Pressionada pelo Planalto, PF produziu relatório negando lavagem de dinheiro por parte do senador. Já o MP do Rio diverge da decisão e mantém as investigações do esquema criminoso comandado por Fabrício Queiroz
A 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro negou, na terça-feira (4/2), Habeas Corpus do filho mais velho do presidente, senador Flávio Bolsonaro, e manteve a quebra de seu sigilo fiscal e bancário. O processo corre em segredo de justiça.
O relator do caso, desembargador Antônio Amado, havia votado na semana passada por anular a decisão que ordenou a quebra do sigilo. Contudo, as desembargadoras Monica Toledo Oliveira e Suimei Meira Cavalieri divergiram e mantiveram o despacho.
A Polícia Federal, numa ação precipitada, havia concluído, também na semana passada, não haver indícios de que o senador Flávio Bolsonaro tivesse cometido os crimes de lavagem de dinheiro e de falsidade ideológica no inquérito que mira tanto as negociações de imóveis feitas pelo filho mais velho do presidente como a sua declaração de bens na eleição de 2018.
A conclusão da PF não coincidiu com os elementos encontrados em um outro inquérito, do Ministério Público do Rio, que apura a lavagem de dinheiro no antigo gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa – ele foi deputado estadual de fevereiro de 2003 a janeiro de 2019.
Segundo a Promotoria, que investiga a prática de peculato, ocultação de patrimônio e organização criminosa, Flávio lavou até R$ 2,3 milhões com transações imobiliárias e com sua loja de chocolates. Até mesmo milícias podem estar envolvidas no esquema de lavagem comandado por Queiroz.
A mãe e a mulher do miliciano Adriano Nóbrega, ex-PM, assassino de aluguel e chefe do Escritório do Crime, espécie de central de assassinatos por encomenda das milícias, eram funcionárias fantasma no gabinete do deputado Flávio Bolsonaro. Raimunda Veras Magalhães, mãe de Adriano e sua mulher, Danielle Mendonça da Costa da Nóbrega, recebiam pelo gabinete sem trabalhar.
Danielle e sua mãe foram afastadas por Fabrício Queiroz do gabinete de Flávio Bolsonaro assim que veio a público o escândalo da lavagem de dinheiro através de funcionários fantasmas do gabinete. O dinheiro público era desviado dos salários de funcionários fantasmas para o caixa da quadrilha comandada por Flávio e Queiroz. Este último chegou a avisar Danielle que a estava afastando do cargo para que não se soubesse das ligações da milícia do Rio e do Escritório do Crime com o gabinete do deputado bolsonarista.
O senador e seu motorista, Fabrício Queiroz, obviamente negam que tenham cometido os crimes sob apuração.
No entanto o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) detectou uma movimentação irregular de R$ 1,2 milhão na conta de Queiroz entre 2016 e 2017. Este valor chegou a R$ 7 milhões quando a investigação retrocedeu até 2014.
Tanto o Coaf, quanto a Polícia Federal passaram a ser pressionadas pelo Planalto para interromper as investigações. A Superintendência da PF no Rio foi substituída por exigência de Jair Bolsonaro. O juiz do caso, Flávio Itabaiana, também passou a ser perseguido por Bolsonaro.
Em setembro, o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes determinou a suspensão de todos os processos que envolvem a quebra do sigilo de Flávio no caso Queiroz. A medida se baseou em decisão do presidente da corte, ministro Dias Toffoli, que determinou a suspensão nacional das apurações com dados repassados sem autorização judicial por órgãos de controle – incluindo a Receita Federal, o Coaf (agora UIF) e o BC.
Bolsonaro chegou a se reunir com Toffoli e Gilmar Mendes para que essa decisões fossem tomadas. As investigações ficaram paradas por seis meses.
Por maioria, o Plenário do Supremo entendeu no fim de novembro que é possível o compartilhamento de dados sem autorização entre os órgãos de inteligência e fiscalização e o Ministério Público, para fins penais.
Recentemente Bolsonaro voltou a pressionar a PF anunciando a possibilidade da recriação do Ministério da Segurança Pública. Seu objetivo é colocar alguém de sua confiança para comandar a PF, que estaria sob jurisdição do órgão. O governo não tem controle total sobre a atual direção da PF.
Teve que voltar atrás da intenção de intervir na PF pelas tensões criadas com o ministro Sérgio Moro. Mas, seu gesto pareceu ter como objetivo principal manter a PF sob pressão nos momento finais do inquérito. As investigações da Polícia Federal estão com o delegado Erick Blatt desde antes da chegada do novo superintendente.
O inquérito da PF concluiu pela inexistência de lavagem de dinheiro por Flávio Bolsonaro. A suspeita teve como origem uma notícia crime feita pelo advogado Eliezer Gomes da Silva com base em reportagem da Folha de janeiro de 2018 que apontava a evolução patrimonial de Jair Bolsonaro, então deputado federal, e seus filhos políticos.
A PF não levou em conta que o Ministério Público do Rio encontrou evidências de que o senador usou recursos em espécie (R$ 600 mil ) na compra de apartamentos com o objetivo de lavar dinheiro do esquema da lavagem do desvio de salários de funcionários fantasmas da Assembleia Legislativa.
Leia mais