e direito de andar no lugar do Brasil que eu quiser e eu estava ajudando a construir o que, hoje, nós estamos vivendo: a transição de um novo futuro para o nosso país.”
Não é verdade. A resolução da Câmara que regulamenta a Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar – ajuda de custo para passagens aéreas e outras despesas – é clara, logo em seu primeiro parágrafo:
“Art. 1º Fica instituída a Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar (CEAP), destinada a custear gastos exclusivamente vinculados ao exercício da atividade parlamentar” (v. Ato da Mesa nº 43, DE 21/5/2009).
Lorenzoni recebeu, de janeiro a novembro de 2018, para essa ajuda de custo, conhecida no Congresso como “cotão”, R$ 490.510,80 (490 mil, 510 reais e 80 centavos; v. tabela).
Desse dinheiro, somente nas passagens para a campanha de Bolsonaro no Rio e em São Paulo, ele gastou, irregularmente, R$ 100 mil.
Pelo visto, a “transição de um novo futuro para o nosso país” pode ser, no máximo, a transição dos pequenos roubos para os médios e grandes roubos.
C.L.
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