A censura ao Especial do Porta dos Fundos, exibido pela Netflix, imposta pelo desembargador Benedicto Abicair, da 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, gerou muitos protestos e indignou o país inteiro antes de ser derrubada na quinta-feira (09), a pedido da Netflix.
Juristas, personalidades, entidades e artistas de todo o Brasil protestaram contra a decisão.
“O Estado interferir para excluir ou proibir um conteúdo é censura”, disse o apresentador de TV Danilo Gentili, que, todos sabem, é um ardoroso bolsonarista. Ele lembrou que “esse governo se comprometeu em zelar pela liberdade de expressão”.
“Já tive colegas de comédia celebrando e relativizando censuras e tentativas de censura que sofri. Jamais farei o mesmo. Censura não”, frisou o apresentador do SBT.
No texto que enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF), a Netflix apresenta o argumento de que “a decisão proferida pelo TJ/RJ tem efeito equivalente ao da bomba utilizada no atentado terrorista à sede do Porta dos Fundos: silencia por meio do medo e da intimidação”.
Além disso, segundo a empresa, “torna a Netflix impedida de exercer sua liberdade de expressão artística e de programação em sua plenitude”.
A decisão do juiz Benedicto Abicair de censurar o programa da Netflix foi aplaudida pelo terrorista, Eduardo Fauzi, o bolsonarista que jogou a bomba na sede do Porta do Fundos e que está foragido.
A censura ao programa do Porta dos Fundos foi uma decisão do mesmo juiz que, em 2017, votou contra a condenação do então deputado Jair Bolsonaro que proferiu frases consideradas homofóbicas e racistas, com o argumento de que tinha que se respeitar a “livre manifestação de ideias”.
A OAB considerou a medida inconstitucional e o prefeito de São Paulo, Bruno Covas, reagiu decretando SP como “Cidade livre da Censura”. “Os ares democráticos não admitem censura”, destacou o ministro Marco Aurélio de Mello, do STF.
“Mais do que absurda, a decisão fere a Constituição que consagra a liberdade de expressão como cláusula pétrea”, afirmou a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), líder da Minoria na Câmara Federal. O movimento liberal “Livres” também foi ao Twitter manifestar sua contrariedade à suspensão do programa humorístico.
“Por mais violenta que seja uma sátira, ela jamais será capaz de ultrapassar a violência da censura”, escreveu. O post do Livres foi compartilhado pelo ex-ministro da Cultura e deputado federal, Marcelo Calero (Cidadania-RJ).
Para o jurista Lenio Streck, a decisão “demonstra duas coisas: primeiro, que o Judiciário pensa que pode ditar a moral e o comportamento da sociedade; segundo, mostra o fracasso da teoria do direito no Brasil”. Na opinião de Alexandre Fidalgo, advogado especialista em casos envolvendo liberdade de expressão, “a decisão é sem fundamento”, uma vez que não há nada no conteúdo que justifique sua retirada do ar.
A reclamação da Netflix demonstra ainda que a decisão do juiz Benedicto Abicair afronta decisões prévias da Suprema Corte. A empresa lembra que o Supremo estabeleceu três pilares que devem guiar o Judiciário em conflitos desse tipo.
“São eles: 1) a liberdade de expressão tem preferência sobre outros direitos fundamentais que colidam com ela, 2) é vedada qualquer forma de censura de natureza política, ideológica e artística, e 3) o Estado não pode fixar quaisquer condicionamentos e restrições relacionados ao exercício da liberdade de expressão que não os previstos expressamente na própria Constituição”, argumenta.