Apenas um dia depois de o Ministério da Agricultura aprovar o registro de mais 51 agrotóxicos para comercialização no país, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou na terça-feira (23) um novo “marco legal” para avaliação dos riscos à saúde vinculados aos pesticidas.
A mudança faz com que agrotóxicos hoje classificados como “extremamente tóxicos” passem a ser incluídos em categorias mais baixas, como moderadamente tóxicos, pouco tóxicos ou com dano agudo improvável à saúde. Isso porque a Anvisa vai adotar novos critérios e usar apenas estudos de mortalidade para definir a classificação, desconsiderando a toxicidade não mortal.
Até então, para determinar o grau de toxicidade de um agrotóxico, o modelo em vigor leva em conta estudos de mortalidade em diferentes tipos de exposição ao produto e o resultado “mais restritivo” em testes de irritação dos olhos e da pele.
São esses últimos que, agora, com o suposto “novo marco legal”, seriam desconsiderados.
Para técnicos da Anvisa, o novo modelo adotado nesta terça-feira pelo governo leva a uma classificação equivocada.
De acordo com o gerente de avaliação de segurança toxicológica, Caio Almeida, a inclusão dos estudos de irritação dos olhos e da pele nos critérios acaba fazendo com que a maioria dos agrotóxicos no Brasil seja registrado hoje como “extremamente tóxico”.
Nesse modelo, os dados dos testes de irritação dos olhos e da pele passam a ser considerados apenas para adoção de medidas de alerta nos rótulos e bulas aos agricultores sobre risco à saúde.
“Estamos trabalhando esses dados. Mas de classe 1 (extremamente tóxico) atualmente seriam entre 700 e 800 produtos. Com o GHS, vamos ter de 200 a 300 produtos na categoria 1 e 2”, diz ele, que estima que ao menos 500 tenham classificação alterada.
Hoje, um agrotóxico é classificado em quatro categorias: extremamente tóxico, altamente tóxico, moderadamente tóxico e pouco tóxico.
Após as novas alterações, seriam incluídas duas novas categorias de classificação, as quais visam indicar se um produto é “improvável de causar dano agudo” ou se é “não classificado”, ou seja, baixa toxicidade.
Avanço de agrotóxicos
Tal mudança nas regras de classificação ocorrem em meio ao aumento recorde do número de agrotóxicos no país, medida que tem sido fomentada pelo governo Bolsonaro. Na segunda-feira (22), o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento aprovou o registro de mais de 51 agrotóxicos, totalizando 262 aprovações em sete meses de governo. Outros 560 pedidos de registro aguardam autorização para uso no Brasil. Do total da lista divulgada no Diário Oficial da União (DOU), 44 são genéricos, com princípios ativos já autorizados, e sete são novos no país, seis inseticidas e um herbicida.
Explicações na Câmara
A Comissão de Defesa do Consumidor vai ouvir os ministros da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e da Agricultura, Tereza Cristina, para explicar as autorizações de novos produtos agrotóxicos, realizadas em quantidade recorde ao longo deste ano. A audiência pública está marcada para o dia 7 de agosto, no retorno dos trabalhos do Congresso depois do recesso parlamentar.
Os ministros foram convidados, mas, de acordo com o autor do requerimento, deputado Felipe Carreira (PSB-PE), há compromisso de que eles irão comparecer. “Diante da palavra do presidente da comissão e dos colegas que são da base aliada do governo garantindo a presença dos dois ministros, transformamos o pedido de convocação em convite”, explica o deputado.
Ele menciona que um pedido de informações sobre o andamento do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos (PARA), feito ao ministro da Saúde, não foi respondido dentro do prazo legal e isso deve ser tema da audiência.
“O que nos preocupa é que a última pesquisa que foi feita oficialmente pelo governo, em 25 produtos investigados, mais da metade, treze, ou tinha quantidade acima do permitido de agrotóxicos ou tinha produtos que sequer eram permitidos no Brasil”, destaca o deputado, afirmando que não é radicalmente contra o uso dos defensivos, mas “há produtos que foram liberados este ano que são altamente questionados e vários não são permitidos na União Europeia, pelas informações que vamos debater na audiência”.